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Professores dizem que resultado do Ideb mascara situação da educação no RJ

A rede estadual de educação do Rio obteve a quarta colocação no Índice

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O quarto lugar obtido pelo Rio de Janeiro no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) e o bônus de R$ 60 milhões destinado aos 20 mil servidores das 402 unidades escolares que foram bem no Plano de Meta do Estado, não foram bem recebidos pelos profissionais de ensino do estado. O Sindicato dos Profissionais da Educação (Sepe) se posicionou, dizendo que o bônus tem tom eleitoral e que o Ideb é ineficaz na hora de avaliar verdadeiramente a educação.

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A nota de 3,66 do Rio de Janeiro no ranking Ideb 2013/2014 foi divulgada pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). Apenas Goiás, com 3,8, e São Paulo e Rio Grande do Sul, tiveram  notas maiores que a educação fluminense, que saiu do 15º lugar para o Top 5 de um ano para o outro. A meta da Secretaria de Estado de Educação (Seeduc) era ficar entre os cinco primeiros e, de acordo com o secretário Wilson Risolia o resultado foi alcançado. Para os professores porém, o resultado do Ideb não corresponde à realidade. 

Suzana Gutierrez,  coordenadora do Sepe-RJ, diz que o sindicato é contra o Ideb e contra a política de bonificação. “O processo de ensino e aprendizado não pode ser verificado com uma prova única, como é feito com o Ideb. Se o governo quiser fazer um índice real sobre o ensino do pais, não é através de uma prova, mas sim através de uma serie de itens a serem verificados como:  se os governos aplicam os 25% na educação, como manda a constituição, se esses governos cumprem a lei do piso, se cumprem a lei das atividades extraclasse, se existe informática, se há funcionários suficiente”, diz ela, ressaltando que no estado do Rio, nenhuma dessas situações é cumprida à risca.

Para ela, a prova em si, mascara problemas. “Os alunos fazem uma prova onde marcam algumas perguntas questionáveis, tanto do ponto de vista do método quanto de conteúdo. Temos  por exemplo  provas do sexto ano que verificam se o aluno é alfabetizado, quando no sexto ano ele já deveria ser alfabetizado há muito tempo”, diz Suzana. Ela ainda relembra a grande carência de profissionais na rede estadual e que isso leva a diversas turmas se formarem, ou seja, alunos serem aprovados sem nunca terem tido uma aula de determinada disciplina.

“O Ideb só serve para culpar o professor pelo fracasso da educação e por ultimo mascarar os índices da verdadeira dificuldade que existe nas escolas: a infraestrutura, salas superlotadas, falta de professores e profissionais de apoio”, comenta ela.

A questão do bônus de quase R$ 70 milhões destinado a cerca de 400 escolas no Rio de Janeiro também é importante para o sindicato e eles condenam essa prática de meritocracia do governo, que surge logo próximo às eleições.  “Nós não queremos uma bonificação que só alguns professores vão ganhar. Queremos uma política salarial que garanta um salário justo o ano todo, todos os anos, que garanta a aposentadoria desse profissional. Essa é uma política de enxugamento de gastos, somos completamente contra. E é claro que sendo divulgado como foi, tem um tom eleitoral”, diz a professora e coordenadora do Sepe Marta de Moraes. 

Nicholas Davies, professor da Faculdade de Educação da Universidade Federal Fluminense (UFF), que fez um estudo sobre redução da oferta de matrículas na rede estadual do Rio, corrobora a opinião das professoras. Para o especialista, a avaliação é sempre bem vista, mas os critérios usados pelo Ideb não avaliam de forma real a educação. 

"Avaliar é importante, sempre. O problema é com que critérios. Os do Ideb são os critérios que deixam muito a desejar. Primeiro que o Ideb reduz a avaliação a números e existe uma dimensão da educação e não pode ser reduzida a números, não se quantifica. E depois, tem outro problema, que é o seguinte, pressupõe que os fatores extra-escolares não pesam no desempenho do aluno", completa ele. 

O que pode ter influenciado no "milagre" do Rio

Tirando a questão específica do conteúdo da prova, mencionada por Suzana, Nicholas Davies ressalta as possíveis manipulações que existem nos processos de avaliação qualitativos, que são preocupantes e podem ter ajudado nessa guinada do Rio de Janeiro, que saiu do 15º lugar para 3º melhor colocado no país. 

