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Procuradores induziram Teori Zavascki a manter prisões para forçar delações

Revelação é da "Folha de S. Paulo" e do site "The Intercept Brasil"

Reprodução da internet -
Zavascki
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A "Folha de São Paulo" e o site "The Intercept Brasil" trazem à tona, hoje, mais uma história secreta da Justiça: o falecido ministro Teori Zavascki, do STF, quando relator da Lava Jato, engavetou dois pedidos de habeas corpus feitos por dois empreiteiros da Andrade Gutierrez, para força-los a fazer delação premiada. Nisso, foi induzido pelos procuradores do Ministério Público Federal de Curitiba, Deltan Dallagnol à frente, e pelo juiz Sergio Moro, que era frequentemente consultado pela força-tarefa.

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Teori Zavascki aceitou se sentar sobre processos da Lava Jato (Foto: Reprodução da internet)

Mensagens obtidas pelo "Intercept" e analisadas pelo jornal mostram que procuradores consultaram Sergio Moro, antes de levar a Teori a proposta. Teori estava inclinado a soltar os executivos, pois a prisão já se prolongava, mas a Lava Jato, Rodrigo Janot à frente, paralelamente, acordou com a empresa e os empreiteiros que eles ficassem em regime domiciliar durante um ano, com tornozeleira eletrônica, até que a delação - que implicaria figurões com foro privilegiado - fosse efetivada.

Faltava, então, convencer o ministro. E lá foi ao gabinete dele o que agora se apresentou à sociedade como possível assassino do ministro Gilmar Mendes, o grisalho Janot. A tarefa seria difícil, pois Teori era um homem sério, não dado a acordos dessa natureza, e sequer conhecia os termos da delação. A tendência dele era a de soltar os representantes da empresa e, se assim o fizesse, adeus delação.

Popularmente, em qualquer botequim, a turma chamaria essa trama de chantagem. Vamos mantê-los presos até que eles confessem. O que foi feito. E Teori, que Deus o tenha, aceitou participar. Dia 4 de fevereiro de 2016, o chefe de gabinete de Janot, então PGR, deu a notícia, via aplicativo Telegram, a Deltan Dallagnol: Teori iria "travar os habeas corpus esperando vocês".   

A síntese é a seguinte: caso alguém não tivesse pedido ao ministro Teori que se sentasse sobre os processos, ele, sem saber da delação premiada dos executivos (ainda não fechada), os libertaria e, soltos, por quais motivos delação?  A tendência era Teori deixa-los esperar o julgamento (sem delação homologada) em liberdade.  

Com a resposta do engavetador Teori, Moro transferiu os executivos, no dia seguinte, do regime fechado para o domiciliar. Foi quando os procuradores começaram a se organizar para  tomar os depoimentos (a delação) dos executivos, agora, sem receio de que fossem soltos pelos habeas corpus que diminuiriam o "poder de barganha" - diz a "Folha" - da Lava Jato. "Acho melhor manter o sigilo", disse o chefe de gabinete de Janot a Deltan. "Só pro Teori ficar tranquilo.", desvenda o jornal.

Representantes da força-tarefa disseram à "Folha" que "não houve ilegalidade" na negociação. Moro confirmou que "houve respeito aos direitos da defesa e que discussões entre procuradores e juízes como as reveladas pelas mensagens são normais", diz a "Folha".

Os executivos estavam na cadeia há cinco meses em prisão preventiva decretada por Sergio Moro, sem que houvesse garantia de que delatariam crimes eventualmente cometidos por políticos e figurões da República. Eles já haviam recorrido ao STJ pela soltura - o que os procuradores temiam. " 'As chances de um acordo com réus soltos com volta para a cadeia posteriormente era mínimo', disse o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, integrante da força-tarefa de Curitiba, no Telegram", conta a reportagem, que completa:  "A não celebração de um acordo geral por causa de alguns meses na cadeia a mais será visto no futuro como um erro", disse Fernando.

Sérgio Moro se mostrava aflito pela não efetivação da homologação da delação dos executivos, e escreveu a Deltan perguntando. Disse o juiz ao procurador, de acordo com a reportagem: "Nao que eu esteja preocupado. Por mim podem ficar mais tempo" [presos]. Deltan respondeu com risos: "rsrsrsrsr".

Os advogados dos executivos pressionavam os procuradores pela soltura dos acusados, afinal, a negociação da delação andava. " 'Sobre relaxamento da prisão, vamos primeiro sondar o Russo, para em seguida, se for o caso, conversarmos sobre noticiar ao Teori antes da decisão aqui' ", disse o procurador Paulo Roberto Galvão aos colegas em 20 de janeiro, tratando Moro pelo apelido que o grupo usava em conversas privadas", conta a reportagem.

Ao jornal o ministro Russo, o Moro, disse não haver "qualquer ilegalidade". "É usual e legal procuradores ou advogados discutirem questões jurídicas com juízes, assim como as conversas entre o procurador-geral da República e o ministro do Supremo Tribunal Federal competente", disse, de acordo com a reportagem.

O ex-procurador Marcello Miller reconheceu para a "Folha" as mensagens do Telegram divulgadas como sendo suas, confirmando que são verídicas.