ASSINE
search button

Mensalão: Quatro ministros do STF condenam João Paulo Cunha por corrupção 

Toffoli segue revisor e absolve ex-presidente da Câmara 

Compartilhar

Ao final do 15º dia de julgamento da ação penal do mensalão, nesta segunda-feira, quatro ministros do Supremo Tribunal Federal já votaram pela condenação do ex-presidente da Câmara dos Deputados João Paulo Cunha pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e peculato, e dois pela sua absolvição. Mas todos os seis que até agora se manifestaram são favoráveis à condenação do ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato, acusado de corrupção passiva e peculato. Marcos Valério e seus sócios nas empresas SMP&B e DNA, Ramón Hollerbach e Cristiano Paz, foram condenados por corrupção ativa e peculato.

Os ministros Luiz Fux e Cármen Lúcia aderiram, totalmente, ao voto do ministro-relator, Joaquim Barbosa, na continuação do julgamento da ação penal do mensalão na sessão desta segunda-feira. No início da sessão, a ministra Rosa Weber — o primeiro integrante do STF a se pronunciar no mérito da Ação Penal 470, depois do relator e do revisor — tinha acompanhado Joaquim Barbosa na maior parte do seu voto. Mas seguiu o ministro-revisor, Ricardo Lewandowski, no segundo caso de peculato que envolvia João Paulo Cunha, Pizzolato e os sócios das agências de publicidade SMP&B e DNA.

O ministro Dias Toffoli — como já era esperado — foi o único dos quatro integrantes do STF que proferiram seus votos nesta etapa a seguir o voto divergente do revisor, Ricardo Lewandowski, a favor da absolvição do deputado federal João Paulo Cunha (PT-SP). O julgamento desta parte da ação penal continua na quarta-feira, com o voto do ministro Cezar Peluso que — pela regra de antiguidade prevista no Regimento Interno do STF — seria mesmo o próximo a votar, logo depois de Cármen Lúcia.

Rosa Weber

A ministra mais nova da Corte partiu do pressuposto de que corrupção, peculato e lavagem de dinheiro — como todos os pagamentos e recebimentos de propinas — “não se fazem sob a luz de holofotes”. Ou seja, ela afastou, assim como o ministro-relator, a necessidade de “ato de ofício” para consumar o peculato, e assinalou que a recepção por terceiro de dinheiro à guisa de propina, não descaracteriza o crime de corrupção passiva.

A ministra Rosa Weber deixou para “mais adiante”, no entanto, a leitura da parte do seu voto referente ao crime de lavagem de dinheiro de que são também acusados o ex-presidente da Câmara dos Deputados e os donos das agências publicitárias.

Luiz Fux

Num voto de mais de uma hora, Luiz Fux — o segundo a votar, na ordem inversa de antiguidade — fez uma longa introdução para falar da “complexidade” da ação penal do mensalão, tendo em vista o elevado número de réus e as diversas situações em que eles estão envolvidos. Destacou que o Direito brasileiro “repugna a hierarquia das provas, mas exige que o magistrado fundamente a sua convicção, ao fazer a valoração das provas”, procurando afastar a questão da premissa da presunção da inocência alegada pelos advogados dos réus em face da peça acusatória do Ministério Público que, segundo eles, não teria respeitado o princípio do contraditório.

Fux citou jurisprudência do STF para sublinhar que a prova do álibi cabe ao réu, sobretudo quando se trata de “megadelitos”, como ocorre na ação penal em julgamento. E acompanhou totalmente o voto de Joaquim Barbosa proferido na semana passada — referente, unicamente, aos desvios de dinheiro na Câmara dos Deputados e no Banco do Brasil — inclusive quanto à condenação de João Paulo Cunha e Henrique Pizzolato por crime de lavagem de dinheiro (“simulação ou ocultação” de dinheiro recebido para auferir vantagem em função do cargo).

