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A  reconstrução do Estado do Rio de Janeiro 

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É de conhecimento público que a situação fi nanceira e orçamentária vivenciada pelo governo do estado do Rio de Janeiro é gravíssima. Somam-se à deterioração fi scal a crise na segurança pública, o desmonte da administração, a destruição do sistema de saúde e a situação precária na oferta de serviços básicos à população. O quadro em exposição tem respaldo na evolução dos números das contas públicas que, em breve resumo, podem ser apresentados da seguinte forma: a receita total do estado sofreu um decréscimo de 47% no período 2014-2017, caindo de R$ 71,4 bilhões para R$ 45,2 bilhões. 

Ressalte-se que de 2008 a 2014 o estado fez uso corrente de empréstimos em valores crescentes, seja para cobertura de gastos com investimentos em obras, seja para custeio. Somente para fazer frente a encargos com pessoal, manutenção das despesas correntes, em especial o pagamento da folha de pessoal (ativos mais inativos), foram utilizados algo como R$ 24 bilhões em valores correntes, pela via de empréstimos ou adiantamentos de receitas e cessão de direitos futuros. 

O comprometimento da receita própria do estado – sem os empréstimos – para o pagamento da folha estava em 82,8% em 2013. Caiu para 72, 9% em 2014 e  disparou em 2017, chegando a 85,3%. Como consequência, a dívida consolidada do estado alcançou o percentual de 232% da RCL (Receita Corrente Líquida) em 2017. Trata-se da pior relação entre todos os estados da federação. O fato se agrava quando associamos os R$ 12 bilhões de débitos do Rio de Janeiro com restos a pagar no período 2014-2017. 

Isso significa que, esgotada a fonte formal de empréstimos e financiamentos, o estado capturou esse valor em dívida forçada contra seus fornecedores, prestadores de serviços, servidores e pensionistas. O que mais do que justifica a extinção da rubrica investimentos públicos no ano de 2017.  

O que todos esses números significam? Sem qualquer tipo de politicagem rasteira ou pretensão de imputação de responsabilidades ou acusação a administrações, nossa única intenção nessa apresentação é a de anunciar ao leitor o que nos espera para os próximos anos. 

1 - A situação continua crítica, pois o acordo com a União é uma simples postergação de responsabilidades e encargos, mesmo que a um custo efetivo mais baixo. Contudo, a partir de 2021, haverá a obrigação da retomada do pagamento das obrigações com os encargos da dívida, que, aos números de hoje, representam algo como 11,5% da receita.

 2 - Quando adicionamos a trajetória explosiva dos encargos e aportes ao fundo de previdência e à folha dos inativos (32% da receita corrente líquida), depreendemos um segundo grave problema: a incapacidade de um eventual aumento na remuneração dos servidores ativos e a impossibilidade da ampliação do quadro de servidores – hoje, de um total de 468 mil funcionários públicos no estado, 236 mil são inativos e 232 mil ativos. Essa diferença tende a aumentar, por conta dos três a cinco mil servidores que se aposentam a cada ano. 

3 - A projeção para os próximos cinco anos indica que a quantidade de servidores ativos pode fi car bem próxima a 42% do pessoal e o total de encargos com as pensões de servidores inativos deve se igualar a despesa com pessoal ativo. O documento apresentado pelo governo do Estado do Rio de Janeiro, em julho de 2017, intitulado “Plano de Recuperação Fiscal”, traz, na página 12, a seguinte explicação: 

“No que tange às despesas com pessoal é importante analisar separadamente ativos e inativos pensionistas. As despesas com servidores ativos no período 2010 a 2016 apresentaram um aumento de 77% enquanto as despesas referentes a inativos e pensionistas dobraram no mesmo período”. 

 Com esse quadro, o número de servidores das áreas de segurança, saúde e educação, dificilmente terá aumento real de contingente. 

O que gostaríamos de deixar ao leitor é a imagem de que a projeção da realidade pode signifi car um quadro de incertezas e angústias para os próximos anos, mesmo que algumas reversões ocorram, a saber: elevação do preço do petróleo, com o consequente aumento de arrecadação dos royalties e participações especiais, retomada do crescimento do país, ampliação das atividades e aumento na geração de empregos. Para que o quadro tenha efetivamente uma transformação radical será necessário que os valores líquidos de receitas fiscais adicionais somem algo próximo de R$ 155 bilhões ao longo dos próximos seis anos. Para isso, é preciso que a taxa de crescimento do PIB estadual seja superior em 1,5 a 1,6 ponto percentual à taxa de crescimento do PIB nacional, ou que a receita total do governo dobre em termos reais (acima da inflação) no período.  

O quadro de reversão tem baixa probabilidade de sucesso, em função da diminuição da produção fluminense de petróleo (o pré-sal já cresce mais no litoral de São Paulo), do esgotamento das bacias tradicionais e da rigidez das obrigações com despesas obrigatórias. 

Possivelmente o novo governador, seja ele quem for, terá de buscar a confi ança da população em um cenário parecido com o enfrentado por Winston Churchill, em maio de 1940.  “Só tenho para oferecer sangue, sofrimento, lágrimas e suor. Temos perante nós uma dura provação. Temos perante nós muitos e longos meses de luta e sofrimento”. 

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