"Pode existir muita manipulação no Ideb, você pode preparar os alunos para a prova especificamente, por exemplo. No caso do Enade isso é uma prática comum: existe uma preparação especifica por parte das instituições privadas em escolher os melhores alunos para a prova do Enade. Eu acho muito estranho essa melhoria do Ideb do Rio porque as escolas não melhoraram. Os professores não melhoraram. Qual foi o milagre? Se os professores não melhoraram significativamente, o que levou a esse grande desempenho Não sei, mas pode existir manipulação e mecanismos para maquiar resultados", completa ele. 

A diminuição sistemática de matrículas na rede estadual do Rio é uma grande questão que pode ter influenciado nesse resultado. Um estudo feito por Nicholas,  o números de matriculas nas unidades estaduais de ensino no Rio de Janeiro teve uma enorme queda, que chegou a 34,7% . Foi o maior índice em todas as unidades da federação, passando de 1.490.137 em 2006, para 973.666 em 2012. Para o professor, essa redução drástica é fruto de uma política intencional de redução de oferecimento de vagas. 

A Seeduc responde que "no país inteiro, devido a uma série de fatores, inclusive demográficos, houve diminuição de alunos. No Rio, não foi diferente" e completa dizendo que "há vagas na rede estadual. Portanto, quem quer e pode, não deixa de estudar". 

Para Nicholas, colocar a culpa no fator demográfico para a diminuição das matrículas é uma falácia. Nesse mesmo estudo, ele constatou que, ao mesmo tempo que o Rio diminuiu muito as matrículas na rede pública, as matrículas da rede privada aumentaram substancialmente. A rede privada do Rio de Janeiro cresceu 22,5%, passando de 856.835 matrículas, em 2006, para 1.049.908, em 2012. 

"O número de matriculas estaduais no Rio foi o que mais diminui em todo Brasil. E aí uma explicação que dão, que não é correta, é que está havendo um declínio da taxa de natalidade. Isso é verdade,  e esse declínio é mundial. Mas se só isso bastasse, teria que acontecer proporcionalmente em todos os estados. Aqui, a redução foi enorme, e se há uma redução nas matriculas por causa da queda da taxa de natalidade, isso teria que refletir na evolução das matriculas na rede particular, o que não acontece. Na privada, no Rio de Janeiro, o crescimento foi o maior do Brasil, o que não é coincidência. O que está havendo é política deliberada de redução das matriculas estaduais e obviamente isso leva a um estimulo à escolas particulares a crescerem."

Outra influência na diminuição das matrículas é, segundo a Seeduc, a municipalização do ensino. O Estado alega a responsabilidade da prefeitura na educação dizendo que "o processo de municipalização, ou seja, quando os municípios têm condições de assumir sua parcela de responsabilidade, uma vez que o Ensino Fundamental, prioritariamente e constitucionalmente, deve ser das prefeituras". A Secretaria ainda informa que "O Estado somente fica com esse segmento quando um município não tem condições. Por isso, tal transferência para os municípios. Só do município do Rio, foram cerca de 45 mil alunos do Fundamental que estavam na rede estadual e a prefeitura os absorveu. Ou seja, nenhum aluno deixou de estudar".  O Jornal do Brasil já tocou nesse assunto em 2013, quando cerca de 50 escolas estaduais pararam de funcionar, passando a educação para o município

Para Nicholas, porém, essa questão é secundária. "A municipalização aqui não foi tão importante, como no Pará, no Ceará, em Sp, MG. No Rio de Janeiro como o governo estadual, já antes de Cabral, era muito omisso na oferta de educação básica, e a rede municipal extensa", comenta. 

 Problema antigo: professores ainda não receberam de volta salário cortado durante a greve

Nesta quarta-feira (10), segundo o Sepe, mais de 200 professores compareceram à Secretaria Municipal de Educação pedindo para que seu salário, cortado durante a greve, seja devolvido.

O Sepe diz que "o sindicato ganhou na justiça liminares que determinam que a prefeitura devolva o dinheiro descontado”. A prefeitura rebate dizendo que já entrou com recursos e que não vai pagar nada até o fim da tramitação do processo. 

*Do programa de Estágio do JB

**Com informações da Agência Brasil