ASSINE
search button

MP 579: Governo provoca perdas bilionárias às empresas do setor elétrico

Compartilhar

O governo petista de olho nas eleições de 2014 resolveu, de forma açodada, antecipar o processo de renovação das concessões do setor elétrico, que venceriam nos próximos anos (entre 2015 e 2017), com o argumento de baixar as contas de energia elétrica. A bem da verdade é importante ressaltar que o custo da energia elétrica no Brasil, com sua enorme carga tributária, é uma verdadeira escorcha, e é um componente do chamado custo-Brasil que concorre, e muito, para a nossa perda de competitividade. Afinal, temos a quarta maior tarifa de energia do mundo, ficando atrás somente da Itália, Turquia e República Checa. 

Não obstante o governo ter tempo de sobra para discutir os novos contratos de concessão, resolveu, de forma absolutamente arbitrária, intempestiva e atabalhoada, impor a sua vontade através da Medida Provisória (MP) nº 579, de 11/09/12 (regulamentada através do Decreto nº 7.805, de 14/09/12). A justificativa para tamanha pressa é que o Brasil não poderia continuar com tarifas de energia tão altas. O curioso em toda essa urgência é que, só agora, depois de 10 anos governando o país , os petistas descobriram esse “pequeno” detalhe, com o agravante de que é o próprio governo quem mais ganha com a tremenda carga tributária que incide nas contas de luz. 

Esse assunto, em função da sua alta relevância, deveria ser discutido com calma, sem arroubos e de forma totalmente transparente com todos os envolvidos no assunto. No entanto, o governo, uma vez mais, usou o caminho mais imediatista e editou a MP, com prazos extremamente exíguos para que os interessados tomassem as decisões que envolvem bilhões de reais em investimentos e, o que é mais importante, a eficiência e a segurança do setor energético, altamente estratégico para o desenvolvimento do país. 

Se já não bastasse a desastrosa interferência na Petrobras – com o artificial tabelamento dos combustíveis –, que fez com que a estatal perdesse 35% do seu valor de mercado desde 27/09/2010, agora a bola da vez é a total desestruturação do setor elétrico. Segundo a consultoria Economática (www.economatica.com.br), desde 06/09, quando foi anunciada a redução da tarifa de energia elétrica, o valor de 25 (do total de 31) empresas do setor listadas na Bovespa era de R$ 190,842 bilhões; 69 dias depois (14/11), valiam R$ 157,254 bilhões, ou seja, uma perda de R$ 33,588 bilhões, valor esse que daria para construir duas hidrelétricas do porte da UHE Santo Antônio (RO). 

A Eletrobras que terá que dizer amém para o seu controlador, a União, caminha a passos largos para o precipício, e suas ações estão virando pó. Alguma dúvida? Desde o dia 11/09 (data da MP) até 22/11 (72 dias), as ações ON (Elet3) e PNB (Elet6) caíram 49,85% e 60,84%, respectivamente (www.eletrobras.gov.br). 

O governo, como sempre, fez muito barulho com a MP 579, mas não abriu mão de sua maior fatia e só fez uma pequena redução nos encargos – não confundir com impostos –, a saber: 1) Conta de Consumo de Combustíveis – CCC; 2) Conta de Desenvolvimento Energético – CDE (foi reduzida a 25% do custo); e 3) Reserva Global de Reversão – RGR. Pergunto: por que o governo não tirou a PIS-Confins que representa 9,25% das contas de luz? A resposta é simples: o setor elétrico sempre tem funcionado como um grande e eficiente agente arrecadador de tributos e encargos!!! 

Para que o leitor não se deixe levar pela falácia eleitoreira, segundo a Aneel (www.aneel.gov.br, 11/2011) a conta de energia tem a seguinte composição: geração, 31%; transmissão, 5,7%; distribuição, 26,5%; encargos e taxas, 10,9%; e impostos e tributos, 25,9%, ou seja — os grandes vilões em todo esse processo são o governo federal, em maior escala, e os estados (ICMS). Resumo da história: quem mais investe, corre mais risco e mais trabalha é quem menos ganha, e o consumidor o quem mais paga! 

Além dos baixos valores das indenizações dos ativos não amortizados e não depreciados das hidrelétricas – somente 15 geradoras foram “premiadas” com irrisórios R$ 7.077.666.750,00 (Portaria MME nº 580, 01/11/12, art. 1º) –, outro grande problema é a baixíssima remuneração do MW/h de todas geradoras (Portaria MME nº 578, 31/10/12, art. 1º, § 1º), calculada pelo Custo da Gestão dos Ativos de Geração – GAG, que inclui somente “custos regulatórios de operação, manutenção, administração, entre outros”. O valor do MW/h proposto para essas geradoras é simplesmente RIDÍCULO, portanto, INACEITÁVEL. Para complicar ainda mais o processo, o governo inventou uma “nova fórmula”, que ninguém conhece, ou seja, “KW/ano” em vez do usual MW/h. 

Vejamos alguns exemplos (para a conversão de KW/ano para MW/h utilizei o fator 4,817345, calculado por Mário Menel, presidente da Associação Brasileira de Investidores em Autoprodução de Energia (Abiape), https://exame.abril.com.br/, 02/11/12): 

 Pergunto: como uma hidrelétrica, mesmo já tendo os seus ativos amortizados, poderá ter resultado financeiro positivo com valores tão baixos? Quem foi o Mister M e de que cartola ele tirou esses valores tão esdrúxulos? 

O estranho em tudo isso é que somando o valor das indenizações das nove concessões de Transmissão – R$ 12.963.502.771,65 –, aos valores das hidrelétricas dá um total de R$ 20.041.169.521,65, o mesmo valor que o governo tem contingenciado da arrecadação da RGR. Ou seja, o governo fez a conta de trás para a frente e impôs o valor que tinha em caixa!!! 

O fato concreto é que, a prevalecer tais valores para as indenizações e do MWh, tanto o governo federal como os estaduais doravante terão que prever nos seus orçamentos anuais vários bilhões de reais para completar os custos e investimentos correntes, evitando assim que essas hidrelétricas mal remuneradas entrem em colapso. Caso contrário, serão mais e mais apagões. Ficaremos como a Argentina? 

* Humberto Viana Guimarães, engenheiro civil e consultor, é formado pela Fundação Mineira de Educação e Cultura, com especialização em materiais explosivos, estruturas de concreto, geração de energia e saneamento.