Memorando de 11 de fevereiro de 1971, escrito pelo assessor do Conselho de Segurança Nacional dos Estados Unidos Arnold Nachmanoff, mostra que o governo americano acreditava que o presidente brasileiro Emílio Garrastazu Médici “devia ter consciência da extensão da violência usada pelas forças de segurança brasileiras. E, talvez, tenha dado consentimento tácito em vez de enfrentar os elementos da linha dura nas Forças Armadas.” Sobre Médici, o documento dizia ainda que, apesar de sua possível conivência, seus “instintos próprios parecem moderados”.
“Ele (Médici) teve um papel pessoal em desarmar a polêmica sobre a tortura no último ano. Contudo, o reaparecimento da publicidade em torno da tortura pode danificar sua imagem seriamente”, escreveu Nachmanoff. O documento do Conselho de Segurança Nacional faz parte dos papéis que a Agência Central de Inteligência (CIA) americana tornou públicos em 2016 e 2017.
Ele foi enviado ao então conselheiro de segurança nacional, Henry Kissinger, em razão da visita que Médici faria aos Estados Unidos. O título era Relatos de tortura podem complicar a visita de Medici. Trata-se do segundo documento revelado recentemente pelos americanos a ligar presidentes do ciclo militar (19641985) a violações dos direitos humanos - EUA vinculam Médici a torturas na semana passada, outro memorando da CIA fez o mesmo com Ernesto Geisel e João Figueiredo. Médici governou o País de 1969 a 1974.
“Relatos sobre o crescimento do uso de violência e tortura por oficiais brasileiros em sua campanha contra terroristas e subversivos tornaram-se mais frequentes nas semanas recentes após terem diminuído no último verão”, começa o papel. Em alguns casos, segue o documento, suspeitos de terrorismo aparentemente foram mortos depois de terem sido submetidos “a torturas extremas para evitar o risco de serem soltos como parte do resgate em um sequestro”. A parte do documento que explicaria essa passagem continua sob sigilo. (Estadão Conteúdo)
Kissinger e o humanismo
O Seis páginas com a transcrição da conversa de 22 de outubro de 1974 do secretário de Estado Henry Kissinger com seu staff mostram ele e a burocracia do departamento acuados pelo Congresso americano, para que a política externa dos Estados Unidos levasse em consideração o respeito aos direitos humanos. “O que vocês querem que eu faça? Mostrar que eu sou um humanista?”, pergunta Kissinger aos auxiliares.
Um deles responde que o democrata Don Fraser promovia audiências na Câmara e pressionava o governo republicano de Gerald Ford pelas relações com Coreia do Sul, Filipinas, Indonésia e Chile. “Todos aliados”, diz Kissinger. Para ele, a pressão enfraquecia a posição americana no mundo. “Você acha que a posição apropriada para o Departamento de Estado é ser um reformatório para aliados?”, questiona Kissinger. O Brasil entrou na pressão de Fraser por causa do desaparecimento da professora da USP Ana Rosa Kucinski, de seu marido, Wilson Silva, e do ex-deputado estadual Paulo Stuart Wright. Eles militavam em organizações clandestinas - Wright era cidadão americano. É o que mostra telegrama do Departamento do Estado à embaixada no Brasil.