"Em Dostoiévski, deparamos nossos próprios pensamentos ocultos, que não confessaríamos nem a nós mesmos", disse Merejkovski. Consciência que tinha a ver com a epilepsia, agravada no processo por conspiração política movido arbitrariamente contra ele em 1849.
Para o genial escritor, determinadas conquistas da alma e do conhecimento não podem existir sem a a presença da doença. Dificilmente haverá afirmação mais inconsequente do que "a doença só pode gerar coisas doentias", nesse tempo de um novo coronavírus.
A realidade trazida pela nova doença expõe a crise da demarcação nítida entre o objeto - o ser vivo, aqui o vírus - e o meio ambiente.
A atenção nos conecta com o mundo, melhor vacina contra ideologias. Faltando, tudo tende ser artificioso: palavras já não dizem das coisas.
Numa conversação, não se deve tratar, apenas nem principalmente, de argumentar e de convencer para chegar a determinados acordos.
Para compreender o que realmente diz o interlocutor, é necessário uma sensibilidade e uma abertura que não acontecem automaticamente.
A complicação é uma característica bastante notória do atual momento político, é como um desnecessário adicional de complexidade.
E, sobretudo, é preocupante como um processo incapacitante de compreensão, já que, depois da complicação, vem imediatamente a confusão.
Confusão sistemática em ações empreendidas nas diferentes esferas de governo - federal, estadual e municipal -, na esteira da disputa política.
Temos de aprender a pensar a ordem e a desordem ao mesmo tempo. Hoje a ordem, como a desordem, está ligada à ideia das interações.
Engenheiro, é autor de "Por Inteiro" (Editora Multifoco, 2019)