Toffoli

O ministro Dias Toffoli foi o quinto a votar no “bloco” referente às acusações a João Paulo Cunha pela prática dos crimes de lavagem de dinheiro, corrupção passiva e peculato (duas vezes). Ele absolveu o ex-presidente da Câmara dos Deputados, com base na inconsistência das provas constantes dos autos da ação penal. Segundo ele, a acusação é quem tem que fazer a prova. “A defesa não tem que provar sua versão. Esta é uma das maiores garantias que a humanidade alcançou. Estou rebatendo não em relação ao caso concreto, mas como premissa constitucional que esta Corte deve seguir”— afirmou.

Quanto à lavagem de dinheiro, Toffoli disse estar convencido de que Cunha “sempre achou”que sua mulher foi à agência bancária de Brasília receber R$ 50 mil relativos a uma repasse do tesoureiro do PT, Delúbio Soares, que o então presidente da Câmara solicitara para pagar, em nome do partido, pesquisas pré-eleitorais em Osasco e outros municípios paulistas em que tinha particular interesse como deputado federal. Toffoli absolveu-o por “falta de provas”, e não por atipicidade do suposto crime.

Assim, não houve igualmente o crime de corrupção passiva e, portanto, absolveu os supostos corruptores ativos — Marcos Valério, Hollenbach e Cristiano Paz, sócios da SMP&B.

O ministro Dias Toffoli acompanhou o voto do ministro-revisor, também, com referência ao ex-diretor do Banco do Brasil Henrique Pizzolato. Concluiu pela sua condenação por crimes de peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro, ao beneficiar a outra agência de Valério e sócios, a DNA. Em conseqüência, os publicitários foram também condenados por peculato, corrupção ativa e lavagem, no que concerne aos pagamentos fetos à DNA por serviços não prestados efetivamente ao Banco do Brasil.

O ministro-relator, Joaquim Barbosa, não se conteve, e aparteou o ministro Toffoli, tentando convencê-lo dos argumentos apresentados no seu voto quando do início do julgamento.

Carmen Lúcia

Sexta a proferir o voto relativo aos casos da Câmara dos Deputados e do Banco do Brasil (e a quarta na sessão desta segunda-feira), a ministra Cármen Lúcia começou por citar Nelson Hungria, que já falava que “a corrupção campeia em todas as esferas do Estado”. A seu ver, as provas dos autos evidenciam que houve íntima relação entre os R$ 50 mil recebidos pelo ex-presidente da Câmara, João Paulo Cunha (dinheiro sacado por sua mulher) e a “vantagem indevida” concedida à empresa de publicidade de Marcos Valério, que conseguiu ser escolhida para prestar serviços àquela Casa do Congresso.

Assim, acompanhou o voto do relator Joaquim Barbosa, condenando João Paulo Cunha por corrupção passiva, peculato e lavagem de dinheiro, assim como Valério e seus sócios por estes dois últimos crimes e por corrupção ativa.

Da mesma forma, Cármen Lúcia seguiu a maioria que já se formava pela condenação de Henrique Pizzolato e dos sócios da DNA Propaganda — no caso do Banco do Brasil. Ou seja, o ex-diretor do BB por peculato (duas vezes), corrupção passiva e lavagem; Valério e sócios por corrupção ativa e peculato (duas vezes).

Voto do relator  

No dia 16, Joaquim Barbosa tinha condenado João Paulo Cunha (PT), presidente da Câmara dos Deputados à época dos fatos, por corrupção passiva, peculato (duas vezes) e lavagem de dinheiro. Os réus Marcos Valério, Ramon Hollerbach e Cristiano de Mello Paz — sócios das empresas de publicidade SMP&B e DNA— foram igualmente condenados pelo relator, por corrupção ativa e peculato.

O crime de lavagem praticado pelo ex-presidente da Câmara dos Deputados ficou configurado, segundo o ministro-relator, pela recepção de R$ 50 mil em espécie (corrupção passiva), através de sua mulher, em 4 de setembro de 2003, com base numa operação em que a matriz do Banco Rural em Belo Horizonte enviou a ordem de pagamento para a agência em Brasília como se fosse para o próprio banco, havendo, no entanto, comunicação interna para que a quantia fosse entregue ao ex-parlamentar ou à sua esposa.

