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Cortar o mal pela raiz

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Decisões judiciais publicadas na semana passada, destinadas a preservar o interesse dos cofres públicos, determinaram, no estado do Rio de Janeiro, o bloqueio de depósitos bancários em nome de conhecidos agentes políticos, numa lista milionária encabeçada pelos dois últimos governadores. No total, para guarda imediata, impedido o acesso dos titulares, nada menos de R$ 158 milhões, fruto de popinas e recompensas por gentilezas conferidas a prestadores de serviços e vencedores de licitações suspeitíssimas. Nada capaz de ilustrar melhor a tragédia moral que se abateu sobre o serviço público fluminense, onde a eleição de bons governadores nunca foi um dos hábitos mais prendados. Se disso poucos escaparam, resta a esperança de que o doutor Witzel também constitua exceção e presida uma nova era de probidade no trato da coisa pública.

Essa onda de corrupção palaciana ocorreu em várias capitais e grandes cidades, sem, contudo, atingir a dimensão avassaladora a que se assistiu no Rio, onde Cabral, Pezão e acólitos deram tom bem mais alto na relação espúria que nos últimos tempos se estabeleceu entre autoridades constituídas e empresas chamadas a realizar obras e serviços. Sem escapar o detalhe recentemente revelado no Caso Pezão: a propina deixou de ser uma oferta única, pagamento à vista, e passou a se comparar a salário mensal, com dia fixo para os acertos. Claro que os governadores excederam em gulodice, mas têm ao lado, à frente ou atrás muitos servidores e comissionados que foram corrompidos, embora com certa moderação. O que não deixa de ser crime, mesmo em dimensão mais modesta.

A malha criada para fomentar aquelas vantagens, ao mesmo tempo imorais e ilegais, espalhou-se pelos escalões menores e subalternos, instruídos pelo mau exemplo que vinha de cima. Figuram nesse caso as gorjetas que remuneram deslizes de pequena monta, as multas anuladas, os trezentos ou quinhentos reais que apressam ou atrasam processos nos gabinetes das secretarias e da Justiça. Nem escapam da onda de assaltos os caixas de emolumentos, que muitos aproveitam para confundir os resultados, misturando o que legalmente lhes pertence com o que é do estado. Casos como esses, observados no Rio, quando citados, fazem lembrar a conhecida história do sacristão Leixinhas Paiva, do Bom Retiro de Uberaba, quenão era dado a boas contas e misturava seus pequenos dinheiros com os muitos dinheiros da paróquia… Os maus servidores aí pilhados costumam se defender com uma explicação cretina: todos fazem isso, e eu não sou a palmatória do mundo.

Estes registros, repetidas vezes citados, e longe de constituírem espanto, de tal forma vulgarizada a corrupção, têm como finalidade única, nada mais que isso, atentar para o fato de que a reação da sociedade, e aí vai a grave responsabilidade do ministério da Justiça e do Congresso Nacional, não pode se limitar à retirada de circulação dos que se corromperam, nem basta o congelamento de suas poupudas contas bancárias. É preciso que, além de estarem trancafiados, as leis cuidem logo de remover as facilidades com que se acobertaram nos repetidos assaltos, à sombra da impunidade. Para que outros não se aventurem.

O que significa, em derradeira análise, que a população deve ser defendida antes de o crime acontecer. À prisão dos malfeitores do serviço público devem seguir leis e dispositivos da organização administrativa, que sejam capazes de inibir esses chamados assaltantes de colarinho branco. Não é bastante que lhes sejam bloqueados muitos milhões, como se deu na semana passada. É preciso impedir que outros cheguem lá.

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