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Bandidos e terroristas

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Percebe-se que vem se robustecendo a ideia de setores governamentais expressivos de promover a violência urbana ao nível de terrorismo organizado, para que, a partir dessa realidade, apliquem-se reações mais severas. O novo governador fluminense, Wilson Witzel, entre outros que lograram êxito na urnas, usou a campanha eleitoral para pregar que a sociedade tem o direito de usar, em sua defesa, os mesmos instrumentos que criminosos empregam para o mal, e está inclinado a admitir o alinhamento, sem diferenciar bandido de terrorista; até porque, seria fácil conferir, os danos que ambos provocam equivalem-se na agressão à sociedade, no seu conjunto, ou contra as individualidades. Os fatos mais recentes que atormentam o Ceará contribuem para alimentar os que advogam a comparação: centena e meia de atentados sincronizados e disseminados pelo interior do estado, resultando em prejuízos materiais que ainda não têm como ser avaliados. Mas são imensos.

Observou-se, no fim de semana, que a onda de violência no Norte, persistente, apesar do deslocamento dos chefes das gangues mais perigosas, animou o presidente Bolsonaro a reeditar seu ponto de vista sobre o endurecimento do jogo contra o crime, sem condescendências, o que não fica muito distante da proposta de promove o crime urbano, descontrolado e violento, à categoria do terror organizado. Uma prova de sua intolerância com o terrorismo foi acolher do antecessor o processo de extradição do italiano Cesare Batisti, preso ontem na Bolívia, depois de longa permanência, em paz, no Brasil, com a salvaguarda dos governos petistas. Uma demonstração interna e externa do rigor pretendido.

É de se supor que, os fatos caminhando assim, em breve poderá entrar em discussão a adoção de leis mais rigorosas, porque as atuais se revelariam frágeis para lidar com essa nova concepção de violência praticada contra as populações, principalmente as que residem nas metrópoles e grandes cidades. O presidente não hesita em insinuar mão pesada, mesmo sabendo que, por consequência da aplicação de instrumentos mais severos, caberá ao governo rever pontos essenciais de sua estrutura, como a rede penitenciária, já hoje gravemente insuficiente; é de se imaginar o quanto mais dela será cobrado, com a chegada de novas quadrilhas de alta periculosidade, que tem poder de comandar o crime, mesmo encarceradas. A prova disso é a interminável sucessão de horrores no Ceará.

Outro aspecto da transformação do crime urbano à faixa do terrorismo, para tanto devendo estar atentos juristas e o Congresso Nacional, é o cuidado para que as coisas fiquem bem definidas nas diferenciações. Conhecem-se casos em países que permitiram que se confundissem as leis, e, não raro, acabaram servindo a propósitos políticos, sem que disso nem o Brasil escapou. Temos gente ainda viva para lembrar: a denúncia ou a simples suspeita de atos terroristas praticados ou em vias de serem praticados servia para encobrir interesses políticos ou retaliações pessoais. As leis, quando muito pesadas, exigem especiais cuidados, para que se evitem precipitações e injustiça.

Nos anos 60, que o atual presidente considera não terem sido tão sombrios como se apregoa, muitos agentes da ditadura revestiram-se de poderes para eliminar terroristas e “terroristas”. Alguns realmente assim definidos, por causa de planos radicais para a tomada do poder, mas muitos foram injustamente tratados, e por isso perderam a vida. Demais, é sabido que terror não se resolve com mais terror.

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editorial | jb