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Gargalos da reforma trabalhista

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Uma das principais mudanças apresentadas pela Lei 13.467/2017, conhecida como reforma trabalhista, foi a regulamentação da possibilidade de empregados e empregadores, mediante acordo individual, convenção ou acordo coletivo, estabelecerem a jornada de 12h de trabalho por 36h de descanso, conforme artigo 59-A, da CLT.

Muito embora tal modalidade de trabalho já fosse amplamente utilizada antes da reforma, inclusive com previsão na Súmula nº 444 do TST desde 2012, sua aplicação prática após a entrada em vigor das novidades introduzidas em 13/11/2017, vem gerando dúvidas para muitas empresas, principalmente no que se refere a inclusão do parágrafo único do artigo 59-A, que apresentou sensíveis mudanças em relação ao que se aplicava anteriormente, nos casos em que a jornada é integral ou preponderantemente exercida dentro do horário noturno.

Isso porque, conforme artigo 73 e seu §1º da CLT, o horário noturno urbano é aquele exercido no período entre 22h de um dia às 5h da manhã seguinte. Quando a jornada praticada é a noturna, o empregado tem o direito de receber o adicional noturno de 20% sobre o valor-hora diurna tradicional, além do valor-hora noturna ser contado a cada 52 minutos e 30 segundos de trabalho. Ou seja, os 7 minutos e 30 segundos adicionais devem ser pagos proporcionalmente em regime de hora extra (remunerada com 50% a mais do valor-hora diurna convencional).

Ainda, o parágrafo 5º do artigo 73 prevê que, caso um empregado tenha uma jornada de 12h que comece dentro do horário noturno e se estenda para além das 5h da manhã, esta prorrogação de horas também deverá ser considerada como reduzida (52min e 30seg) e ainda paga com acrescimento de 20%, da mesma forma que as horas trabalhadas dentro do período noturno.

Assim, antes da reforma, tal entendimento era ratificado pela Súmula nº 60, inciso II, e pela Orientação Jurisprudencial (OJ) nº 388 do TST, e aplicado para empregados que exercessem a jornada de 12 x 36 integral ou preponderantemente no período noturno.

Contudo, a inclusão do parágrafo único do artigo 59-A da CLT reviu essa lógica, no sentido de prever que a remuneração mensal pactuada pela jornada 12 x 36 já abrange a prorrogação do trabalho noturno, quando houver, não se aplicando assim a esses casos a previsão do parágrafo 5º do artigo 73 da CLT.

Ou seja, mencionada previsão trouxe a ideia de que o empregado em regime 12 x 36 não faria mais jus ao recebimento dos 20% de adicional para as horas trabalhadas além das 5h da manhã, que também não mais seriam consideradas como reduzidas (52min e 30seg do valor-hora diurna).

Como exemplo, antes da reforma, se um empregado trabalhasse de 22h até 10h, este teria as últimas 5h de sua jornada consideradas como reduzidas e acrescidas de 20%, assim como as demais. Dentro da nova lógica do mencionado artigo, isso não mais ocorreria a partir das 5h da manhã para o empregado, posto que essa compensação já seria considerada como parte do seu salário.

Nesse cenário, embora os Tribunais do Trabalho reproduzam bastante o entendimento pretérito acerca do assunto, mesmo após a reforma trabalhista, ainda não se tem identificado muito a sua análise à luz do parágrafo único do artigo 59-A, para efeito de formação de jurisprudência. No âmbito doutrinário, já é possível identificar posições diversificadas acerca do tema.

A ilustre professora Vólia Bonfim Cassar e o autor e magistrado André Cremonesi compartilham da concepção de que o novo dispositivo legal prevalecerá sobre o entendimento anterior, o que fatalmente revogaria as já mencionadas previsões do TST relativas ao assunto (Súmulas nº 444 e nº 60, inciso II, e a OJ nº 388).

Já doutrinadores como Homero Batista e Maurício Godinho Delgado, divergem, baseando-se na premissa de que a sobrerremuneração do trabalho noturno é imperativa, resultante da Constituição de 1988 (art. 7º, I, CF) e, por isso, o parágrafo único do artigo 59-A seria inconstitucional.

A nosso ver, mesmo que a Constituição preveja como direito do trabalhador a remuneração do trabalho noturno superior ao diurno, tal premissa não se configuraria como violada, posto que a remuneração superior do trabalho noturno continuaria conservada dentro do horário correspondente (22h às 5h da manhã), mesmo para os casos da jornada 12 x 36.

A exceção introduzida se refere somente à prorrogação do horário considerado como noturno para após às 5h da manhã, em casos em que empregado e empregador acordem a jornada 12 x 36.

Inclusive, a possibilidade de acordarem sobre o assunto não se constitui em objeto ilícito, por interpretação do parágrafo único do artigo 611-B da CLT, também introduzido pela reforma.

Assim, ressalvada a ainda tímida jurisprudência acerca do assunto e a existência de posicionamentos contrários, fato é que a previsão do parágrafo único do artigo 59-A da CLT é expressa e está em pleno vigor, podendo, se caso mantida na lei, representar ao empregador que pratique tal jornada um redimensionamento de sua folha de pagamento a partir da admissão de novos empregados nesse sistema.

* Advogados

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