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Eleições para governador

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O Estado do Rio de Janeiro, que sempre teve sua população entre as mais politizadas do país, deu a Bolsonaro, no 1º turno, 59,8% dos votos válidos e está diante de dois candidatos da direita no 2º turno para governador, o que, portanto, não reproduz no plano estadual a disputa visceral nacional entres forças progressistas e as do retrocesso.

A situação particular no nosso estado é o resultado dos recentes governos corruptos e incompetentes que se instalaram aqui avassalando a política, desorientando a capacidade crítica de escolha da população, principalmente a mais humilde.

A questão, então, não é escolher o menos ruim dos dois candidatos ao governo do estado. Esse é um falso dilema para o campo progressista, pois não votar em nenhum deles também expressa uma posição política construtiva para o futuro, pois ambos, em momentos diferentes, aderiram oportunisticamente, cada um a seu modo, a Bolsonaro. Enquanto um propõe políticas autoritárias, o outro, ex-prefeito da cidade, possui estreitos laços políticos pretéritos com a quadrilha de Cabral que assaltou o poder. É necessário vencer esse ciclo nefasto da política fluminense.

A esquerda brasileira, em particular a do Rio de Janeiro, precisa abandonar seu recente pragmatismo do varejo eleitoral. Seduzida por possíveis nacos de poder, confunde e envergonha a militância, prejudicando, assim, a construção de um movimento de massas comprometido com princípios inegociáveis que devem privilegiar as necessidades essenciais das camadas populares da sociedade.

Antes do golpe de 64, durante a ditadura e na redemocratização, as forças democráticas e progressistas ofereceram à população um projeto de governo cujo ideário embasava-se na justiça social, num Estado eficiente voltado para os mais necessitados e no controle do capital predador, especulador e improdutivo. Conseguimos eleger aqui governos com esses compromissos, pois os campos políticos e ideológicos ficavam claramente delineados, facilitando a compreensão da visão de sociedade de cada corrente na disputa eleitoral.

Já há algum tempo, esses princípios foram jogados na lata de lixo. A geleia política geral decretou o fim das ideologias, como se isso fosse possível; consagrou a competência gerencial, como se o Estado fosse uma empresa e não uma instância de equilíbrio social; estimulou a ausência de um ideário que identifique numa liderança os caminhos por ela preconizados para a evolução da sociedade.

A política passou de uma prestação de serviços à população a uma profissão das mais rentáveis para muitos. Coerência e princípios passaram a ser atitudes ridicularizadas. É evidente que se deve ter uma relação civilizada com seu adversário político, mas isso não pode se transformar em promiscuidade. Cada um no seu lado, com sua turma, para que o povão não repita: “É tudo teatro, eles brigam na frente da TV, mas depois saem juntos para jantar”. Não é possível aceitar mais essa falta de nitidez entre os que fazem política em nosso país e nosso estado.

Como aceitar que um político se filie e transite por diversos partidos que não possuem nenhuma identidade programática entre si? Ou como concordar que antigos adversários se transformem em aliados sem que haja uma modificação substancial nas práticas de ambos? Isso não é política, é negócio, cuja mercadoria é a boa fé da população.

Este artigo é um libelo voltado para um campo político em que uma geração foi formada. Independentemente do resultado destas eleições, a esquerda brasileira e também a do nosso estado terá que se debruçar criticamente sobre seus erros e recuperar princípios perdidos ao longo da caminhada, para oferecer ao povo novos comportamentos e propostas coerentes com a justiça social e a igualdade entre as pessoas.

A formação de uma ampla frente democrática nacional e estadual, sem hegemonias e intolerâncias, é tarefa prioritária para o dia seguinte às eleições do 2º turno. Isso é o mínimo que se deve fazer para que seja honrado o legado de gerações de combatentes das causas sociais que nos antecederam.

* Arquiteto e urbanista