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'Nós usamos ciência, não balela de Twitter', diz ex-diretor do Inpe

Debate abordou a preservação do meio ambiente, agronegócio e a repercussão da crise no Instituto

Reprodução -
Ricardo Galvão, foi demitido do Inpe após rebater ataque do presidente Jair Bolsonaro
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Durante bate-boca na Globo News, o ex-diretor do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), Ricardo Galvão, disse a Ricardo Salles (Ambiente), que "nós [do Inpe] usamos as publicações científicas, não a balela que vocês usam, coisa de Twitter". A fala é uma resposta às críticas do presidente Jair Bolsonaro aos dados de desmatamento do Deter (Detecção do Desmatamento em Tempo Real), que apontam para o crescimento do desmate da Amazônia em junho e julho deste ano, em comparação com 2018. 

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Ricardo Galvão, foi demitido do Inpe após rebater ataque do presidente Jair Bolsonaro (Foto: Reprodução)

O debate, que aconteceu neste sábado (10), abordou a preservação do meio ambiente, agronegócio e a repercussão da crise no Instituto, que culminou na demissão de Galvão em 2 de agosto.

Segundo Salles, os dados do Inpe não são mentirosos, como sugeriu Bolsonaro, mas dão margem para "interpretações sensacionalistas". 

"Eu não tenho dito que os números estão manipulados, mas que a forma de se apresentar os números está. A imprensa teve acesso a isso antes do Ibama, um repórter sabia dos dados antes do próprio órgão. Isso é inadmissível", disse.

O ex-diretor do Inpe, acusado por Bolsonaro de estar "a serviço de alguma ONG", aproveitou o momento para defender a si mesmo e ao Instituto. "O presidente da República chamou os dados do Inpe de mentirosos. Ele acusou todos os cientistas do Inpe de terem cometido crime de falsidade ideológica. Ele me acusa de estar a serviço de uma ONG internacional. Eu não sou uma criança, eu tenho uma respeitabilidade internacional enorme. O presidente da República me acusa. Não acha isso errado ministro?", questiona.

Salles defendeu o presidente e afirmou que Jair Bolsonaro é "uma autoridade política que tem liberdades". O ministro disse ainda que Galvão deveria ter tido autocontrole durante a entrevista, na qual afirmou que o presidente agia "como se estivesse falando em botequim". O ex-diretor do Inpe rebateu, alegando que, apesar de Bolsonaro ser uma autoridade, ele não tem "liberdade moral" para fazer acusações. 

Para acalmar os ânimos, a jornalista Renata Lo Prete, que comanda o programa, aproveitou a presença de Marcelo Brito, presidente da Abag (Associação Brasileira do Agronegócio) para apartar a discussão, passando a ele a palavra e encerrando o bloco em seguida. 

Na reta final do programa, os convidados assumiram um tom apaziguador e Galvão chegou a concordar com a sugestão de Salles em retomar o TerraClass, projeto do Inpe em parceria com a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), que visa acompanhar a regeneração de áreas desmatadas e emitir relatórios a cada dois anos.  

"O ministro tem uma crítica ao desmatamento que está correta. O Deter e o Prodes dão o dado de desmatamento da floresta nativa, mas não computam como foi a regeneração e utilização da terra depois. Nós deixamos de fazer [as análises do TerraClass] a partir de 2014 porque era um recurso do BNDES que deixou de ser passado ao Inpe. Eu, apesar das divergências com o ministro, considero muito boa a proposta dele de nós voltamos com o TerraClass", concluiu. 

Entenda a crise

A troca de acusações envolvendo o ex-diretor do Inpe, Ricardo Galvão, o presidente Jair Bolsonaro e seus ministros, Ricardo Salles (Ambiente) e Marcos Pontes (Ciência), começou no dia 3 de julho de 2019, quando dados do Deter, sistema de alertas de desmatamento do Inpe, apontaram que o desmate na Amazônia cresceu.

De lá para cá, o ex-diretor do Inpe e o presidente trocaram acusações, Galvão foi demitido e Marcos Pontes escolheu um militar - Darcton Policarpo Damião - como diretor interino do Instituto.

Além disso, em 6 de agosto, novos dados do Deter mostraram que a situação era pior do que se pensava e, devido a crise e a relação tensa entre o governo Bolsonaro e países europeus que dão recursos para proteção do ambiente, a Alemanha cortará o repasse de quase R$ 150 milhões para preservação da Amazônia. (FolhaPress SNG)