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Menor resistência

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O presidente eleito Jair Bolsonaro surpreende, até agora, por manter prudente distância dos políticos. Custou a procurar os presidentes do Senado e da Câmara, evitou as lideranças dos partidos, contornou pedidos, exigências e oferecimentos. Deu prioridade ao acordo com os governadores para, com a ajuda deles, tentar aprovar no Congresso suas reformas. Escolheu ministros civis depois de consultar as bancadas parlamentares. O consenso em torno da ministra da Agricultura, deputada Teresa Cristina (DEM/MS), resulta de indicação da bancada ruralista.

Está em curso o processo para a escolha do ministro da Educação, Cultura e Esportes. A bancada evangélica já encaminhou sua preferência. É um deputado. A solução deve aparecer na próxima semana. Quando o assunto sai da estrita visão político/partidária o processo privilegia militares de alta patente. Todos os escolhidos possuem cursos importantes, chefiaram missões dentro e fora do país. Enfim, possuem currículo capaz de justificar a indicação. Aliás, no caso do Ministério da Defesa, o escolhido não foi da Marinha porque recusou a indicação.

Na Educação reside ponto nevrálgico do governo Bolsonaro. É nesta seara que a ideologia vai estar em debate. O presidente eleito sempre declarou ser contra a escola envolvida por tinturas ideológicas. Mas não é segredo para ninguém que a esquerda domina a universidade brasileira. A maioria dos reitores das universidades federais integra um bloco de esquerda que vai do PSOL ao PDT, com importante presença do PT. Esse é o cenário dominante em todas as universidades federais brasileiras. A reação a Bolsonaro é muito forte neste segmento. O ministro da Educação terá dificílima missão pela frente. Cultura e Esporte podem fazer barulho, mas não costumam fazer greves.

A criação do Ministério da Infraestrutura não é novidade. Fernando Collor, no seu breve governo, tentou o mesmo caminho. Nomeou Ozires Silva para administrar a pasta. Ele ficou um ano no posto, de marco de 1990 a março de 1991. O ministério foi extinto logo depois. O superministro da economia também já existiu. Foi Zélia Cardoso de Mello, que confiscou a poupança dos brasileiros. Seu ato impensado e mal executado ajudou a derrubar o presidente no processo de impeachment.

Difícil entender a designação de Ernesto Araújo para o Ministério das Relações Exteriores. Ele é embaixador de primeira classe por promoção recente. Nunca chefiou uma embaixada no exterior. Seu mérito é ter feito um trabalho interpretando, se existe essa categoria, ações e pensamentos de Donald Trump. Requisito básico para que o Brasil pratique uma política de comércio exterior livre, aberta e universal é não ter preconceitos. O mais recente conflito com a diplomacia cubana poderia ter sido evitada. O mesmo objetivo seria alcançado sem ameaças de ruptura. O estilo também se aplica ao anúncio de transferir a embaixada do Brasil em Israel para Jerusalém. País em desenvolvimento, como é o Brasil, só deve agir por linhas pragmáticas. Conflitos custam caro e provocam enorme perda de tempo.

Em tempo de generais é oportuno citar Golbery do Couto e Silva, o ideólogo do governo Geisel. Ele tinha objetivos precisos. Alcançou quase todos. Alertava que é preciso avançar nas linhas de menor resistência. Ou seja, avançar onde é possível, razoável, de custo baixo e menor prazo. Foi assim que ele e o presidente fizeram a abertura lenta e gradual nos anos 70. Bolsonaro tem desafios ideológicos, políticos, administrativos e gerenciais. Só vai alcançar os pontos desejados se, com bons estrategistas a seu lado, souber avançar sobre as brechas existentes, na época adequada. O tempo, a partir de sua posse, favorece a oposição, que vai se reconstruir com novo discurso e outros líderes.

André Gustavo Stumpf*

* Jornalista