A questão do tempo sempre foi uma incógnita para a maioria dos seres humanos. Todos queremos administrar o tempo, mas como administrar o que não temos? Filosoficamente estudamos a respeito do tempo e até podemos considerar que temos tempo, mas na prática existencialmente não o temos, se temos, não sabemos. Como disse Santo Agostinho, o passado já deixou de existir no instante seguinte e o futuro ainda não existe. Como gerir o que não temos controle?
Ao longo de gerações, como uma tentativa de gerir o tempo, vários métodos foram utilizados. Começamos com bilhetes e listas, com o intuito de organizar o tempo para as tarefas demandadas. Evoluímos para calendários e agendas, com a intenção de controlarmos e nos prevenirmos para o futuro, refletindo um olhar para frente, e chegamos então na gestão do tempo com a ótica da administração do tempo atual, definido por prioridades e metas, incluindo conceitos como planejamento diário e planos específicos.
Apesar de todas essas contribuições serem significativas, as pessoas começaram a perceber que o controle do tempo é com frequência improdutivo, uma vez que a satisfação das necessidades humanas, o desenvolvimento de relações enriquecedoras e o desfrute de momentos espontâneos diariamente, são muito mais produtivos. Nasce um novo conceito!
Em tempos de quarentena, o que faremos para tornar o nosso tempo mais produtivo? Como gerenciar conflitos de interesse, compromissos financeiros, reclusão?
Se olharmos historicamente as crises de 29 e 2008 algumas lições podemos tirar.
Em 1920 os EUA viveram o que os historiadores chamaram de “American way of life” ou modo de vida americano. Devido aos grandes investimentos bem-sucedidos realizados em títulos na bolsa, a economia vivia o que podemos chamar um tempo de oceano azul, era um mar infinito de possibilidades caracterizados pelo consumo exagerado e altos lucros.
Em 1929, com a quebra da bolsa de Nova York, a economia que girava em sua grande maioria em torno da especulação colapsou e o capitalismo da época, até então triunfalista, entra em decomposição. O principal fator que levou a esse colapso foi o aumento desenfreado da produção das indústrias que com a euforia econômica produziram muito além do que o mercado podia consumir. Com o excesso de produtos e a falta de mercado para a compra as indústrias começaram a falir.
Após a crise de 29, o governo de Franklin Roosevelt arregaçou as mangas: ampliou obras públicas, criou empresas estatais, restabeleceu indústrias que produziram estradas, canais, escolas e fez a economia voltar a girar promovendo emprego e dinheiro para o mercado.
Em 2008 os EUA passaram pelo que alguns analistas consideraram a maior crise econômica registrada desde a Grande Depressão em 29. O crédito fácil e a propagação de um investimento de pouca qualidade e consequentemente alto risco ao redor do mundo foram as raízes da crise naquela ocasião. Neste contexto surge um candidato às eleições presidenciais com um discurso simples. “ We can” (nós podemos), dizia Obama em sua campanha. Os americanos acreditaram nisso e o primeiro presidente negro norte-americano foi eleito. Particularmente acredito que o Obama fez história, principalmente no sistema de saúde, com a implantação do Obama Care. No entanto, muito para além do que ele fez ou poderia fazer está a força advinda das pessoas quando elas acreditam. Os americanos acreditaram no discurso do candidato à presidência, mesmo que ele não tenha apresentado provas substanciais de que conseguiria cumpri-lo.
Em 2008, linhas financeiras nacionais e internacionais, aliadas a forte esperança e expectativa positiva dos americanos, acabaram com a crise de crédito.
Esses 2 exemplos nos mostram que não sucumbir ao medo, aliado a decisões estratégicas eficazes, impulsionam a economia para a rota da aceleração novamente.
Atualmente no Brasil, temos um cenário em que a bolsa sobe timidamente após sucessivas quedas, um dólar que atingiu valor superior a R$ 5,00, empresas áreas trabalhando com menos de 50% da capacidade produtiva, vendas do varejo despencando, projeções do crescimento do PIB sendo atualizadas com valores cada vez menores, etc.
Para fazer frente à crise o ministro da economia anunciou um pacote de medidas que injetará recursos financeiros e o Congresso prometeu priorizar tempo e energia para aprovar os projetos do governo ligados ao enfrentamento da crise na saúde e os efeitos do coronavírus, respeitando a recomendação de evitar aglomerações.
Nós brasileiros temos algumas alternativas, a mais ineficiente seria “caçar bruxas” e nos render ao pessimismo e à desesperança, enquanto que a mais eficiente face as circunstâncias impostas será primeiramente acreditar, tomar medidas proativas e criar oportunidades em meio à crise. Pode parecer um chavão, mais se nos lembrarmos do princípio de Pareto, 80% dos resultados se originam de 20% das atividades. Precisamos estar atentos ao que é mais importante.
Em tempos de desaceleração podemos ser mais criativos, podemos redesenhar, reinventar, reorganizar, redescobrir, ter insights que na correria muitas vezes não temos.
Haverá sempre novas oportunidades, citando como exemplo a indústria nacional de brinquedos que por décadas teve a sua capacidade de produção drasticamente reduzida com avalanche da importação de brinquedos vindos da China desde meados dos anos 90, com a crise causada pelo coronavírus terá uma oportunidade de abraçar novamente uma grande fatia do mercado com o feriado de Dia das Crianças, uma vez que a China teve expressiva retração da produção industrial, o que muito provavelmente afetará a exportação de brinquedos.
Como disse o sábio rei Salomão, “[...]há tempo para todo propósito debaixo do céu”. Que possamos discernir os tempos e agir sabiamente diante dos desafios e oportunidades.
Cristiana Aguiar é economista, MBA em Gestão Empresarial pela FGV, especialização em Gestão de Pessoas e Equipes pela PUC – RJ, conselheira do Conselho Empresarial de Governança e Compliance da Associação Comercial do Rio de Janeiro – ACRJ e autora de diversos artigos publicados.