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STF está prestes a decidir que deputados condenados perdem logo mandatos

Sessão foi suspensa quando votação estava em 4 a 4Inboxx

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O Supremo Tribunal Federal praticamente decidiu, nesta segunda-feira, que é automática a perda dos mandatos dos três deputados federais – João Paulo Cunha (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT) – condenados por crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, não cabendo manifestação da Câmara dos Deputados.

A sessão foi suspensa quando o placar registrava um empate de 4 votos a 4, sem que fosse colhido o voto do decano Celso de Mello que – no entanto – antecipou, no debate, que vai consolidar a maioria a na linha do voto do ministro-relator Joaquim Barbosa.

A maioria deve ser formada pelos ministros Joaquim Barbosa (relator), Luiz Fux, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Celso de Mello. Depois de muito debate, acompanharam o voto divergente do ministro-revisor, Ricardo Lewandowski (que, juntamente com o relator, já votara na última quinta-feira), Rosa Weber, Dias Toffoli e Cármen Lúcia.

Assim, o STF deve firmar, na quarta-feira, na 53ª sessão do julgamento da Ação Penal 470, o entendimento definitivo de que a perda do mandato de parlamentar condenado em processo criminal, no foro privilegiado do Supremo, independe de “decisão” do plenário da Casa do Congresso em que exerça o mandato popular. Ou seja, a interrupção do mandato é conseqüência automática da condenação criminal depois de seu trânsito em julgado.

A Constituição

O debate da questão, que já consumiu duas sessões, ocorre em torno de dois artigos da Constituição. O artigo 15 da Constituição dispõe que “é vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará”, entre outros casos, “quando houver “condenação criminal transitada em julgado, enquanto durarem seus efeitos”. 

Já o artigo 55 prevê a perda do mandato de deputado ou senador “que sofrer condenação criminal em sentença transitada em julgado”, mas dispõe também que “a perda do mandato será decidida pela Câmara dos Deputados ou pelo Senado Federal, por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa”

Relator e revisor

Na sessão anterior tinham votado, apenas, os ministros Joaquim Barbosa (relator) e Ricardo Lewandowski (revisor), que mais uma vez discordaram. O relator Joaquim Barbosa defendeu a tese – com base em jurisprudência até então não consolidada do STF – de que uma Casa do Congresso pode, sim, até não cassar o mandato de parlamentar nos casos em que a condenação não seja de natureza grave. Mas não no caso de crimes da “gravidade” daqueles pelos quais foram condenados os três deputados federais.

“Condenado o parlamentar pelo Judiciário, inexiste espaço para pronunciamento político da Casa a que ele pertença. No caso em exame, os deputados praticaram o grave crime de corrupção passiva, revelando conduta inteiramente incompatível com o exercício de seus cargos. Eles violaram o interesse público, e seria inconstitucional manter o mandato de parlamentar que foi condenado pelo STF em ação criminal transitada em julgado. O efeito do que está previsto no artigo 55 da Constituição é meramente declaratório”, afirmou Barbosa.

O ministro Ricardo Lewandowski, ao contrário, entendeu que se o parlamentar pode perder os direitos políticos com base no artigo 15, o mesmo não acontece com relação ao mandato, que é “sanção excepcional”.

Ele leu trechos dos anais da Assembléia Constituinte para defender a sua tese de que – mesmo condenado pelo STF, e com sentença transitada em julgado – o deputado ou senador só pode perder o mandato depois de deliberação da respectiva Casa do Congresso. Chegou mesmo a admitir a ideia de que um parlamentar condenado a pena de prisão em ação penal pode ser punido no regime de semiliberdade. Ou seja, continuar a exercer o seu mandato, e recolher-se a albergue durante a noite. Ou tirar uma licença caso seja condenado ao regime fechado.

Com o revisor

Na sessão desta segunda-feira, a ministra Rosa Weber, num longo voto, divergiu do relator, começando por dizer que a questão era de “extrema delicadeza”. A seu ver, mandato e democracia representativa são princípios interligados, não cabendo ao STF “interpretar o dispositivo sem levar em conta as prerrogativas parlamentares, e o enfraquecimento da intangibilidade do mandato”.

