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No Rio, são os diques que preocupam ambientalistas

Brumadinho liga o sinal de alerta no estado, onde construções foram projetadas sem prever aumento da densidade demográfica

Divulgação/Inea -
Rio Sarapuí nas proximidades de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense: diques foram construídos nos anos 50, quando não havia população ribeirinha ao longo do leito
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Depois da tragédia com a barragem de rejeitos da mina Córrego do Feijão, em Brumadinho, na Região Metropolitana de Minas Gerais, o Rio de Janeiro, estado vizinho, acendeu seu sinal de alerta. A maior preocupação não são as barragens com restos de mineração — só existe uma deste tipo em solo fluminense —, mas o risco que vem das águas e dos diques construídos nas margens dos rios da Baixada Fluminense.

Responsável pela elaboração do Projeto Executivo Geotécnico de trechos para os diques de proteção na bacia do Rio Sarapuí, o engenheiro civil Narcizo Lemos, vice-presidente do Sindicato Nacional das Empresas de Arquitetura e Engenharia Consultiva (Sinaenco), faz um alerta.

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Rio Sarapuí nas proximidades de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense: diques foram construídos nos anos 50, quando não havia população ribeirinha ao longo do leito (Foto: Divulgação/Inea)

“Na bacia do Sarapuí, onde o projeto é aparentemente fundamentado em estudos da Fundação Coppetec e da Serla, adotou-se como enchente de projeto a correspondente a um tempo de recorrência de 50 anos. No entanto, esses diques são de terra e passíveis de erosão. Além disso, quando construídos, na década de 50, pelo governo federal, não tínhamos milhares de habitantes nas suas margens. Hoje, isso representa um grande risco”, afirma o engenheiro.

Lemos diz que os projetos ficaram parados no tempo. “Quando criados, foram projetados para proteger pastagem e gado, e não pessoas e suas construções. Se ruir, a água se espalha causando uma cheia maior do que se não houvesse esses diques. Uma chuva mais forte pode destruir muitas famílias”, diz o vice-presidente da Sinaenco.

Ainda de acordo com Lemos, o governo precisa rever não apenas as estruturas dos diques da Baixada, mas também evitar as construções nas margens de tais estruturas. “A ocupação desordenada prejudica também a fiscalização e a manutenção”, acrescenta o engenheiro.

Para o ambientalista Sérgio Ricardo, do Movimento Baía Viva, a questão dos diques é uma das mais urgentes no que diz respeito às questões ambientais do estado. “As bombas, responsáveis por bombear a água em períodos de chuva, estão queimadas. Não há manutenção há anos”, denuncia ele, que fez inspeção recente no município de Duque de Caxias. É nesta cidade que fica a Favela do Dique, assim batizada por ter crescido às margens do córrego.

Responsável pela manutenção e inspeção nos diques do estado, o Instituto Estadual do Ambiente (Inea) foi procurado para esclarecer como vem sendo feita a manutenção de tais estruturas. No entanto, nenhuma explicação foi dada até o fechamento desta reportagem.

Além dos diques, há, ainda, outras duas preocupações destacadas pelo ambientalista Sérgio Ricardo. A primeira é a proximidade do Rio Paraíba do Sul (que abastece 80% do Estado do Rio) das barragens mineiras. Novos rompimentos em Minas, onde o rio nasce, podem comprometer a principal fonte de água fluminense. O segundo problema seria a “caixa-preta” em que se transformou o “reservatório” de informações sobre as barragens de água no estado.

Relatório de segurança

De acordo com o Inea, o estado conta com 29 barragens com potencial para causar danos em caso de rompimento, infiltração no solo, vazamentos ou mau funcionamento. Mas a situação é mais crítica em duas delas, segundo consta do Relatório de Segurança das Barragens da Agência Nacional das Águas (ANA). No documento, as barragens de Juturnaíba e Gericinó tiveram classificação de risco considerada alta. A primeira fica em Araruama e abastece de água a Região dos Lagos. A cidade tem 130 mil habitantes. A barragem de Gericinó, por sua vez, funciona como defesa contra inundações e fica entre Nilópolis e Mesquita. Juntas, as cidades têm 340 mil habitantes.

Novos dados poderão surgir nesta semana, uma vez que o Ministério Público Federal (MPF) em São Pedro da Aldeia convocou uma visita técnica para quinta-feira, quando pretende verificar as condições de segurança de Juturnaíba. O encontro contará com representantes do Inea, da Prolagos, da Agência Nacional de Águas (ANA), do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e de ambientalistas. O Movimento Baía Viva também participará da vistoria.

A partir da visita, os órgãos competentes deverão informar se estão cumprindo as condições estabelecidas para as autorizações de funcionamento. Também deverão esclarecer se há riscos ambientais e para a população. “Desde 2002, uma resolução do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente ) obriga que cada estado publique inventário das áreas contaminadas. O Rio de Janeiro só publicou relatório em 2013 e, mesmo assim, falho de informações e vazio”, denuncia Sérgio Ricardo. “Em 2015, a Secretaria estadual do Ambiente reconheceu que há no estado pelo menos 328 áreas contaminadas. Depois disso, não soltaram mais relatórios. Questionados depois da tragédia de Brumadinho, só soltam notas e nenhum relatório. Isso não contribui em nada com as prefeituras fluminenses”, critica o ambientalista.

Para ele, há uma necessidade de detalhamento de todos os graus de risco dessas barragens, para evitar tragédias. Mas essas questões parecem ainda guardadas numa caixa-preta ainda não devassada.