ASSINE
search button

Jobim nega que governo já tenha optado por caça francês

Compartilhar

Vasconcelo Quadros, Jornal do Brasil

BRASÍLIA - O Senado decidiu convocar o ministro da Defesa, Nelson Jobim, para que ele confirme ou não se governo já optou mesmo pela empresa francesa Dassault na compra de 36 caças Rafale, um dos maiores negócios da história da aviação brasileira, estimado em cerca de R$ 11 bilhões, cuja disputa envolve também duas outras gigantes do setor, a americana Boeing e a sueca Saab. O aceno do presidente Luiz Inácio Lula da Silva aos franceses, em setembro do ano passado, vem alimentando uma crise nos bastidores do projeto FX-2, com crescente insatisfação na Aeronáutica, e a preocupação de parlamentares que terão de dar aval ao pedido de aprovação de recursos que o governo deverá enviar ao Congresso.

O correto é o presidente Lula seguir o parecer da Aeronáutica. Ele já fez tanto gesto de aproximação com o Sarkozy (Nicolas Sarkozy, presidente da França), comprando submarinos, helicóptero e outros caças, que essa decisão não afetaria as relações estratégicas com a França analisa o deputado Raul Jungmann (PPS-PE), presidente da Frente Parlamentar de Defesa.

A nota técnica da Força Aérea Brasileira, emitida no início de janeiro, coloca em primeiro lugar na concorrência o Gripen NG, da Saab, e em segundo o F-18 Super Hornet, da Boeing. Em desempenho técnico, o Rafale aparece em último lugar, mas o governo já deu sinais de que pode ter se decidido pela Dassault como mais um passo para reforçar a parceria com a França.

É natural que o presidente tome uma decisão política e ela será acatada pela Aeronáutica, mesmo que seja equivocada. Vai se comprar o Rafale e mais tarde as críticas, que hoje estão submersas, nos bastidores, vão emergir alerta o coronel reformado Geraldo Cavagnari, especialista em estratégia de segurança. Cavagnari acha que se as críticas sobre o fraco desempenho do Rafale em regiões de conflitos (o caça seria mais facilmente abatido que outras aeronaves) tiverem fundamento, a decisão do governo é perigosa, o que justificaria, segundo ele, a luta de foice que vem sendo travada entre os comandantes das Forças Armadas e o ministro Nelson Jobim para que o governo opte pelas recomendações técnicas da FAB.

Ainda que a Dassault tenha barateado, o preço está 30% a 40% mais caro que as concorrentes. O governo deve respeitar também o parecer técnico. O ministro terá de nos dar essas explicações porque é o Congresso quem aprova os recursos que serão investidos avisa o senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG), presidente da Comissão de Relações Exteriores do Senado.

O ministro Nelson Jobim negou quinta-feira que o presidente Lula já tenha batido o martelo a favor da empresa francesa e afirmou que a compra ainda não está definida.

O processo ainda está no âmbito do Ministério da Defesa. A notícia não tem fundamento disse, em resposta a reportagem do jornal Folha de S. Paulo sustentando que a redução do preço teria levado o presidente Lula a se definir pela oferta da empresa francesa. A FAB também soltou nota informando que não foi comunicada sobre qualquer decisão. A decisão, segundo o governo, sairá logo depois do Carnaval.

Os embates entre Lula e as Forças Armadas

Luciana Abade

O mal estar gerado com o pedido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para que a Aeronáutica refizesse o relatório sobre os caças a serem adquiridos pelo Brasil sem classificar as aeronaves não é o primeiro desconforto público entre o presidente e a Aeronáutica. Em 2007, Lula interferiu na prisão de 18 controladores de voo que fizeram greve de trabalho e fome paralisando parte dos aeroportos brasileiros. A prisão dos controladores, por motim, foi determinada pelo comandante da Aeronáutica, o brigadeiro Juniti Saito, mas Lula mandou suspender a ordem e descartou retaliações.

