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"Não se pode esperar que um bandido colabore", diz relator da CPI

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O  relator da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) mista do Cachoeira, deputado Odair Cunha (PT-MG), disse nesta terça-feira, após a sessão de depoimento em que o bicheiro permaneceu em silêncio, que era esperado que ele não respondesse às perguntas dos parlamentares. "Não se pode esperar que um chefe de quadrilha, um bandido, bem informado, bem orientado pelos seus advogados, colabore", disse o deputado.

A sessão foi encerrada após 2 horas e 30 minutos. Durante o depoimento, o contraventor afirmou que não responderia às perguntas dos membros da comissão, conforme orientação de sua defesa, mesmo em uma sessão secreta. "Por orientação dos meus advogados, eu só falo depois da audiência (na Justiça). Não tenho o que falar".

Ainda assim, alguns parlamentares fizeram questionamentos a Cachoeira. O relator da CPI afirmou que não fez as perguntas que queria para não dar munição ao contraventor, que disse que não falaria nada antes de sua audiência na Justiça, no processo em que é acusado de chefiar o jogo ilegal em Goiás. Cachoeira afirmou que, após a sessão com o juiz, poderá ir ao Congresso e responder quaisquer perguntas. "Eu tenho muito a dizer depois da minha audiência", revelou.

O deputado Odair Cunha disse esperar que o bicheiro retorne à CPI para contribuir com as investigações. "Ele pode vir num segundo momento nessa CPI e colaborar", afirmou. Ainda segundo o relator, o foco da comissão, agora, será nas pessoas corrompidas pelo esquema montado por Cachoeira. "Quem tem prerrogativa de foro é alvo da nossa comissão", disse Cunha, referindo-se aos requerimentos de convocação dos governadores de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), do Distrito Federal, Agnelo Queiroz (PT) e do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral (PMDB). Os políticos são citados em escutas da Polícia Federal envolvendo Cachoeira, segundo delegados da PF que prestarem depoimentos à comissão.

Cunha propôs aos integrantes da CPI que, após a sessão de hoje, a comissão vote nova convocação de Cachoeira. O advogado do réu, Márcio Thomaz Bastos, porém, não confirmou que Cachoeira poderá responder a perguntas em uma nova convocação. "Isso é um assunto para depois. Veremos", desconversou.

O presidente da CPI, senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), encerrou a sessão desta terça-feira após o requerimento da senadora Kátia Abreu (PSD-GO), que pedia o fim do depoimento, ter sido aprovado pelos integrantes da comissão. Segundo a senadora, a sessão estava se tornando "ridícula". "Se estamos perguntando para uma múmia, o que as pessoas em casa vão pensar de nós?", afirmou, acrescentando que todos faziam "papel de bobo para um chefe de quadrilha com cara cínica".

Durante a sessão, Cachoeira aparentava cansaço. Vestindo terno escuro e gravata em tom roxo, pouco se parecia com a imagem em fotos veiculadas nos últimos três meses. A mulher dele, Andressa Mendonça, estava sentada ao lado, e junto deles, seguranças.

Carlinhos Cachoeira 

Acusado de comandar a exploração do jogo ilegal em Goiás, Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, foi preso na Operação Monte Carlo, da Polícia Federal, em 29 de fevereiro de 2012, oito anos após a divulgação de um vídeo em que Waldomiro Diniz, assessor do então ministro da Casa Civil, José Dirceu, lhe pedia propina. O escândalo culminou na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Bingos e na revelação do suposto esquema de pagamento de parlamentares que ficou conhecido como mensalão.

Escutas telefônicas realizadas durante a investigação da PF apontaram contatos entre Cachoeira e o senador democrata Demóstenes Torres (GO). Ele reagiu dizendo que a violação do seu sigilo telefônico não havia obedecido a critérios legais.

Nos dias seguintes, reportagens dos jornais Folha de S.Paulo e O Globo afirmaram, respectivamente, que o grupo de Cachoeira forneceu telefones antigrampos para políticos, entre eles Demóstenes, e que o senador pediu ao empresário que lhe emprestasse R$ 3 mil em despesas com táxi-aéreo. Na conversa, o democrata ainda vazou informações sobre reuniões reservadas que manteve com representantes dos três Poderes.

Pressionado, Demóstenes pediu afastamento da liderança do DEM no Senado em 27 de março. No dia seguinte, o Psol representou contra o parlamentar no Conselho de Ética e, um dia depois, em 29 de março, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski autorizou a quebra de seu sigilo bancário.

O presidente do DEM, senador José Agripino Maia (RN), anunciou em 2 de abril que o partido havia decidido abrir um processo que poderia resultar na expulsão de Demóstenes, que, no dia seguinte, pediu a desfiliação da legenda, encerrando a investigação interna. Mas as denúncias só aumentaram e começaram a atingir outros políticos, agentes públicos e empresas.

Após a publicação de suspeitas de que a construtora Delta, maior recebedora de recursos do governo federal nos últimos três anos, faça parte do esquema de Cachoeira, a empresa anunciou a demissão de um funcionário e uma auditoria. O vazamento das conversas apontam encontros de Cachoeira também com os governadores Agnelo Queiroz (PT), do Distrito Federal, e Marconi Perillo (PSDB), de Goiás. Em 19 de abril, o Congresso criou a CPI mista do Cachoeira.