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Uma importância mais do que histórica

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Na Roma Antiga, enquanto mulheres eram partidárias da nova fé no Cristo, seus maridos permaneciam fiéis aos deuses do passado. Tempo chegou ao desenvolvimento desta afirmação de vida em que homens e mulheres tornaram-se os criadores de uma nova cultura e uma nova sociedade.

Agostinho não impressionava pela aparência; muito ao contrário, era de aspecto insignificante. No entanto, as coisas que esse homem pouco impressionante afirmava marcaram definitivamente a igreja.

Na cristologia de Paulo, Agostinho havia afinal descoberto a resposta à sua procura pela verdade. Confissões não encontram paralelo na importância que assume para ávidos leitores contemporâneos. Seus 13 capítulos foram escritos em 377, em torno de dez anos depois da conversão de Agostinho.

Os primeiros nove capítulos contam a história de sua vida exterior, da luta contra a natureza animal. No décimo capítulo, Agostinho se volta para a vida interior. “Cheguei”, escreveu ele, “aos lugares espaçosos de minha memória, onde estão os tesouros de imagens inumeráveis, além do que pensamos”.

O pensador descreveu a árdua luta que seu espírito travou contra a “inércia do seu coração”. Agostinho determinou-se a tarefa de reexaminar todas as coisas que sua inteligência tinha sido incapaz de aceitar como válidas. “Cidade de Deus” começa com uma discussão da luta pela cidade eterna.

Mas ao tratar disso, esse acontecimento histórico assumiu uma importância mais do que histórica. Na cidade ideal de Deus, coisas que estão ligadas no tempo, no espaço, na matéria, são feitas para tomar seu lugar nos eternos planos divinos. Essa obra serviu para nortear toda a política posterior da igreja.

Fosse o problema do tempo ou da origem da linguagem, o pensamento de Agostinho ultrapassava os limites de seu tempo. Concebeu o fenômeno do tempo como uma forma especial de consciência. O fenômeno do tempo – como estudado por ele – pode ser considerado precursor do moderno relativismo.

Daí que hoje, sistematicamente, corre-se o risco de ser guiado, menos por argumentos ponderados, mais pelo que ressoa no estado de ânimo do momento. O foco imediato é assim martelado na consciência pública por defensores desta prática, cujo status é gerado pela capacidade de dramatizar temas.

O relativismo que seduz tantos contemporâneos desconhece que o conhecimento de si só tem valor se não for baseado apenas em opinião exposta em ambiente de liberdade, mas sobre um conhecimento da pessoa que ultrapassa sua individualidade e leva a meditar sobre a alma e sobre o bem.

Agostinho, que encontrara o seu caminho para a fé cristã ao fim de uma longa jornada espiritual, havia sempre insistido na importância do problema da liberdade de escolha: sensível às mais delicadas mudanças psicológicas, Agostinho estava bem certo do seu valor como de suas limitações.

O ser humano é duplo – por um lado, ser biológico impelido por desejos, paixões e necessidades; por outro, ser social que só pode esperar alcançar uma satisfação pessoal se moderar suas pulsões e respeitar os valores que nele ressoam, dos quais sente não ser o autor, mas que constituem sua individualidade.

Nenhum outro pensador, exceto Platão, exerceu tamanha influência sobre o pensamento ocidental. Sua sabedoria não era apenas produto de deduções abstratas, consistia em verdades descobertas pela experiência, em leis que governavam a alma e o pensamento e que ele havia decifrado na própria vida.

* Engenheiro