O primeiro crime de peculato, segundo Barbosa, ficou comprovado com a autorização dada por Cunha para a terceirização do contrato principal que a Câmara dos Deputados mantinha com a agência publicitária  SMP&B (de Valério, Hollerbach e Cristiano Paz). Com base nessa autorização para pagar serviços de terceiros com recursos públicos, da ordem de quase R$ 11 milhões, apenas o percentual de 0,01% (R$ 17.091) foi realmente executado em serviços para a Câmara pelos terceirizados. O outro crime de peculato atribuído ao ex-presidente da Câmara dos Deputados refere-se ao uso da empresa Idéia Fatos e Textos (IFT), do jornalista Luiz Costa Pinto — que era o assessor de imprensa de João Paulo Cunha — a fim de obter vantagens financeiras com o desvio de recursos públicos. O ministro Joaquim Barbosa acolheu a denúncia e a sustentação final do Ministério Público de que houve um desvio de R$ 252 mil em recursos públicos, dos quais João Paulo tinha a posse como presidente da Câmara, em proveito dos também réus Marcos Valério, Ramon Hollerbach e Cristiano Mello Paz.

Voto do revisor

O ministro Ricardo Lewandowski, revisor da ação penal, votou na última quinta-feira pela absolvição do deputado federal João Paulo Cunha (PT-SP) de todos os crimes em que foi enquadrado pelo procurador-geral da República, e pelos quais foi condenado no voto do ministro-relator, Joaquim Barbosa: corrupção passiva, peculato (duas vezes) e lavagem de dinheiro.

Lewandowski divergiu totalmente do voto inicial do ministro-relator Joaquim Barbosa, favorável à condenação do réu por corrupção passiva. E também desqualificou a condenação do ex-presidente da Câmara dos Deputados, sob o argumento de que os fatos não ficaram devidamente comprovados.

Na primeira acusação, o parlamentar, depois de contratar a SMP&B para prestar serviços à Câmara, no valor de R$ 10.745.902, assinou cerca de 50 autorizações para subcontratações, o que teria resultado na terceirização de 99,9% do contrato, embora houvesse cláusula dispondo que a contratada poderia subcontratar outras empresas, “desde que mantida a preponderância da atuação da contratada na execução do objeto”.

O revisor também absolveu Cunha da acusação do segundo crime de peculato, que consistiria na contratação da agência IFT, de seu próprio assessor de imprensa, para prestar serviços à Câmara, e que não teriam sido prestados, beneficiando-se de dinheiro público do qual era gestor. Lewandowski também absolveu, consequentemente — nesta parte do julgamento — os réus Marcos Valério e seus sócios dos crimes de corrupção passiva e de lavagem de dinheiro.

O ministro-revisor só acompanhou o relator na condenação do ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil, Henrique Pizzolato, por crimes de corrupção passiva, de peculato (duas vezes) e de lavagem de dinheiro. O segundo ministro a votar no mérito da ação penal em julgamento, também somou o seu voto ao do relator pela condenação dos réus Marcos Valério e de seus principais sócios na empresa DNA, Cristiano Hollerbach e Cristiano de Mello Paz, pelos crimes de corrupção ativa e peculato (neste caso, como co-autores).

Quanto à acusação de corrupção passiva, segundo Lewandowski, ficou comprovado nos autos ter Pizzolato recebido, em 15 de janeiro de 2004, a quantia de R$ 326.660,67, à guisa de “comissão”, por “serviços prestados” à empresa DNA, dos também réus Marcos Valério e seus sócios Cristiano Hollerbach e Cristiano de Mello Paz  (corruptores ativos). Ainda de acordo com o ministro-revisor, apesar de Pizzolato ter negado o recebimento de quantia superior a R$ 326 mil acondicionada num envelope pardo, os depoimentos demonstraram não resistir a uma análise mais detida a explicação de que o réu fez apenas um favor a Marcos Valério — e à agência DNA — ao receber de Belo Horizonte um envelope fechado para ser entregue a “uma pessoa do PT”. Esta pessoa, conforme Lewandowski, não foi jamais identificada.