Um dos maiores ícones da hotelaria carioca, o Hotel Glória, que em 2008, ao ser comprado pelo empresário Eike Batista passou a se chamar Glória Palace Hotel, parece estar longe de ser finalmente reativado, segundo os próprios operários da obra de restauração, falta até material para trabalhar.
Em reforma desde 2010, a previsão de conclusão é para o primeiro semestre de 2014, antes da Copa do Mundo, já que o hotel está dentro do projeto ProCopa Turismo, do BNDES, que libera recursos milionários a hotéis do país visando o mundial do Brasil.
Mesmo com prazo estipulado para daqui a um ano, os operários da obra de restauração e modernização do Hotel Glória garantem que ele não estará pronto para a Copa do Mundo.
“Está bem difícil, tem muita coisa atrasada e muito serviço por fazer. Às vezes há falta de material, já ficamos cerca de uma semana parados por causa disso e não duvido que isso ocorra de novo em breve. Por exemplo, às vezes faltam blocos de concreto para as paredes”, revela um dos operários da parte de alvenaria que não quis se identificar para evitar represálias da sua empresa, a Formal Alvenaria.
Outro operário, que também aceitou falar com a condição do anonimato, confirma a informação da falta da material: “às vezes ficamos de bobeira porque não tem material para trabalhar, pois está havendo uma demora na entrega”.
O atraso na obra também tem relação com a diminuição do tempo de trabalho dos operários. Antes eles trabalhavam de 7h às 19h e aos sábados e domingos e agora, de acordo com outro operário que também pediu anonimato, o expediente é até as 17h e não há mais trabalho aos finais de semana. “Nesse ritmo, só em 2020, e, mesmo voltando ao antigo ritmo, demoraria mais três ou quatro anos para finalizar, pois está tudo atrasado. Se for para ficar pronto para a Copa, não dá”, afirma ele.
Enquanto a parte interna da obra está completamente atrasada, a fachada externa do Hotel Glória está com 70% a 80% concluída, com a pintura definitiva. A nova fachada será uma reconstituição da original, de 1922, que foi modificada em reforma nos anos 1960 e 1970.
Moradores do entorno revoltados
O Hotel Glória é cercado por prédios residenciais e os moradores desses edifícios estão extremamente irritados com o andamento das obras. Para a pensionista Maria José, com uma única janela em seu apartamento voltada para o hotel, a obra é um “inferno total”. Os holofotes muitas vezes ficam ligados de noite, mesmo com a obra parada e um deles, afirma a moradora, fica direcionado para a sua janela iluminando sua casa na madrugada e perturbando seu sono.
A pensionista diz que já tentou diversas vezes utilizar o serviço de atendimento ao cidadão da Prefeitura, através do número 1746, para reclamar, mas afirma que nunca foi atendida. Por conta disso, Maria José diz estar disposta a abrir um processo contra a empresa REX, de Eike Batista, responsável pela restauração do Hotel Glória.
Outra moradora do entorno, a aposentada Lilian Lobato, diz que os responsáveis pela obra no hotel se prontificaram a colocar telas de proteção nas janelas dos prédios vizinhos para evitar que entre poeira no apartamento. No entanto, ela diz que os moradores do edifício não concordaram com a ideia: “Quem tem que colocar telas de proteção são eles lá, não na minha janela”.
REX se defende
A REX, empresa do ramo imobiliário do grupo de Eike Batista, em nota oficial através de sua assessoria de imprensa, nega que as obras estejam atrasadas:
“A previsão é que o Gloria Palace Hotel abra em soft opening no primeiro semestre de 2014, após conclusão da obra civil, prevista também para o primeiro semestre de 2014. O cronograma previsto está sendo seguido normalmente. A obra opera das 7h as 17h, sendo que de 7h as 10h apenas com pequenos trabalhos que produzam ruídos inferiores a 65 decibéis, seguindo a legislação vigente”, diz a nota
Em outro documento enviado ao Jornal do Brasil pela assessoria da REX, a empresa alega que houve mudança no projeto inicial de restauração do Hotel Glória.
“O projeto inicial de 2010, que previa uma torre comercial e 200 quartos, foi substituído em 2011 por um projeto 100% hoteleiro, com ampliação para 354 quartos, devido ao importante momento que vivia o Rio de Janeiro com a definição da cidade-sede das Olimpíadas de 2016. Foi uma mudança favorável para o país, pela conquista do ‘carimbo olímpico’”.
Passado luxuoso
Inaugurado em 1922, o Hotel Glória foi projetado pelo francês Joseph Gire, o mesmo arquiteto que desenhou o Hotel Copacabana Palace, na década de 1920. Ele foi construído para ser a sede da Exposição Internacional de 1922, que comemorou o centenário da Independência do Brasil.
Seu projeto original, em estilo clássico, incluía também um teatro, cassino (que não existe mais), salões de festas e de jogos e áreas de lazer, além de 150 quartos. Mais tarde, após uma ampliação, o Hotel ganhou mais dois andares, chegando a um total de 610 quartos.
Como a Glória é próxima do Centro, ele sempre atraiu e abrigou muitos políticos e chefes de Estado do Brasil e do mundo, além de artistas do cinema e cantores renomados. Uma de suas grandes marcas foi o concurso de fantasias do Carnaval - que teve 34 edições até o seu fim, em 2008.
Depois de 50 anos como propriedade da família de Maria Clara e Eduardo Tapajós, o Hotel Glória foi vendido, em 2008, ao empresário Eike Batista, que pretende modernizá-lo e transformá-lo novamente num hotel de alto luxo.
*Do Projeto de Estágio do Jornal do Brasil