“A condenação criminal de um representante do povo pode ser entendida como quebra de relação de confiança. Mas a quem compete decidir acerca da consequência da quebra dessa relação de confiança? O Poder Legislativo está submetido ao Poder Constituinte, e o mandato não pode deixar de ser considerado em sua dimensão essencialmente política”, afirmou Rosa Weber.

Para Rosa Weber, a Constituição veda a cassação dos direitos políticos, e prevê regra especial para perda de mandado de parlamentar. Assim, a perda de mandato não se confunde com perda de direitos políticos. Nesta linha, acompanhou o voto do ministro-revisor.

O voto da ministra reacendeu a discussão entre os que estavam com o relator e os que dele divergiam e apoiavam o revisor. Depois de mais de duas horas de debate, seguiram os votos de Lewandowski e de Rosa Weber os ministros Dias Toffoli e Cármen Lúcia

Com o relator

A corrente favorável à perda imediata de mandato eletivo por parlamentar condenado em processo penal começou a se formar com o voto do ministro Luiz Fux, segundo o qual a atividade parlamentar “vem sofrendo nova mutação, até por pressão popular”. E citou a Lei da Ficha Limpa, que nasceu de “iniciativa popular”, e que veda a candidatura de quem foi condenado por órgão colegiado do Judiciário (tribunal) pela prática de crimes de corrupção.

“Parlamentares podem ofender a lei penal, e continuar a exercer mandato?  O Supremo Tribunal tem de cumprir o seu poder-dever de fazer cumprir a sua decisão. Isto é aplicação da lei, e cabe ao STF interpretar a aplicação da lei conforme a Constituição”, ressaltou Fux no seu voto.

Gilmar Mendes reafirmou sua posição já conhecida, no sentido de que a própria Carta de 1988 também dispõe que (parágrafo 4º do artigo 37), segundo o qual “os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos e a perda de função pública”. A seu ver, se a condenação por crime de improbidade – menos grave do que crimes de corrupção e de peculato – impõe a “perda de função pública”, não teria sentido que um parlamentar, ocupante de função pública de alto nível, não perdesse automaticamente o mandato quando condenado em ação penal.

O ministro Marco Aurélio também entendeu que “a partir do momento em que o título judicial enseja a perda do mandato, não fica submetida ao Parlamento a decisão do STF, que é de caráter resoluto”. E concluiu que os poderes são harmônicos e independentes, mas que “a última palavra” da guarda da Constituição está com o Supremo. Ou seja, no caso ocorre não a suspensão dos direitos políticos, mas a compatibilidade ou não do artigo 92 do Código Penal com a Carta da República. Ressaltou que a “Constituição é um grande todo”, e referiu-se ao artigo 86, segundo o qual o presidente da República - “o maior cargo da República” – deve “ficar suspenso de suas funções”, nas infrações penais comuns, se recebida a denúncia pelo STF, “antes mesmo de ser julgado e condenado”. Assim, o artigo 55 da Constituição subentende que o título condenatório do STF não implica em deliberação da Casa do Congresso de caráter eminentemente político, até por que “direito é bom senso”.

O decano, ministro Celso de Mello, em diversas intervenções, considerou que a perda dos direitos políticos é “efeito geral aplicável a qualquer réu sentenciado”, e que “sem os direitos políticos ninguém pode continuar numa função pública”. Para ele, a Constituição deixa claro que “a posse plena dos direitos políticos é pressuposto de investidura em cargos públicos, inclusive os eletivos”.

As penas

As penas já conferidas pelo STF aos três deputados federais no exercício do mandato foram as seguintes:

João Paulo Cunha: 9 anos e 4 meses, mais multa de R$ 370 mil (corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro).

Valdemar Costa Neto: 7 anos e 10 meses, mais multa de R$ 1,08 milhão (corrupção passiva e lavagem)

Pedro Henry: 7 anos e 2 meses, mais multa de R$ 932 mil (corrupção passiva e lavagem).