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Santa Teresa: um ano sem bonde 

Data do último acidente foi marcada por manifestações dos moradores

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O secretário do Estado dos Transportes, Júlio Lopes, e os Ministérios Públicos Federal e Estadual recebem hoje dos integrantes do  movimento “O Bonde que queremos para Santa Teresa” um dossiê que incrimina Lopes. 

Segundo afirmam os moradores, diversos documentos comprovam que Júlio Lopes já tinha conhecimento das más condições dos bondes de Santa Teresa antes dos acidentes ocorridos em 27 de agosto de 2011, 24 de junho de 2011 e 16 de agosto de 2009, que deixaram no saldo de sete mortos.

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Uma das representantes do grupo, Nilce Azevedo, afirma que há muitas provas, como um documento assinado pelo secretário de Estado do Transporte que registrava a doação de sucatas do bonde de Santa Teresa para a Ong Rio Solidário, presidida por Adriana Ancelmo, esposa do governador Sérgio Cabral. Porém, por se tratar de um bem tombado como patrimônio histórico, o material não poderia ter sido doado.

Ainda de acordo com Nilce, a mistura entre materiais do trem e do bonde fez com que o novo veículo, chamado pelos moradores de “Frankstein”, fosse reinaugurado com dificuldades de locomoção, causadas pelo material muito rígido, que impedia a mobilidade nos trilhos. Até a base do trem chegou a ser arrastada no chão. Segundo Nilce, Júlio Lopes testemunhou o episódio. “Temos uma foto no dossiê que mostra o secretário examinando a base do bonde”, afirma a moradora de Santa Teresa.

Além disso, os moradores reclamam que o micro-ônibus em operação para suprir o bondinho não atende à população. "Além de serem só dois ônibus em circulação, eles não têm horário definido e, contrário do bondinho, trafegam em meio ao trânsito. Eles só vão ao Largo das Neves e ao Silvestre, deixando de levar a população aos lugares antes cobertos pelo bondinho", critica.

Outra questão levantada pelos componentes do movimento é a proposta do governo de trazer bondes modernos de Portugal, fechados, com porta de entrada e saída, sob a alegação de maior segurança aos passageiros. Para os moradores, não há necessidade de trazerem bondes modernos para substituírem os antigos.

Débora Lerrer, que mora no bairro há cerca de nove anos e também está engajada na causa, acrescenta que o movimento conta com o apoio do Clube dos Engenheiros, de profissionais do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia do Rio de Janeiro (Crea-RJ), do Sindicato dos Engenheiros e do Conselho Regional de Engenharia, e afirma que todos são favoráveis à volta do bondinho tradicional.

Ela também ressalta que há comprovações técnicas, aprovadas por vários profissionais, permitindo e garantindo o funcionamento dos bondinhos antigos sob a manutenção adequada. “Mudar a composição dos bondinhos antigos é um desrespeito com o bairro. Este é um estilo histórico e isso fere a memória afetiva dos moradores. Que garantias temos que esse novo bonde trará segurança à população se vai ser feito pela mesma empresa – Tetrans – que apresentou problemas em reforma anterior dos bondes?”, indaga Débora.

Placa lembra os mortos

Uma placa relembrando todos os mortos do bondinho foi instalada na estação Curvelo, de Santa Teresa, hoje (27) pela manhã. Os moradores seguiram até o local do acidente, cantaram e manifestaram a insatisfação com "um absoluto descaso do Governo do Estado a respeito do tema." O fim de semana passado também foi marcado por passeatas e cerimônias em homenagens e reivindicações sobre o bonde de Santa Teresa.

Em 27 de agosto de 2011, um acidente com um dos bondes de Santa Teresa, ponto turístico do Rio, deixou cinco mortos. A composição teria ficado fora de controle e perdido o freio na ladeira da Rua Joaquim Murtinho. Antes disso, um turista francês caiu do bonde em 24 de junho do mesmo ano. Já em 2009, uma professora de 29 anos foi atropelada por um dos bondes, que desceu a ladeira descontrolado. O acidente levantou dúvidas sobre a eficiência dos sistemas de freio regular e de emergência dos bondes.

A assessoria de Comunicação da Secretaria de Transportes do Estado do Rio de Janeiro declarou em nota que "todos os fatos e questionamentos envolvendo o acidente já foram devidamente apurados e analisados pelos órgãos competentes".

A arte da esperança

Poetas como Carlos Drummond de Andrade e Artur da Távola, além de pintores e pichadores retrataram ao longo dos anos a importância do bonde para o Rio de Janeiro e principalmente para Santa Teresa.

Marcos Alexandre Jambeiro, 43 anos, prestou, nesta segunda-feira (27), uma homenagem aos mortos no bonde de Santa Teresa: “Tenho tradição de pintar esse painel em anos de Copa do Mundo, sempre com personagens do bairro pendurados no bonde. E dessa vez foi diferente. Faço uma referência à curva onde aconteceu o acidente, como se o bonde já tivesse passado por ela, carregando alguns feridos. Presto também uma homenagem ao motorneiro Nelson Silva, como herói dessa tragédia. É uma maneira de não deixar o bonde cair no esquecimento”, diz o artista, que levou cerca de duas semanas para finalizar a pintura.

O designer Zod também deu a sua contribuição à causa com diversas intervenções nos trilhos e na estação Curvelo.