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Ex-senador, Zambiasi se diz desiludido com atividade política

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Sérgio Zambiasi tornou-se conhecido dos gaúchos após comandar por mais de duas décadas um dos programas de maior audiência do rádio no Rio Grande do Sul. A popularidade lhe rendeu quatro mandatos consecutivos na Assembleia Legislativa e a eleição ao Senado Federal em 2002, pelo PTB. Após um mandato de oito anos, Zambiasi desistiu da política e retornou à sua grande paixão: o microfone da rádioFarroupilha. Desiludido com a atividade parlamentar, ele disse em entrevista ao Terra que uma das suas maiores frustrações foi não ter sido aprovado o projeto que estabelecia o regime parlamentarista no Brasil.

"O fato de termos o Senado e a Câmara dos Deputados hoje enfraquece a atuação parlamentar porque são duas casas discutindo os mesmos projetos, quando se chega a um acordo no Senado, volta para a Câmara, que modifica o texto e encaminha de novo para os senadores. A tramitação é muito lenta e o trabalho parlamentar não aparece. Eu vi projetos que levaram 12 anos para serem aprovados, isso é inconcebível", afirmou. Segundo Zambiasi, com o modelo de parlamentarismo que ele defendia, o País teria uma única casa legislativa e os projetos seriam discutidos de forma mais célere.

Apesar de afirmar que não tem planos de concorrer novamente a um cargo público, Zambiasi continua filiado ao PTB e disse que em política nunca se pode dizer um "não" definitivo. Ele ainda contou que uma das suas maiores decepções foi ver que, em muitos casos, os interesses de um grupo acabam se sobrepondo às necessidades coletivas. "Essa demora na análise de projetos importantes, de interesse nacional, parando em eventuais interesses de um grupo, me frustrou muito", disse ao ressaltar que somente com o financiamento público das campanhas será possível fazer uma política independente, livre das pressões de setores que financiam as eleições.

Terra publica desde a última segunda-feira uma série de entrevistas com personalidades da política nacional que abandonaram a disputa por cargos públicos depois de terem ocupados postos elevados, como governadores, deputados e senadores. A seguir, confira os principais trechos da quinta entrevista da série:

Terra - Depois de ter sido deputado estadual mais votado e senador, por que o senhor decidiu abandonar a atividade política? Sérgio Zambiasi - Não concorri mais por uma questão de coerência, algo que acho fundamental na vida pública. Em 2001, quando decidi me candidatar ao Senado, afirmei publicamente que não faria uma nova eleição. Se me candidatasse, estaria ferindo o compromisso assumido. E também teria que abandonar definitivamente a minha profissão, pela qual tenho verdadeira paixão.

Terra - O senhor considera longo o mandato de oito anos no Senado? Zambiasi - Sim, é muito longo e acaba criando, de certa maneira, um afastamento das bases. Vi muito isso, o mandato me afastou da população, não consegui conciliar o trabalho em Brasília com a atividade no rádio. Sou uma pessoa muito disciplinada, se você observar minhas faltas no Senado, elas só aconteceram nos dias que havia reunião do Parlamento do Mercosul, em Montevidéu. A primeira pessoa que registrava presença no plenário era eu. Queria cumprir adequadamente o mandato ao qual fui designado e isso me afastou muito do meu Estado.

Terra - Com essa disciplina forte, o comportamento dos seus colegas lhe incomodava? Zambiasi - Tem muitas coisas que nos surpreendem porque vemos ícones, grandes expoentes da política nacional, símbolos da ética, e de repente somos surpreendidos com acusações que abalam a credibilidade dessas pessoas e do próprio Senado. Outra coisa que me incomodava é que o Senado é uma instituição diferente, cada senador tem uma postura divergente dentro das bancadas estaduais, e isso acaba gerando uma grande dificuldade em exercer a defesa mais comprometida com os interesses do Estado. Esse não foi o caso da bancada do Rio Grande do Sul, que felizmente com o Pedro Simon (PMDB) e com o Paulo Paim (PT), conseguimos trabalhar juntos pelos interesses do Estado.

