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Os perigos de uma reforma necessária

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Do debate sobre os projetos da reforma tributária gerou-se aparente consenso. A despeito da existência de mais de uma proposta na Câmara dos Deputados e no Senado, as opiniões têm convergido para a necessidade de simplificar o sistema, reunindo diversos tributos em um Imposto sobre Valor Agregado (IVA). A ideia é bastante sedutora porque, em sua simplicidade, contrasta com o custoso e burocrático emaranhado tributário atual. Entretanto, tal como é apresentado hoje, amarrado à proposta de uma alíquota única, o IVA criará uma armadilha tributária que porá em risco a sobrevivência de muitas empresas em setores econômicos essenciais como serviços de saúde e educação.

As propostas de IVA com alíquota única prevêm um mecanismo de compensação de impostos, para evitar que haja tributação sobre tributação. Assim, impostos embutidos nos custos dos insumos (ou seja, impostos que já foram pagos pelos fornecedores ao longo da cadeia) poderiam ser descontados na forma de créditos quando da venda do produto acabado. No caso da indústria e em setores de cadeia longa, onde os insumos têm papel preponderante no custo, o mecanismo é adequado e funciona bem. Esse não é o caso das empresas de serviços. Estas têm, como elemento principal dos seus produtos, o trabalho das pessoas e os gastos com esse item não geram crédito tributário a ser abatido. Para que se tenha uma ideia, nos estabelecimentos de saúde mais de 40% dos custos advêm de gastos com a folha de pagamentos. Em suma, setores de serviços, ao serem submetidos à alíquota única, terão sua carga tributária radicalmente aumentada em comparação com os demais setores. Segundo estudo realizado pela consultoria da Câmara dos Deputados, a carga tributária sobre o setor de serviços poderá mais que dobrar.

Um aumento de carga dessa magnitude agravaria a crise que afeta o setor hospitalar privado. De fato, existem grandes players do setor investindo na expansão e na criação de empregos, mas essa não é a realidade para a grande maioria das empresas. Ao contrário, o que se tem assistido na saúde é a uma situação de crescente dificuldade que provocou o fechamento, entre 2010 e 2018, de mais de 2.127 hospitais privados. Com eles se foram mais de 34 mil leitos, metade dos quais serviam ao SUS.

Em vista do que se pretende obter com a reforma – o desenvolvimento do país – seria um contrassenso punir setores como educação e saúde que são essenciais para o aumento do capital humano e da produtividade. É imprescindível, portanto, que o Congresso Nacional faça as necessárias correções de rota. Em especial, que se estabeleçam alíquotas diferenciadas para o IVA, de forma a assegurar a equanimidade na distribuição da carga tributária entre os vários setores econômicos e a evitar que a saúde e a educação sejam vítimas de um desastre tributário.

* Secretário-Executivo da Confederação Nacional de Saúde (CNSaúde)