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Ascensão de Marina nas pesquisas anima agentes do mercado financeiro

Bovespa e papéis de estatais refletem repercussão de propostas da candidata

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Marina Silva (PSB) cresce nas pesquisas de intenção de voto, a Bovespa e papéis de estatais acompanham este crescimento. Especialistas consultados pelo JB explicam o comportamento dos agentes do mercado, a partir dos sinais que o programa de Marina dá sobre a política econômica que seria adotada, caso fosse eleita. A nova aposta do partido de Campos significaria uma mudança em relação à política econômica atual, um retorno a uma posição conservadora, com juros mais altos e menor intervenção do Estado, por exemplo. Os interlocutores da candidata já sinalizam para autonomia do Banco Central e redução das metas de inflação.

Com o anúncio da subida de Marina em pesquisas nesta quarta-feira (27), a Bovespa fechou em alta de 1,89%, aos 60.950 pontos, a pontuação máxima em 19 meses. O giro financeiro da sessão foi de R$ 10,8 bilhões. Não à toa, Petrobras e Eletrobras aceleraram os ganhos no final da sessão. A pesquisa do Instituto Datafolha, divulgado no dia 18 deste mês, havia apontado Marina com 21% das intenções de voto, garantindo acréscimo na bolsa. Ontem (26), a candidata apareceu na pesquisa Ibope com 29% e, hoje, na pesquisa da CNT, com 28,2%. 

É bem clara a relação entre a possibilidade de vitória da candidata do PSB e o humor dos agentes do mercado brasileiro, conforme aponta Silvio Campos Neto, economista-sênior da Tendências Consultoria, em conversa com o JB por telefone. A grande preocupação dos agentes, alerta Campos Neto, é justamente a reeleição do governo atual. A ascensão de Marina, então, ao reduzir as chances de vitória da situação e ainda representar uma política econômica diferente da atual, gera impactos diretos na bolsa de valores brasileira.

Marina tem os economistas Eduardo Giannetti e André Lara Resende, de posição conservadora, no comando da política econômica de sua campanha. A coordenadora do programa de governo, além disso, é Maria Alice Setúbal, conhecida como Neca, uma das principais acionistas do Itaú. Filha do fundador do banco, Olavo Setúbal, ela entrou na política quando Marina tentou se eleger pela primeira vez, em 2009, pelo PV. Em entrevista à Folha de S. Paulo neste final de semana, Neca declarou que Marina pretende manter o compromisso de Eduardo Campos, de dar autonomia ao Banco Central, e que a meta de inflação continua em 3%. Disse ainda que o programa prevê uma reforma fiscal, redirecionando impostos e dando mais poder aos estados e municípios.

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Silvio Campos Neto destaca o desempenho da Petrobras, Eletrobras e do Banco do Brasil na bolsa com a possibilidade de mudanças nessas empresas, representada pela possibilidade de vitória da candidata do PSB. "A equipe econômica de Marina passa uma mensagem de confiança, de credibilidade, indica ajustes mais consistentes, mais sólidos, com foco no tripé macroeconômico, retorno à preocupação com o centro da meta de inflação, gestão fiscal mais equilibrada, menor intervenção no Banco Central."

O professor de economia da USP, Heron do Carmo, também ressaltou ao JB a tendência conservadora da política econômica da campanha de Marina, que agrada o mercado financeiro. Como Campos Neto, Heron salienta a manutenção do tripé econômico, da responsabilidade fiscal, da recomposição de tarifas no início do governo, como o aumento do preço do combustível, o que implica aumento da rentabilidade da Petrobras - vide o comportamento dos papéis da estatal nos últimos dias.

"Mantendo o tripé, melhora o ambiente de negócios. Marina sinaliza com uma política econômica conservadora. Ela provavelmente daria atenção a outras questões, inclusive a ambiental, mas a política econômica seria conservadora. No caso da Petrobras, pressupõe recomposição do preço da gasolina. Com a Eletrobras, também tem esse imbróglio com o setor elétrico, que fez a estatal perder valor de mercado. Muito provavelmente, se Marina ganhar a eleição, isso deve ser revertido, com um governo menos intervencionista. Isso tudo agrada o mercado, além da grande reputação dos economistas do programa", acredita Heron.

Marcus Ianoni, professor do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal Fluminense (UFF), reforça que Marina vem dado sinais de que retornaria cpm uma política mais voltada para o neoliberalismo, contra uma política social desenvolvimentista que teria sido implantada nos últimos governos, mais comprometida com questões sociais, mas que gera mais críticas, principalmente por parte do mercado.

Entre os pontos sinalizados pelo programa de Marina, Ianoni destaca a maior liberdade ao Banco Central, com mandato independente do governo. Para ele, trata-se de uma proposta liberal, de deixar o executivo totalmente independente da política monetária. O que significaria a perda de um recurso fundamental do governo, de formulação da política econômica, que iria para as mãos do Banco Central, que, por sua vez, passaria a realizar os interesses dos agentes de mercado. 

"A política econômica da Marina tende a ocupar o mesmo espaço que pretende ocupar a candidatura do Aécio Neves (PSDB). Eu não vejo outra tendência, porque ou ela vai para uma lado mais desenvolvimentista ou para um mais neoliberal, e ela tem sinalizado que vai para o neoliberal. O discurso de que ela representa a nova política é secundária, é ideologia, porque quando se analisa as propostas econômicas, fica clara essa tendência liberalizante. O PSDB enfrentava dificuldades nas pesquisas, e agora surge Marina como uma alternativa. Os investidores acabam se voltando para ela", esclarece Ianoni.

Eleições em um país em desenvolvimento

A economia e as eleições, no Brasil, são uma via de mão dupla, conforme explicou Rafael Cortez, cientista político da Tendências Consultoria, ao JB. As expectativas em relação ao desempenho dos candidatos à presidência afetam o humor dos agentes econômicos, um fenômeno típico de países em desenvolvimento. "Nos países avançados, esses são dilemas resolvidos. Já que têm instituições econômicas sólidas, ficam relativamente protegidos da alternância de governos", salienta Cortez.

Francisco Lopreato, professor de Economia da Unicamp, concorda com Cortez. Nos Estados Unidos, sugere, mesmo em caso de mudança de um governo republicano para um democrata, ou vice-versa, a entrada de um novo presidente não traz mudanças tão substanciais para a condição do país, a política econômica não muda, não são alterações tão expressivas. A chegada de Obama ao poder, mesmo representando uma grande novidade, não significou nenhuma alteração substancial para o mercado.

"A economia brasileira é um tumulto, ganhou uma estabilidade maior com o governo Lula, mas ainda está longe de ser uma situação semelhante a dos EUA. As mudanças aqui ainda são muito expressivas, mesmo do Lula para a Dilma, apesar de ser uma continuidade", conclui Lopreato.