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Deputado do PSL quer policiais em órgão que investiga abusos

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O deputado estadual Frederico D'Ávila ("PSL-SP) apresentou um projeto de lei para colocar policiais civis e militares entre os conselheiros do Condepe (Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana), que apura abusos dos agentes em São Paulo. Ele pretende ainda subordinar o órgão, hoje autônomo, ao governo do estado.
O texto do projeto foi publicado no Diário Oficial da Alesp (Assembleia Legislativa de SP) na quarta-feira (8). O parlamentar é autor também de outra proposta, de abril, para extinguir a Ouvidoria de Polícia do Estado –outro órgão que recebe denúncias de violação de direitos.
Para o atual ouvidor, Benedito Mariano, a proposta legislativa mais recente é um "plano B" para enfraquecer a ouvidoria. Isso porque é o Condepe que elabora a lista tríplice para a composição do órgão e a encaminha para o governador fazer a nomeação.
"A ideia é destruir a participação da sociedade civil no Condepe para indiretamente influenciar a escolha do ouvidor, por um perfil sem compromisso com a luta pelos direitos humanos", diz Mariano.
No projeto para extinguir a ouvidoria, o deputado colocou a justificativa de que o órgão tem assumido papel de "injustamente acusar, desmoralizar e desestimular" policiais. O canal externo de denúncias, no entanto, recebe queixas de agentes e os encaminha para apuração. Entre 2015 e março deste ano foram 1.283 reclamações, de policiais civis e militares, sendo a grande maioria (97%) de abusos por parte dos seus superiores.
"Quem busca acabar com a ouvidoria são setores que querem uma polícia que atue sem compromisso com a legalidade democrática", diz Mariano.
Hoje, o conselho tem 13 cadeiras. Entre os membros efetivos, estão seis representantes da sociedade civil, integrantes de entidades de defesa dos direitos humanos, dois advogados indicados pela OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e três representantes dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. As outras são ocupadas por órgãos convidados: um do Ministério Público e um da Defensoria Pública, sem direito a voto.
O texto do deputado reduz para apenas dois os representantes da sociedade civil, mas prevê que só um seja ligado a defesa de direitos. O segundo seria indicado por entidades de policiais. A proposta ainda inclui na lista um integrante da PM e um da Polícia Civil. O projeto mantém um representante do Executivo, um do Judiciário e dois da OAB, aumenta para duas as cadeiras do Legislativo e torna efetiva a participação da Promotoria.
Para ser aprovado, o projeto de lei complementar de extinção da ouvidoria precisa da maioria absoluta de votos na Assembleia, o que significa o aval de 48 dos 94 deputados estaduais. Já o projeto de lei que esvazia o Condepe só exige que haja 48 deputados para iniciar a votação e maioria simples dos presentes para aprovar.
Segundo o presidente do conselho, Dimitri Sales, além de tentar interferir na nomeação do ouvidor de polícia, o texto vai "extinguir a finalidade do Condepe" e torná-lo um "órgão burocrático do governo". Isso porque o projeto fala em subordinar o colegiado à Secretaria da Justiça e Defesa da Cidadania, hoje sob a gestão João Doria (PSDB).
Autônomo pela lei que o criou em 1991, o conselho propõe políticas públicas, além de receber denúncias de violação de direitos, apurar e cobrar responsabilização –a exemplo de violências cometidas por policiais e sofridas pelos agentes, abusos em ações na cracolândia, transfobia em fala de deputado estadual e visita a unidades prisionais.
Esta última prerrogativa também é limitada pelo texto do deputado do PSL. Se aprovado o projeto, o Condepe só poderá ter acesso às prisões para diligências se "previamente justificadas e deferidas" pela Secretaria de Administração Penitenciária.
Dimitri, no entanto, diz que o órgão já vem sendo barrado na porta das penitenciárias. "Desde o início do governo Doria estamos sendo impedidos. Fomos em quatro unidades, e os diretores não permitiram nossa entrada. A gestão está descumprindo a lei, e o projeto vai legalizar a ilegalidade", afirma.
Para justificar o projeto, o deputado diz que os novos membros vão conferir "maior diversidade" e "conferirão moralidade", ao retirar as entidades de direitos humanos que têm "evidente posicionamento político partidário e ideológico".
D'Ávila é produtor rural e ex-assessor do ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB) para o agronegócio. No ano passado, ele migrou do PP para o PSL do presidente Jair Bolsonaro para elaborar o programa de governo da área e disputar uma vaga na Assembleia–foi eleito com 24.470 votos.
Nesta sexta-feira (10), o deputado estadual Emídio de Souza (PT) apresentou um substitutivo ao projeto. O texto inclui na formação do Condepe o presidente da Assembleia Legislativa, um integrante do Judiciário e um da Promotoria e mantém os representantes da sociedade civil.
Para o deputado petista, eles devem ser "protagonistas do controle social" de um órgão que "visa trabalhar pela promoção da cidadania e investigar violações" e que, portanto, "não pode restringir a representação popular", afirma. A Casa ainda vai decidir qual dos dois projetos irá submeter a votação.
Procurada, a Secretaria de Justiça e Cidadania afirmou que o projeto de lei mantém a autonomia do Condepe ao dizer que o conselho fica subordinado à pasta "apenas para fins de suporte administrativo, operacional e financeiro".
Doria e a Secretaria da Segurança Pública disseram que não comentam projetos de lei ainda não votados. Procurado, o deputado não se pronunciou sobre as propostas.

 

THAIZA PAULUZE