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CNJ apura irregularidades em outra licitação do Tribunal de Justiça do Rio

Entre elas, há falha na estimativa de preços 

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Um contrato entre o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) e uma empresa terceirizada de informática está sendo investigado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Após as irregularidades encontradas na licitação para a construção de um prédio na sede, vencida pela Delta Construções, a Corregedoria do CNJ pediu esclarecimentos sobre a contratação da Gigacom do Brasil Ltda..

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Como explicita o relatório feito a partir de uma inspeção ocorrida em março, o TJ-RJ foi intimado a apresentar em setembro "os esclarecimentos necessários, a fim de que se possa apurar a necessidade de determinações no âmbito administrativo e/ou criminal" na contratação da Gigacom, ocorrida em setembro de 2010, ao preço de R$ 117.043.00,00, quando era presidente do TJ-RJ o desembargador Luiz Zveiter.

O documento do CNJ aponta pelo menos quatro possíveis irregularidades: "falta de clareza na especificação do objeto"; "falha na estimativa de preços"; "ausência de detalhamento do custo do serviço contratado" e "falta de clareza quanto a gestão contratual". Na gestão do atual presidente, desembargador Manoel Rebêlo, foram assinados dois aditivos ao contrato. 

A companhia foi encarregada de montar uma rede interna de dados de alta capacidade entre o tribunal e as suas subseções, espalhadas pelos bairros da capital e cidades do interior. Ela alugaria equipamentos e montaria a infraestrutura de uma rede privada. A duração do vínculo é de quatro anos, até setembro de 2014, e após os aditivos ela assumiu a instalação de 260 pontos: 180 fixos e 80 remotos. 

O Tribunal de Justiça, mais uma vez procurado pelo Jornal do Brasil, não quis se manifestar sobre o relatório do CNJ que é público e está acessível na página do Conselho. Nesta terça-feira, através da assessoria de imprensa, o Tj-RJ limitou-se a comentar que "o processo com os esclarecimentos está com o CNJ, o presidente do Tribunal vai aguardar as suas conclusões para se pronunciar".

Preço pelo maior valor?

Há um item do relatório sobre a "falta de clareza na especificação do objeto" a ser contratado. Nele, os técnicos do CNJ apontam incoerência sobre as responsabilidades da Gigacom. Um anexo ao relatório, em seu item 3.3, revela que a contratada não é responsável pela infraestrutura interna do prédio. Contraditoriamente, no item 6.2, afirma justamente o oposto, quando determina “toda e qualquer obra que venha ser necessária para a execução do objeto do contrato, na sede do TJERJ (sic) e nas localidades ligadas ao órgão, deverão ser realizadas inteiramente às custas da contratada". 

Diz o documento: "Desta forma, a falta de clareza na especificação não permite ao licitante uma visão adequada da infraestrutura necessária, a qual pode estar relacionada apenas a instalação externa ou englobar as obras internas necessárias para instalação e funcionamento do link".

A avaliação do CNJ, mais adiante, fala que outras licitantes, prováveis concorrentes, não puderam estimar com segurança qual a infraestrutura que deveria ficar sob sua responsabilidade e, por isso, não tiveram embasamento para fazer o orçamento do serviço. "Com isso, infere-se que o preço pode ter sido cotado pelo maior valor", diz o texto.

Novamente, o CNJ determinou que o TJ-RJ apresentasse em 15 dias úteis a partir da publicação do relatório, "os esclarecimentos necessários, a fim de que se possa apurar a necessidade de determinações no âmbito administrativo e/ou criminal". 

Estimativas de preços

Mais adiante, os técnicos do CNJ encontraram "falha na estimativa de preços", que podem ter levado a administração do TJ do Rio a realizar contratações com base em preços superiores aos praticados pelo mercado. Dessa forma, os dados apresentados no edital não permitiram avaliar se os custos contratados estão compatíveis com o objeto licitado, nem confirmar a "economicidade da contratação". Alertaram ainda que na pesquisa de preços foram consultados somente fornecedores, sem utilizar referências de contratações de outros órgãos públicos. 

"Na estimativa de preços foi apresentada uma planilha com a totalização dos serviços, o que não possibilitou uma análise consistente quanto aos custos envolvidos na contratação", revela trecho do texto.

O documento do CNJ mostra que, segundo o TJ-RJ, o preço do serviço e da instalação é o mesmo para o ponto fixo e para o ponto provisório, apesar da impossibilidade de conhecer a infraestrutura dos locais provisórios. O relatório pondera ainda que, quando do segundo aditivol, que acrescentou 50 pontos móveis ao total de pontos, a Gigacom "abriu mão" dos custos de instalação, passando a cobrar apenas o custo da locação. 

“Este grau de incerteza pode levar a empresa a distribuir o custo que ela imagina ter pelo número total de pontos contratados. Prova de que a diferença de preços existe é que ao aditar o contrato em 50 pontos móveis, a contratada “abriu mão” dos custos da instalação e cobrou apenas o custo da locação. Sabe-se que a empresa não arcaria com o custo da infraestrutura a não ser que este estivesse distribuído com outro item do preço, no caso, a locação dos equipamentos".

Estudos preliminares

No item que aborda a "ausência de estudos preliminares" o texto revela que eles não foram feitos, embora seja uma exigência da lei 8.666/93. Estes estudos deveriam preceder a tudo uma vez que, "com base neste documento será possível verificar os requisitos mínimos para a contratação, bem como mensurar a quantidade do serviço necessário". 

Além disso, o relatório destaca que "merece atenção especial" a avaliação de soluções que já existem no mercado e a análise da viabilidade para implementação no Tribunal, identificando "o número de pontos fixos e remotos necessários, topologia, enfim, todas as variáveis que podem interferir na contratação e consequentemente têm influência no preço".  

Orçamento detalhado

O relatório destaca que, de acordo com a Lei de Licitações, a administração do Tribunal de Justiça do Rio deveria apresentar orçamento detalhado do custo do serviço a ser contratado. Tendo por base esta exigência legal, o relatório destaca que a empresa licitante, no caso a Gigacom, precisa decompor seus preços para tornar transparente "os custos reais envolvidos na formação de preços". Lembra, inclusive, que este detalhamento também foi exigido pelo tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ). Mesmo assim, os técnicos constataram que "não conta do processo o documento em que a contratada detalha a formação do custo".

Segundo o TCE, o TJ-RJ respondeu ao que foi pedido, mas "os documentos e informações estão sendo analisados e ainda não foram à votação pelo plenário da Casa. Portanto, não existe decisão definitiva a respeito". 

Qualidade do serviço

Por fim, a equipe de inspeção detectou falta de clareza na gestão contratual da Gigacom. O termo de referência prevê o acompanhamento do desempenho dos serviços da empresa mas no processo não há, segundo os técnicos nenhum documento que confirme que este acompanhamento foi feito: "(...) observa-se nos documentos anexados às faturas que não constam evidências que corroboram para o atesto dos serviços". 

Outra observação feita foi de que a Gigacom "não cumpriu o prazo para entrega dos links referentes à fase 2 e 3 do cronograma definido, no entanto, não consta documento que comprove aplicação da penalidade à contratada". 

Como efeito, o CNJ fez uma série de determinações, que teriam de ser esclarecida dez dias úteis após a publicação do relatório. Entre elas estão: apresentar evidências que comprovassem a prestação satisfatória dos serviços; esclarecer como é feito o acompanhamento e controle dos pontos provisórios e a aplicação de multa à Gigacom, referente ao atraso no cumprimento do cronograma; e elaborar pesquisa de satisfação a ser encaminhada ao usuário final do serviço.