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A Cidade Imperial: movimentos populares e costumes do tempo do rei

'JB' resgata terceiro fascículo de série comemorativa do quarto centenário do Rio

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Pelos 450 anos do Rio de Janeiro, completados no último domingo (1), o JB resgata cadernos especiais publicados ao longo de 1965 em comemoração ao quarto centenário. A terceira edição da série trata, entre outras questões, do levante popular e sua influência nas mudanças na cidade. A coleção de 20 fascículos lançada naquele ano era um grande livro de história, que falava desde o nascimento do Rio de Janeiro até os dias de então, sem a intenção de ser didático ou erudito, mas popular. A edição ficou a cargo do jornalista e biógrafo, que viria a ser imortal da ABL cinco anos depois, Francisco de Assis Barbosa.

Após o fim da oligarquia da família Sá, das primeiras revoltas populares, das novas investidas dos franceses e da transferência da capital da Bahia para o Rio de Janeiro nos dois séculos anteriores, o século 19 ficaria marcado pela Independência de Portugal e pelo sucesso dos movimentos populares nascidos e desenvolvidos no Rio de Janeiro. A Cidade, na metade daquele século, não passava de uma aldeia suja e malcheirosa, que se modernizava, "mas a passo de cágado", destacava o editor do caderno. Surgiam, então, as primeiras intenções de mudança da capital do Império e a reação contra elas, como o plano de higienização da Corte. Surgia o Campo de Santana, como um pulmão por onde se pudesse respirar.

Movimentos Populares

Pedro Calmon era quem explicava no fascículo a saída da população de sua timidez e anomia colonial para um comportamento combativo e destemido, para se tornar uma "presença insistente e ruidosa". A primeira das revoltas antecipou a Independência. D. João VI relutava, mas a revolução portuguesa que tinha criado o sistema constitucionalista no Porto e em Lisboa atravessaria o mar e chegaria ao Brasil, onde ganharia O Príncipe Herdeiro D. Pedro como aliado. Novos ministros foram escolhidos pela trope e pelo povo, e D. João VI jurou a constituição. Não tardou a deixar o Brasil, deixando-o com o Príncipe.

D. Pedro, visto como correligionário do povo, contudo, conteve-o. Dissolveu a assembleia popular e reprimiu com "inaudita violência" a rebelião que ajudara a começar. "Voltou o povo,d esta feita, com o patriotismo desfraldado, a inquietar-se com a reação que em Portugal se acentuava contra a preservação do Brasil, reino." Portugal quis recolher o Príncipe para Portugal, mas a opinião brasileira o convenceu a ficar. 

"O Império nasceu assim, enovelando a municipalidade, o povo, a corte, numa jovial união patriótica, que até 1 de dezembro de 1822 - quando aquele impetuoso rapaz se coroou Imperador do Brasil - fez da praça carioca a plateia do espetáculo nacional." Dez anos depois, o fundador do Império teria que enfrentar o rancor enfurecido da população, por ter dissolvido a Constituinte, em 1823, aniquilado a revolução republicana do Nordeste a ferro e fogo, em 1824, entre outros casos, que o colocaram como "inimigo das liberdades que no Brasil proclamara e estabelecera". 

Recebeu oposição de jornais democráticos e oradores. Quando portugueses do comércio resolveram festejar sua volta de Minas, em 13 de março de 1831, enfeitando ruas, a população lançou pedras, assaltou tendas e lojas, enquanto caixeiros revidavam com garrafas. O levante estava convocado até o dia 7 de abril. 

D. Pedro preferiu enfrentar o povo, armado e desafiantes, que ganhou adesão dos estudantes da Academia Militar, e aos protestos gerais uniu-se o governador das armas, General Francisco de Lima e Silva. Aquilo acontecia um ano depois da Revolução Francesa. D. Pedro I abdica para não ceder à rebelião e vai para Portugal, em favor do filho de seis anos, D. Pedro II. O governo foi reposto em sua base constitucional. "O povo aclamara-o; o povo mando-o embora. O povo aclamou o Imperador-menino, D. Pedro II; e no meio de uma simpatia mística e profunda o sentou naquele trono vazio."

Depois desse episódio, teve início um período turbulento, até 1840. Políticos se dividiram entre federalistas e conservadores; entre radicais que preconizavam a república e reacionários que queriam a restauração do imperador abdicatório. Partidos se digladiavam. 

"Um chefe de Estado com 14 anos de idade! Sim, o povo o quis". O Segundo Reinado foi ordeiro. graças à "doce tolerância" do Imperador. Em 1848, tinham se esgotado as agitações de rua, para só retornarem em 1880.

Quando o Imposto do Vintém incindiu sobre as passagens de bondes, veio a sublevação popular de 1880, nascida de fora espontânea. O modo de cobrar o imposto também revoltava a população, com a polícia a auxiliar a cobrança. Houve protesto. E a tropa respondeu, com mortos e feridos. 

