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Sindicato dos Médicos do RJ aponta que 60% dos clínicos trabalham muito acima da capacidade

Marcos Tristão -
Na Clínica Sérgio Vieira de Mello, no Catumbi, só casos considerados mais grave são atendidos e pacientes reclamam da falta de remédios para hipertensão
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60% dos médicos que atuam nas clínicas da família da cidade do Rio de Janeiro atendem acima de 3.500 pacientes – capacidade máxima fixada pelo Ministério da Saúde. É o que informa o Sindicato dos Médicos do Rio Janeiro (SinMed/RJ). Um dos diretores da entidade, Alexandre Telles conta que tal percentual foi traçado depois de ouvir os profissionais durante uma assembleia realizada no mês passado.

Uma das unidades que tem todos os seus médicos trabalhando acima da capacidade é a Centro Municipal de Saúde Salles Netto, no Rio Comprido, na Zona Norte. Ali, há quatro meses, duas das seis equipes de saúde da família estão sem médicos. Assim, os clínicos restantes ficaram responsáveis por parte dos pacientes das equipes incompletas.

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Na Clínica Sérgio Vieira de Mello, no Catumbi, só casos considerados mais grave são atendidos e pacientes reclamam da falta de remédios para hipertensão (Foto: Marcos Tristão)

“Eu atendo quatro mil pacientes da minha equipe e mais um mil de uma outra equipe que ficou sem médicos. Tentamos priorizar os casos mais graves, mas não há como não ter prejuízo ao atendimento. Mais de 30 gestantes estão fazendo pré-natal com uma enfermeira. Tentamos dar suporte, mas nem sempre é possível”, conta ela, sob condição de anonimato. Ali, são atendidos, em sua maioria, moradores das comunidades Fallet, Fogueteiro e Escondidinho.

“São equipes muito vulneráveis e convivemos diariamente com a falta de remédios”, acrescenta a médica.

A queixa é bem parecida com a que a dona de casa Dalva dos Santos Seixas, de 65 anos, faz sobre a Clínica da Família Dr. Felippe Cardoso, na Penha. Sua equipe de saúde está sem médico há cerca de um mês, desde que o profissional que ocupava a vaga anteriormente pediu demissão.

“Sem clínicos, estamos sendo atendidos por uma enfermeira. Estou precisando de um pedido médico para fazer exame de tireoide e ainda não consegui”, conta ela, que, ao apresentar uma receita com medicamentos para tratamento de hipertensão, não conseguiu levar para casa nenhum deles.

“A coisa tá tão feia que não recebemos mais nem as visitas domiciliares. Tenho um filho de 30 anos, acamado, precisando muito de atendimento, mas não conseguimos”, diz.

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Dalva Seixas se deparou com falta de medicamentos para hipertensão, na Penha (Foto: Maria Luisa de Melo)

Os medicamentos Enalapril e Hidroclorotiazida, usados para controle de hipertensão arterial, que dona Dalva não consegue encontrar na farmácia da clínica da família na Penha,são os mesmos que o aposentado Hélcio Ribeiro de Souza, de 68 anos, não consegue encontrar.

Na Clínica da Família Sérgio Vieira de Mello, no Catumbi, onde seu Hélcio é atendido, o problema da falta de remédios tem um agravante: ele não consegue comprá-los por conta própria, através do programa farmácia popular, do governo federal, porque sua receita está desatualizada.

“Não consigo uma receita nova porque não tem médico. É uma completa bagunça. Vim até aqui buscando atendimento, com essa questão, que é grave, e me mandaram voltar no dia 18. Até lá, o que eu faço? Fico sem tomar os remédios?”, questiona o aposentado.

Em visita à unidade, a equipe de reportagem do JORNAL DO BRASIL foi informada por funcionários que todos estavam trabalhando em “estado de greve” e que, por isso, só os casos mais graves estavam sendo atendidos, conforme acordado com o Tribunal Regional do Trabalho do Rio de Janeiro. A greve iniciada no dia 1º de novembro e considerada legal, na ocasião, teve como principal estopim os salários atrasados dos funcionários das Organizações Sociais responsáveis pela gestão das clínicas da família. No entanto, segundo os próprios funcionários, tais pagamentos já foram normalizados.

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Hélcio Ribeiro também não conseguiu consulta com clínico para atualizar receituário (Foto: Maria Luisa de Melo)

Uma nova assembleia que decidirá os rumos da paralisação está marcada para hoje.

Procurada, a Prefeitura não comentou sobre o fato de os médicos trabalharem acima da capacidade. Sobre o não atendimento de pacientes marcados para a clínica do Catumbi, informou que a equipe médica da unidade está completa. Já sobre a falta de médicos na unidade da Penha, informou que de suas 15 equipes, duas estão sem médicos, mas nega que os pacientes estejam desassistidos. “A administração da clínica já está providenciando a reposição dos profissionais”, diz a nota. Sobre os medicamentos em falta, a gestão municipal diz que “já iniciou o processo de separação dos medicamentos enalapril, hidroclorotiazida e amlodipina para a distribuição nas Unidades de Atenção Primária”.

Maria Luisa de Melo - Dalva Seixas se deparou com falta de medicamentos para hipertensão, na Penha
Maria Luisa de Melo - Hélcio Ribeiro também não conseguiu consulta com clínico para atualizar receituário