ASSINE
search button

A praça Saens Peña, na Tijuca, inspira cuidados em seus chafarizes, bancos e canteiros

Marcos Tristão -
Os dois chafarizes da praça estão desligados e o lago, vazio. A prefeitura informa que está fazendo o levantamento das necessidades para providenciar o conserto
Compartilhar

Com o calor que chega na primavera, a sensação de desconforto dos frequentadores da Praça Saens Peña, na Tijuca, Zona Norte do Rio, está ainda mais acentuada. É que os dois chafarizes estão desligados “há muito tempo”, como atesta o aposentado Tarcísio Nogueira, 81 anos, diariamente no espaço para jogar damas com um grupo de amigos. Mesmo morando no Engenho Novo, ele mantém o antigo hábito de bater seu ponto por ali, e sua nostalgia é implacável: “Depois do metrô isso aqui acabou. Antes, era tudo ajardinado, havia muitos cinemas e a Zona Norte em peso descia para cá. Hoje só restam canteiros ressecados”.

Macaque in the trees
Os dois chafarizes da praça estão desligados e o lago, vazio. A prefeitura informa que está fazendo o levantamento das necessidades para providenciar o conserto (Foto: Marcos Tristão)

O metrô permitiu o rápido acesso da população aos quatro cantos da cidade, porém, não há dúvida de que as obras — iniciadas em 1976, mesmo ano em que o cinema Metro Tijuca, o mais famoso do bairro, foi fechado — ajudaram a enfear a área de lazer, cujo nascimento se deu a partir da instalação de uma fábrica de chitas, considerada uma das primeiras indústrias do país. A partir de 1911, o antigo Largo da Fábrica das Chitas foi rebatizado de Praça Sáenz Peña, em homenagem aos ex-presidentes argentinos Luís e Roque Sáenz Peña — a grafia se aportoguesaria ao longo dos tempos para Saens Peña —, quando ganhou seu primeiro projeto paisagístico, de inspiração francesa, pela mão do arquiteto e urbanista brasileiro José da Silva Azevedo Neto (1908-1962). A partir da década de 1920, o espaço tornou-se um centro de entretenimento, gradualmente esvaziado pelo fechamento de oito salas de cinema, a maior concentração da cidade em um mesmo espaço, nas décadas de 1970 e 1980.

Macaque in the trees
Tarcísio Nogueira (à esq.) observa os amigos jogando damas (Foto: Marcos Tristão)

Ao redor da praça predominam as construções de estilo art déco, que teve seu auge na década de 1930. Exemplificam o período arquitetônico os prédios que abrigaram os cinemas Carioca, hoje ocupado pelo templo da Igreja Universal do Reino de Deus, e América, que virou drogaria. A partir da década de 1950, começou a surgir o estilo modernista nos edifícios residenciais e comerciais, sob a influência do arquiteto Oscar Niemeyer (1907-2012).

Os cinemas foram gradativamente ocupados por estabelecimentos comerciais e igrejas, que mantêm o ritmo frenético do local. Na década de 1990, por sua vez, uma nova reforma ampliou o espelho d’água, hoje totalmente vazio, e as pedras portuguesas foram trocadas por blocos de concreto coloridos, de manutenção facilitada. A praça ganhou brinquedos mais rústicos e resistentes, que permanecem em bom estado, e uma grande área coberta, dividida pela população de rua, idosos e aposentados, como Tarcísio Nogueira. “Aqui há muito lixo. As meninas da Comlurb têm o trabalho de varrer, mas logo tudo volta a ficar sujo”, diz o aposentado. O JORNAL DO BRASIL flagrou até um saco de lixo lançado no telhado daquele pedaço da praça.

Macaque in the trees
O banco com pintura descascada (à dir.)reclama conserto numa de suas ripas de madeira (Foto: Marcos Tristão)

Se os brinquedos e equipamentos de ginástica passam no teste de qualidade, o mesmo não se pode dizer dos bancos. Vários têm falhas nas ripas de madeira e pintura descascada. E se o início da praça causa uma má impressão por conta do lago vazio, chafarizes desligados, canteiros ressecados e cheios de mato, o mesmo não ocorre com o final dela, a partir da estátua de porte atlético do “pioneiro da ginástica pelo rádio”, Oswaldo Diniz Magalhães (1904-1998), quase um ET nesses tempos em que todos malham turbinados pela onda dos novos aplicativos e pela busca da saúde.

Ali, a rua foi incorporada à praça, aprazível com as sombras das árvores frondosas que escaparam ao abate predominante no restante do espaço. Além de uma generosa banca de revistas, está instalada naquele trecho a grande barraca onde funciona o sebo da Associação Brasileira de Livros. “É um cantinho muito tranquilo”, relata Alessandro Cordeiro, que há cerca de dez anos pilota a barraca montada ali duas vezes ao ano, sem data certa. “As vendas são estáveis, o movimento maior sempre acontece no início do ano”, observa.

Ali perto, às terças e sextas-feiras, das 9h às 12h, um grupo de voluntários aplica gratuitamente as massagens criadas pelo humanista francês René Mey, uma “terapia de regeneração celular”, conforme o banner informativo pregado no local. A experiência, de poucos minutos, começou em maio de 2017 e, desde então, atrai fregueses, majoritariamente idosos e aposentados, além dos jovens mais curiosos que passam por ali. Todos se submetem aos toques carinhosos dos voluntários, que acreditam piamente nos efeitos benéficos da prática. “A regeneração celular é incontestável. Se não fosse, não continuaríamos a gastar nosso tempo com isso. Desde o início, já atendi cerca de oito mil pessoas”, contabiliza o engenheiro aposentado Kleber Hamones, ele mesmo de aparência muito jovem para seus 71 anos.

Macaque in the trees
O engenheiro Kleber Hamones aplica terapia de regeneração celular em um idoso (Foto: Marcos Tristão)

As providências

Segundo a secretaria municipal de Conservação e Meio Ambiente (Seconserma) será feita uma vistoria para averiguar as necessidades e fazer o reparo nos bancos. Quanto aos chafarizes, a equipe técnica já vistoriou e a Gerência de Monumentos e Chafarizes está fazendo o levantamento das necessidades dos serviços para realizar o conserto, a fim de religar o equipamento e fazê-lo funcionar plenamente. Já foram detectados problemas nas partes hidráulica e elétrica e a gerência já está trabalhando para fazer todos os reparos de manutenção necessários, ainda sem prazo para terminar.

Ainda de acordo com a prefeitura, o contrato de manutenção entrou em vigor esse ano, e a gerência trabalha no conserto/reparo dos monumentos/chafarizes, cujo valor para 12 meses é de R$ 820 mil. “No momento, estão sendo feitas vistorias técnicas para elencar prioridades. Hoje, a Seconserma cuida de 1.374 monumentos e chafarizes públicos na cidade do Rio de Janeiro, um dos maiores acervos do país”, diz o comunicado.

De acordo com a Comlurb, a Praça Saens Peña é varrida diariamente, em três turnos, incluindo a área do chafariz desativado. A coleta domiciliar é realizada às terças, quintas-feiras e sábados, e a remoção de lixo público é executada diariamente. “O local é de intensa circulação, concentração de moradores em situação de rua e ambulantes. A Companhia solicita que os pedestres descartem o lixo corretamente para ajudar a manter a praça limpa.”

Marcos Tristão - Tarcísio Nogueira (à esq.) observa os amigos jogando damas
Marcos Tristão - O banco com pintura descascada (à dir.)reclama conserto numa de suas ripas de madeira
Marcos Tristão - O engenheiro Kleber Hamones aplica terapia de regeneração celular em um idoso