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Cúpula da PM: especialistas defendem intervenção federal para apurar subornos

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O depoimento nesta terça-feira (23/9) de um dos 24 policiais militares presos na semana passada durante a operação Amigos S/A, para desarticular uma suposta quadrilha formada por agentes do Rio de Janeiro envolvidos em um esquema de corrupção, incluindo o coronel Alexandre Fontenelle, terceiro na hierarquia, pode ser a ponta de um iceberg que já começou a emergir e causar turbulências na cúpula da PM. Em troca do benefício da delação premiada, o policial revelou em depoimento no Ministério Público do Estado que os subornos chegavam ao Estado-Maior da corporação.

Segundo o policial, ele ouviu de dois oficiais detidos que todos os batalhões eram obrigados a pagar R$ 15 mil ao Estado-Maior da PM. As informações vazadas e divulgadas pela grande mídia sem que se saiba a identidade do informante, contribui para comprometer ainda mais a imagem da Polícia Militar no Estado. No âmbito corporativo, o vazamento do depoimento sem que haja na contrapartida ações enérgicas do governo, pode suscitar a sublevação dentro da PM. Ou mais grave que isso, pode gerar um estado de anomia. Nesse contexto, o criminoso de rua, agora, pode ter menos respeito ainda por um policial militar, pois vai ver ali outro criminoso, e não um agente que representa a lei.

Para o ex-secretário de Segurança do Rio, Marcelo Itagiba, uma intervenção federal nas investigações seria a solução mais segura para um resultado eficiente do caso considerado por ele muito grave. "Já era hora do secretário de Segurança ter se pronunciado, ou o governador, para tranquilizar e também dar explicações para a população", destacou. 

Itagiba acredita que a divulgação de processos envolvendo PMs, independentemente de hierarquia, deve tramitar de forma transparente, respeitando o direito da população de conhecer os fatos que envolvem dinheiro público. O presidente da Comissão de Segurança Pública da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ), Breno Melaragno, compartilha da mesma opinião que Itagiba, e acrescenta que o secretário de Segurança José Mariano Beltrame deve fornecer, o mais rápido possível, detalhes importantes que ficaram encobertos no depoimento do policial beneficiado com a delação premiada, mas que também não prejudiquem o andamento das investigações.

Avaliando por um aspecto jurídico, Melaragno afirma que algumas partes confidenciais do processo devem ser preservada e mantidas sob sigilo de justiça, visando o interesse na busca "da verdade real". "Os fatos são graves e caminham para uma suposta corrupção que pode chegar até o Estado-Maior da PM. O depoimento foi dado em uma delação premiada, então o vazamento de informações agora é algo delicado e que pode atrapalhar o andamento do processo", ressaltou, citando como exemplo a delação premiada do ex-diretor da Petrobras, Paulo Roberto Costa.

O jurista da OAB-RJ esclarece que as "suposições" levantadas pelo PM delator do esquema devem ser investigadas pelos órgão competentes e encaminhadas ao Ministério Público Estadual, que por sua vez deve complementar as investigações. No entanto, ele não descartou a possibilidade do processo trilhar outro caminho, que poderia ser de uma Subprocuradoria-geral, ligada ao Ministério Público Federal. Neste caso, teria a intervenção federal cogitada por Marcelo Itagiba. 

A crise na Polícia Militar do Rio vem ganhando maiores proporções a cada ano, como apontam os próprios números do Instituto de Segurança Pública, apresentados na reportagem ""Perdeu, perdeu". Temida frase ecoa na cidade refém do crime e da corrupção", publicada no último domingo (21), pelo JB. Em 2012, o próprio atual governador Luiz Fernando Pezão, na época vice governador de Cabral, entrou nas estatísticas da criminalidade. Enquanto fazia uma viagem para a Europa, Pezão teve o seu apartamento no Leblon invadido por bandidos, que levaram objetos de valor - "Polícia Civil investiga assalto à casa de vice-governador". Os assaltantes deixaram 15 caixas de jóias vazias em cima da cama do governador. Até hoje, a polícia não solucionou o caso.  

>> Comandante geral da PM é mantido, apesar da prisão de policiais suspeitos

Andamento do caso

O policial que prestou depoimento e teve a sua identidade preservada já está em liberdade. Depois do depoimento do PM, a promotoria de Justiça deve encaminhar o processo para a Corregedoria-Geral Unificada (CGU) com o pedido de investigação do comando da Polícia Militar e dos oficiais ligados ao Estado-Maior. Dependendo do andamento das investigações, comandos anteriores também podem ser alvos das apurações. 

O comandante geral da PM, coronel Luís Castro , disse que vai convocar os comandantes para prestar esclarecimentos sobre o suposto esquema de corrupção. Até militares da reserva podem receber a intimação. A Promotoria de Justiça requisitou à Auditoria Militar a instauração de sindicância para avaliar o patrimônio de todos os acusados na operação Amigos S/A, que será conduzida pela CGU. O comandante da PM destacou que as denúncias feitas até agora são referentes ao período entre setembro de 2010 e outubro de 2011. Nessa época, o coronel Alexandre Fontenelle comandava o 41º BPM (Irajá) e não estava ainda à frente do comando-geral da corporação.