As investigações sobre a morte do artista plástico chileno Jorge Selarón, de 65 anos, caminham para a tese do suicídio, segundo a delegada Renata Araújo, da Divisão de Homicídios (DH). Um dos indícios que reforçam a suspeita é de que o laudo da perícia mostra que o conteúdo do solvente foi despejado em Selarón da cabeça para os pés, e a tampa da lata foi encontrada na casa dele, o que indica que o mais provável é que ele mesmo teria colocado o líquido em seu corpo. O artista foi encontrado morto na manhã de quinta-feira (11), com o corpo queimado, nas escadarias da Lapa, que ajudou a transformar em ponto turístico do Rio através da instalação de um mosaico de azulejos coloridos. Ao lado do corpo, havia uma lata de solvente e um isqueiro.
O laudo da necrópsia, feito pelo Instituto Médico-Legal (IML), indicou que a causa da morte do artista foi carbonização de 4º grau e que ele não sofreu qualquer tipo de violência antes. Além do laudo da perícia, relatos de testemunhas também reforçam a teoria de suicídio. Segundo a delegada, oito pessoas ouvidas afirmaram que o artista estava em depressão, buscando remédios para se matar e que desejava ser cremado e ter suas cinzas jogadas na escadaria.
"Ouvimos várias testemunhas e todas elas confirmaram que a vítima estava deprimida, não estava pintando e demonstrou aos amigos o interesse de se matar", afirmou a delegada.
A delegada contou que apesar do laudo não estar concluido, o solvente pode ter sido despejado ainda dentro de casa, no entanto, o fogo foi aceso do lado de fora, nas escadarias. Segundo ela, esta seria uma forma de o artista proteger sua casa e o ateliê.
Ainda de acordo com a delegada, por causa das ameaças que dizia estar recebendo, dois amigos se revezavam morando com Selarón. No dia de sua morte, entretanto, o artista teria pedido para ficar sozinho.
Selarón havia denunciado ameaças de morte em cartas datadas de novembro do ano passado. No texto, ele cita Paulo Sérgio Rabello, o Paolo, seu ex-colaborador, como o autor das ameaças. Paulo, irmão do traficante Wilton Quintanilha Rabello, o Abelha, foi uma das pessoas a prestar depoimento nesta sexta-feira. Ele negou as ameaças.
O corpo do artista permanece no Instituto Médico Legal (IML). A família, que mora no Chile, tem três dias para liberar o corpo, de acordo com o órgão.
Enterro
A família do ceramista mora no Chile e já foi notificada sobre a morte dele. Até agora, não se sabe se o corpo de Selarón será sepultado no Chile ou no Brasil.
Selarón escreveu duas cartas, em novembro do ano passado, relatando ameaças de morte que estaria recebendo. Em depoimento prestado nesta quinta-feira na Delegacia de Homicídio, o secretário de Selarón, César Augustin, afirmou que as ameaças começaram quando um testamento escrito em 2007, onde Paolo foi classificado pelo próprio artista como seu herdeiro, foi anulado. As pressões, de acordo com o assessor, contribuíram para aumentar um quadro de depressão que já vinha abatendo o chileno.
"Acho que foi suicídio. Já vinha passando por um processo de depressão por conta das ameaças que vinha sofrendo. Ele não aguentou mais as pressões desse louco desequilibrado", disse Augustin. "Eu mesmo já havia sido agredido pelo Paulo. Me deu uma paulada nas costas em um dia que estava descendo a escadaria. A sorte é que atingiu a minha mochila", contou o argentino.
Nesta quinta-feira, uma reportagem do jornal O Globo, noticiava também as ameaças por parte do ex-colaborador o que, segundo vizinhos, contribuiu para aumentar um quadro de depressão que já vinha abatendo Selarón.
Cartas com ameaças
As cartas escritas por Selarón foram entregues ao seu amigo Gemerson Dias, de 73 anos, que diz ter sido “nomeado” pelo artista como o fotógrafo oficial da escadaria. Elas foram escritas em novembro.
Em uma delas, datada do domingo 25 de novembro de 2012, ele diz ter dormido em um hotel “porque todos estes últimos dias tô sendo ameaçado de morte por Paolo”. Mais adiante, o artista expõe que Paolo “até hoje é herdeiro de meus bens. Acontece que ele pretende tomar conta das vendas de meus quadros. Eu falei que não, que isso aconteceria o dia da minha morte, ele não gosto e começo a ficar grosero e amenazo nos últimos 20 dias”. (sic)
Na véspera, como ele relata na carta, com a ajuda de dois amigos – “adbogado (Gemerson e Dr. Mário) tive que colocar uma denuncia na delegacia onde eu fui acompanhado de mia secretaria Dhandara”. (sic)Na outra carta, da mesma data, Selarón volta a falar das ameaças, diz que a relatou a Igor (o melhor amigo dele) e que “este falo que ele está ficando maluco fazer isto com você, que o envio a Londres, Paris, Barcelona, Madri e quatro vezes a Buenos Aires, eu falarei com ele, fica calmo...” (sic)
Em sinal de luto, os vizinhos estenderam panos pretos nas sacadas das casas que ficam na escadaria que deu fama a Selarón. Foi ele quem ornamentou o local com azulejos pintados, tornando famosa a área e atraindo turistas, para os quais ele vendia seus quadros.
* Do Projeto de Estágio do JB