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A Solução para o setor energético

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Se privatizar, vender ou por qualquer forma desinchar, reduzir o estado é uma bandeira tanto do governo federal quanto do governo mineiro que se instalarão em janeiro de 2019. O mais importante é observar questões econômicas e jurídicas para que se valorize bem o ativo antes da venda, em alguns casos pela não aplicação da legislação ou pela má gestão da coisa pública. No setor elétrico dois pontos podem ser observados para reflexão do leitor. O primeiro deles impacta tanto em nível federal (Eletrobras) quanto no estado de Minas Gerais (CEMIG), é a aplicação da correção monetária para os ativos.

A correção monetária enquanto instrumento para evitar a corrosão da inflação nos direitos foi criada em 1964. Mesmo com a correção monetária reconhecida como um critério de justiça, os sucessivos governos por vezes manipularam os índices oficiais de correção monetária em comparação com a inflação real. Essa distorção permaneceu até 1991, quando foi editada a Lei nº 8.200, a qual reconheceu a correção monetária para as empresas. Todas as empresas do Brasil seguiram as regras da lei e corrigiram seus balanços. Para o setor privado, a diferença é somente o registro contábil real dos ativos imobilizados e patrimônio líquido. Para o setor elétrico é questão de sobrevivência porque as tarifas são compostas de custos operacionais + remuneração + depreciação, sendo que os dois últimos componentes dependem do valor do ativo imobilizado registrado. Se o valor foi registrado muito abaixo do valor real, por correção monetária abaixo da real inflação, seus componentes na tarifa foram calculados muito abaixo do real valor, podendo assim destruir ou descapitalizar seriamente a empresa. Todavia o próprio governo proibiu que as empresas do setor elétrico corrigissem seus balanços. E por que fez isso? Simples. Quando uma empresa num trecho de determinado rio constrói uma usina hidrelétrica, ela o faz protegida por um contrato de concessão, visto que o direito de exploração da hidroeletricidade é do Governo Federal. Neste contrato de concessão a empresa tem assegurado que tão logo comece a produzir energia, a tarifa por ela cobrada será o suficiente para remunerar todos os custos operacionais, de construção e mais o seu lucro, que é contratualmente conhecido. Tudo isso dividido pelo tempo de concessão, que normalmente é de 30 anos, podendo ser renovado por igual período.

Todos os investimentos para construir uma usina hidrelétrica são remunerados pela tarifa de energia elétrica. Assim a correção desse empreendimento reconhecido pela lei de 1991, ou pressionaria as tarifas para que elas subissem, pela simples questão que o pagamento do investimento mais a remuneração são os valores totais divididos pelo tempo (e uma vez corrigidos aumentaria o valor a ser dividido), ou para que não houvesse o aumento de tarifa, deveria-se aumentar o tempo da concessão, diluindo esse reembolso do investimento. Temos então a primeira premissa: todas as empresas do Brasil tiveram seus ativos corrigidos menos o setor elétrico. Apenas para que o leitor tenha uma noção de valores, as quatro usinas da CEMIG que foram tomadas e revendidas em 2017 pelo governo federal como consequência da política governamental Dilma/Temer foram avaliadas em 12 bilhões de reais, e foram vendidas em leilão por 13 bilhões de reais com tarifas 70% fixas no mercado cativo e 30% no mercado livre, avaliadas pelas receitas futuras descontadas a taxa de juros reais de IPCA + 9,00 % a.a.. Entretanto, se a correção monetária tivesse sido aplicada, ela valeria 18 bilhões, considerando somente o valor não amortizado, fora as remunerações não realizadas ao longo do período de concessão de 1975 a 2015 e não os 12 bilhões acima. Essa diferença equivale a investimentos não recuperados e não remunerados pela CEMIG, perda de valor não recuperado pela CEMIG. Há ainda 7 bilhões de reais que a empresa de energia elétrica de Minas Gerais tem a recuperar em relação às usinas restantes. Significa dizer que ela vale 7 bilhões a menos pelo simples fato de não ter sido aplicada a própria legislação federal para o setor elétrico, e que já foram reconhecidas nos processos de empréstimo compulsório em jurisprudência pelo STJ, (Temas STJ 68 a 73). As diferenças de avaliação resultam nas visões retrospectivas e prospectivas com utilização percentual (%) de mercado cativo e livre distintos e taxas de desconto reais exageradas para valoração.

No caso da Eletrobrás, que já vem no alvo de privatização do atual governo e que terá seu processo de venda capitaneado por Salim Mattar, já anunciado como Secretário Nacional de Desestatização, o impacto é superior a 300 bilhões. Significa dizer que as usinas do Sistema Eletrobrás valem no mínimo 300 bilhões a mais.

O que deve ser feito é aplicar a lei, valorizar e remunerar os ativos, vender cada coisa pelo que realmente vale transformando uma ação de governo numa política ganha-ganha e corrigindo uma distorção histórica com taxas de descontos bem menores que as aplicadas de IPCA + 9,00% a.a. Neste momento é tudo o que o Brasil precisa e o povo merece, e é possível.

* Advogado especialista em Energia

** Doutor em Economia

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