Nos dias que correm, o processo ideológico se transforma em denúncia sistemática contra adversários no campo da competição política.
Uma estrutura intransponível da ação que distorce a realidade, numa permanente busca de legitimação de um sistema de poder. Hannah Arendt nos lembra que a função narrativa diz do "quem da ação". Daí que a narrativa se torna o instrumento privilegiado desta operação.
Numa sociedade organizada em rede, a relação entre cidadãos e corpo político sofre concorrência da infinidade de conexões estabelecidas fora de seu alcance. Em decorrência desta realidade, a crise da concepção espacial do poder repercute na tomada de decisões.
Cercado de especialistas do contexto, hoje o político gerencia situações. O debate, restringindo-se a situações, perde substância. Desagregação do tempo, simplificação das percepções: maneira de organizar o debate que leva a oposições simplistas - na crise do coronavírus.
A informação permanece como a base do poder, mas sua natureza muda: ela não se acumula mais, o seu valor é todo o do intercâmbio. A informação serve primariamente para adquirir mais informações, observadas transparência, circulação e clareza na definição de tarefas.
A esfera política se deixa dominar tão pouco quanto o clima. É preciso tratar da organização da sociedade com modéstia e prudência. Mundo complexo, que avança a pequenos passos medidos, por ajustamentos sucessivos, enfrenta hoje a realidade imprevisível da pandemia.
Quanto menos a sociedade é uma sociedade de comando, mais a identidade é necessária: o cidadão consciente de pertencer ao mesmo ambiente.
Engenheiro, é autor de "Por Inteiro" (Editora Multifoco, 2019)