Terra - O senhor acredita que a função do senador está enfraquecida? Zambiasi - Não é somente o senador, o deputado também, à medida que temos duas casas legislativas. Fiz parte da bancada parlamentarista, assinei a PEC (proposta de emenda à Constituição) tentando transformar o nosso regime em parlamentarista, com uma casa parlamentar fortalecida. O fato de termos o Senado e a Câmara dos Deputados hoje enfraquece a atuação parlamentar porque são duas casas discutindo o mesmo projeto, quando se chega a um acordo no Senado, volta para a Câmara, que modifica o texto e encaminha de novo para os senadores. A tramitação é muito lenta e o trabalho parlamentar não aparece. Vi projetos que levaram 12 anos para serem aprovados, isso é inconcebível. Acho que o parlamentarismo faria que a atuação parlamentar tivesse mais importância, que as questões de interesse público fossem discutidas de forma mais célere.

Terra - Estar longe do Estado foi um dos motivos para a sua desistência? Zambiasi - Estar longe foi um sofrimento muito grande. Eu viajava todas as segundas e retornava todas as sextas. Sobrava muito pouco tempo para o convívio político com a comunidade e com a família. Isso me trouxe muitas dificuldades. Mas como já tinha um tempo pré-determinado de mandato, trabalhei e me dediquei de corpo e alma nesse trabalho. Participei de todos os grandes movimentos, as reivindicações do Estado.

Terra - O senhor pretende concorrer novamente a um cargo público. Zambiasi - A gente não pode dizer que nunca mais vai retornar à política, mas tenho um contrato de trabalho com o Grupo RBS até 2016. É um trabalho que gosto, esse contato diário no rádio com as pessoas me dá uma satisfação muito grande. Inicio às 6h da manhã e vou dia adentro fazendo esse trabalho, a minha qualidade de vida melhorou muito. Já estou com 63 anos e estou gostando muito da vida que levo, mas não descarto no futuro participar novamente.

Terra - O senhor continua filiado ao PTB? Zambiasi - Sim, continuo filiado, mas não tenho militância, não tenho nenhuma atividade política.

Terra - Mas o senhor pretende ajudar os candidatos do seu partido nas eleições deste ano? Zambiasi - Vou ajudar apenas com o meu voto. Não tenho tempo para fazer campanha e nem posso confundir a minha atividade profissional com a política.

Terra - O senhor se decepcionou com a política? Zambiasi - Acreditava muito e lutei pela instalação do parlamentarismo, que acho que é uma proposta que daria uma valorização maior à atividade política. Não conseguir levar adiante essa proposta foi uma frustração. Essa demora na análise de projetos importantes, de interesse nacional, parando em eventuais interesses de um grupo, me frustrou muito também. No Senado, fui autor do projeto que torna o horário da Voz do Brasil flexível, sou radialista, sei o impacto que a obrigatoriedade desse horário provoca na atividade profissional e junto ao ouvinte. Sempre cito como exemplo o acidente com o avião da TAM, que completou cinco anos, que aconteceu poucos momentos antes do início do programa e que, devido a essa programação, as rádios ficaram impedidas durante uma hora de noticiar o acidente. Enquanto o silêncio tomava conta de todas as emissoras de rádios do Brasil, uma tragédia acontecia em São Paulo. Durante todo o meu período como senador, tentei convencer os colegas da importância desta flexibilização no horário do programa, mas não consegui avançar por causa do interesse de alguns parlamentares. Estamos em 2012 e essa questão não foi aprovada ainda.

Terra - O senhor acredita então que os interesses de alguns grupos se sobrepõem? Zambiasi - Sim, com certeza. Enquanto não houver o financiamento publico de campanha nós vamos ver muitos setores financiando candidatos e cobrando resultados. A única forma de evitar que alguns segmentos se sobreponham aos outros é quando o financiamento das campanhas for feito com recursos públicos. Hoje as campanhas são muito caras e os candidatos são patrocinados por setores, que depois cobram recompensas. Outra coisa que também acho importante é ter uma renovação maior nas bancadas.

Terra - O senhor é contra a reeleição ilimitada na Câmara e no Senado? Zambiasi - Acho que se nós temos reeleição limitada para cargos do Executivo, porque não ampliar para vereadores, deputados e senadores também. A renovação é muito importante para se ter ideias novas.

Terra - Por que o senhor acha que a reforma política não avança? Zambiasi - Sou da opinião de se ter uma nova Constituinte exclusiva para discutir esses temas que o Congresso não consegue avançar justamente por causa dos interesses de alguns setores.

Terra - Como é a sua rotina após largar a política? Zambiasi - Chego na rádio às 5h20 e fico no ar até as 11h30, mas se o meu colega, o Gugu, não me tira do ar vou ficando porque gosto muito disso. Depois atendo todas as pessoas que vão até a rádio falar comigo, uma por uma. ?