A interferência presidencial gerou revolta nas Forças Armadas. Na época, o Clube da Aeronáutica ameaçou entrar no Supremo Tribunal Federal (STF) com uma ação alegando inconstitucionalidade e crime de responsabilidade. As ações, no entanto, não foram iniciadas porque Lula recuou temendo que as insurgências se espalhassem por outros setores das Forças Armadas. Com o recuo, o comando do controle aéreo voltou para a Aeronáutica. O comandante Saito, que havia levantado a hipótese de se demitir, desistiu de deixar o cargo e ouviu do presidente a promessa de que as forças seriam reaparelhadas.

Na opinião do coronel reformado Geraldo Cavagnari, especialista em estratégia de Defesa, a interferência de Lula foi um grande erro:

O presidente lidou com a questão como se estivesse no ABC e não se pode tratar uma questão militar com uma saída sindical. Isto não existe em lugar nenhum do mundo. Os militares não podem ter sindicatos, não podem fazer greve. Militares sem disciplina e unidade são um perigo para o governo.

Cavagnari acredita que a atitude de Lula se deu por inexperiência para lidar com questões tão peculiares como as militares. Para ele, o governo errou novamente, no final do ano passado, quando aprovou a criação da comissão da verdade com o objetivo de investigar e punir militares que praticaram tortura na ditadura.

Foi um tiro no pé dispara o coronel.

A aprovação da comissão fez o comandante Saito, ao lado dos comandantes do Exército e Marinha, ameaçar pedir demissão do cargo mais uma vez.

Apesar das críticas, Cavagnari afirma que o presidente tem uma boa relação com as Forças Armadas proporcionada, em parte, pela saída do ex-ministro da Defesa, Waldir Pires, que estava à frente da pasta durante o caos aéreo. O coronel acredita ainda que os problemas são pontuais e, de maneira geral, são bem solucionados. A boa relação , contudo, pode estar com os dias contados. Lula, até agora, recuou em todas as crises que viveu com os militares, mas a preferência pelo caça francês parece irredutível.

Embaixador dos EUA ainda acredita na Boeing

O novo embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Thomas Shannon, demonstrou esperança quinta-feira de que a empresa americana Boeing ainda esteja no páreo para vender 36 aviões caças à Força Aérea Brasileira, apesar de todo o favoritismo da francesa Dassault. Segundo Shannon, os ministros Celso Amorim (Relações Exteriores) e Nelson Jobim (Defesa) negaram quinta-feira para ele que o governo brasileiro já tenha concluído o processo de escolha das aeronaves.

Ao receber as credenciais de embaixador das mãos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para assumir a embaixada dos EUA no Brasil, Shannon aproveitou para defender a escolha do caça da Boeing. Segundo o embaixador, a aeronave americana F-18 Super Hornet tem qualidades que não devem ser ignoradas pelo governo brasileiro.

O avião da Boeing é um produto bom e merece a atenção do governo brasileiro afirmou o novo embaixador, antes de destacar que as supostas preocupação das autoridades brasileiras em relação a restrições, por parte dos americanos, à transferência de tecnologia, não se justificam. Em termos de transferência de tecnologia, o governo dos Estados Unidos tomou uma decisão sem precedentes e isso mostra a confiança no Brasil. Estamos dispostos a tomar passos com o Brasil que no passado não poderíamos fazer.

O embaixador ressaltou, contudo, que a briga comercial pelas venda dos caças não vai influenciar a relação do governo dos EUA com o Brasil, ou mesmo com a França e a Suécia, países de origem das empresas que disputam a venda.

É importante lembrar que França e Suécia são amigos e aliados. Esta é uma concorrência comercial que não vai afetar a relação entre os países avisou o novo embaixador, lembrando, porém, que as negociações diplomáticas exigem franqueza de seus interlocutores. Franqueza é algo bom na diplomacia e os dois países podem trabalhar para melhorar a franqueza. O Super Hornet é um grande caça.