Mas nenhuma ideia foi tão popular como a abolicionista, que agitou o Rio de Janeiro de 1881 a 1888. "Todas as classes entrara, umas depois das outras, nesse movimento purificador. Nunca se assistiu no Rio a espetáculo semelhante ao da assinatura pela Princesa Regente da lei que acabou com a escravidão."

A República, porém, não foi sentida primeiro pelo povo, mas pelos poetas. "Em 15 de novembro e 1889 o Marechal Deodoro encabeçou a insurreição que pôs abaixo o Império sem a convocação prévia do povo.(...) O Rio de Janeiro dirigira e norteara a evolução nacional." 

CRONOLOGIA

1808 - 7 DE MARÇO: chegada do Príncipe Regente D. João e da Rainha D. Maria I, transformando o Rio em sede provisória da monarquia portuguesa.

1816 - 20 DE MARÇO: falecimento da Rainha D. Maria I.

1817 - 5 DE NOVEMBRO: festas populares em regozijo pelo casamento do Príncipe Herdeiro D. Pedro com a Arquiduquesa da Áustria, S. Maria Leopoldina.

1818 - 6 DE FEVEREIRO: aclamação de D. João VI Rei de Portugal, Brasil e Algarves

1821 - 26 DE FEVEREIRO: início das agitações populares que forçaram o Rei a jurar a Constituição, que estava sendo elaborada em Lisboa, em consequência do movimento constitucionalista.

22 DE ABRIL: retorno do Rei à Portugal, ficando como Regente do Brasil o Príncipe D. Pedro.

1822 - 9 DE JANEIRO: rebela-se o povo para exigir a ficada do Príncipe Regente, iniciando-se assim a Revolução da Independência.

12 DE OUTUBRO: aclamação de D. Pedro I Imperador Constitucional do Brasil.

1823 - 9 DE JANEIRO: carta Imperial, referendada por José Bonifácio, concedendo à Cidade do Rio de Janeiro o título de Muito Leal e Heroica, por sua participação no fico.

3 DE MAIO - instalação da Primeira Constituinte Brasileira, dissolvida a 12 de novembro do mesmo ano.

1826 - 14 DE DEZEMBRO: funerais da Imperatriz D. Maria Leopoldina.

1828 - 1° DE OUTUBRO: extinção do Senado da Câmara.

1830 - 16 DE JANEIRO: Instalação da Ilustríssima Câmara Municipal

1831 - 11/12 DE MARÇO: Noite das Garrafadas, seguindo-se a 7 de abril a abdicação de D. Pedro I.

1832 - 17 DE ABRIL: sedição do Partido Restaurador ou Caramuru, visando depor a Regência

1834 - 12 DE AGOSTO: Ato Adicional, pelo qual foi constituído o Município da Corte, também chamado (não oficialmente) Município Neutro.

1840 - 21 DE JULHO: início das agitações no sentido de antecipar a maioridade de D. Pedro II, afinal sagrado e coroado a 18 de julho do ano seguinte.

1843 - 3/4 DE SETEMBRO: chegada e desembarque da Imperatriz D. Teresa Cristina.

1851 - 7 DE FEVEREIRO: inicia-se o serviço telegráfico.

1854 - 25 DE MARÇO: inauguração da iluminação a gás nas principais ruas do centro urbano.

1855 - 26 DE NOVEMBRO: autorização dada a Mauá para para construir o Canal do Mangue.

1858 - 29 DE MARÇO: inauguração da Estrada de Ferro D. Pedro II (hoje Central do Brasil)

1862 - 29 DE JULHO: inauguração do sistema de transportes com Niterói por barcas a vapor

1863 - 5 DE JANEIRO: protestos populares contra os ingleses por terem aprisionado cinco navios mercantes brasileiros (Questão Christie)

1864 - 15 DE OUTUBRO: casamento da Princesa D. Isabel com o Conde d'Eu.

1868 - 8 DE OUTUBRO: inauguração da primeira linha de bondes (tração animal)

1870 - 23 DE FEVEREIRO: entrada triunfal do primeiro contingente de Voluntários da Pátria a chegar à Corte, depois de finda a Guerra do Paraguai.

1873 - 24 DE DEZEMBRO: Inauguração do cabo submarino.

1880 - 1/4 DE JANEIRO: Revolta do Vintém.

7 DE SETEMBRO: inauguração do jardim do Parque da Aclimação (Campo de Santana)

1887 - 3 DE JUNHO: primeira experiência com um bonde elétrico.

1888 - 13/20 DE MAIO: festejos da Abolição.

1889 - 15 DE JULHO: atentado contra D. Pedro II.

15 DE NOVEMBRO: Proclamação da República.