Em ato pelo Dia Internacional pela Eliminação da Violência Contra as Mulheres,
mulheres do Brasil inteiro aderiram à campanha #meuamigosecreto. Começou na
internet, e com repercussão em outros canais de comunicação, a campanha que estimula as mulheres a denunciarem aquele homem que parece tranquilo e
respeitador, mas comete atos machistas no dia a dia.
Para falar das experiências de inúmeras mulheres, trago relatos delas mesmas para compreendermos o impacto que essa campanha tem na sociedade.
Andreza dos Santos, 20 anos, militante do Coletivo Enegrecer: “Vivemos um ano de grandes contradições, retrocessos e conservadorismo. O patriarcado continua organizando a vida das mulheres, cegando-as diante de situações abusivas muito óbvias, colocando-as como inimigas e manipulando-as todos os dias para que não debatam e consigam ter autonomia, consequentemente continuem sem se soltar das amarras que foram condicionadas e alimentarem um sistema que se beneficia da situação desigual que as submetem. No entanto, a primavera das mulheres veio como uma libertação, um espaço onde podemos contar o quanto nós sofremos, que o machismo está nas coisas que encaramos como comportamentos normais, mas que geram grandes insatisfações, modificações significativas na vida de todas nós. É também um momento de sentirmos apoio uma nas outras e sairmos da teoria da sororidade para a prática, ouvir que a outra também sofre o mesmo que você e que também se sentiram mal por isso, usadas, despedaçadas, abusadas e impotentes em cada situação de assédio nas ruas, em casa, na faculdade, nas redes sociais. É um momento de dizer que não estamos acomodadas e satisfeitas com o modelo que construíram para sustentar as nossas vidas, que temos forças e que não vamos mais nos calar e empoderar nossas irmãs é uma prioridade. Cada campanha que nós fazemos nas redes sociais e ganha visibilidade faz pelo menos alguém refletir, faz mulheres arrancarem as vendas e mudarem suas perspectivas. Nós somos resistência e lutaremos até que sejamos livres!
#meuamigosecreto pressiona as suas funcionárias , muitas vezes menores de idade, para ficar com ele como forma de manter o emprego. Esse mesmo homem me levou a um beco sem saída quando precisei de carona. Que azar vc deu comigo, hein companheiro?”
Dandara Jesuine Bohrer, 21 anos, estudante de Relações Internacionais: “O que fica muito claro quando se começa a debater temáticas que dizem respeito a opressões sociais que existem por estruturas de poder, é que o privilégio cega. Ser branco/a cega, ser homem cega, ser hétero, universitário, classe média, magro. As sobreposições de intersecções não permitem que as pessoas entendam de qual lugar de fala neste mundo as outras diferentes pessoas falam. E o orgulho não as permite escutar. O espaço da rede social se torna um ambiente de hostilidades entre pessoas que têm e boca e não ouvidos. O que se sucede, por exemplo, é que a minha denuncia em relação ao preterimento afetivo e sexualização da mulher negra vira debate com homem que, de fora da minha vivência, quer me ensinar com argumentos cientificistas a melhor maneira de agir com relação às questões que me atingem. Seria algum tipo de colonização da contemporaneidade?
#?meuamigosecreto Diz que é de esquerda e feminista mas só fica com mina padrão. Se alguém abre a boca, diz que até já pegou uma preta. Tamo de olho”
Natália Trindade, 24, advogada: “Eu considero MUITO importante, porque mostra a importância do empoderamento da mulher nos espaços públicos, na condução das pautas políticas feministas e aquelas ditas "gerais", que se relacionam em ser contrário ao conservadorismo. E assim como nas ruas, a rede é um local público, que está em disputa, o que torna essas campanhas muito importantes. Para mal, a gente já sabe que a internet transforma covardes em verdadeiros machões. Agora é a hora de usarmos para o bem, para o bem das mulheres e de uma nova sociedade. Essas hashtags vêm empoderar a mulher de que o que aconteceu com ela, aconteceu também com outras, e que por isso não é culpa dela, e sim da naturalização do machismo. Elas servem também para quebrar essa naturalização quando os homens se deparam com situações genéricas, mas que representam situações que eles já fizeram ao menos uma vez. Alguns resistem, relutam, minimizam, mas gera o incômodo. E esse com certeza é o primeiro passo: movimentos contrahegemônicos devem incomodar. E as mulheres tão incomodando e não vão parar!”
#MeuAmigoSecreto já forçou a namorada a manter relações sexuais com ele, mas acha que 'estava no direito' por ser namorada.
Aika Cortez, 21, MC de hip hop: “Eu vejo como mais uma forma de se libertar do machismo "nosso" de cada dia, a internet, sobretudo as redes sociais é a ferramenta mais utilizada no mundo pelas pessoas para se expressar. Acho incrível as ações como essa e como elas ganham força, porque são práticas cotidianas que as mulheres sofrem, eu vi muitas mulheres tendo a coragem de contar pela primeira vez abusos que sofreu porque na timeline delas tinha muitas dessas ## rolando, a cada relato que elas liam se identificavam e viam ter passado pelo mesmo, que eras não eram as únicas e tão pouco estavam sozinhas. Através dessas tags a gente vem conseguindo criar uma grande rede de empatia entre nós mulheres e tem sido cada vez mais libertador/empoderador pra nós. Somos criadas/ensinadas a nos calar e através de ação como essas muitas mulheres vem entendendo que elas não são obrigadas a ficar e aceitar quietas quando são maltratadas.
#?meuamigosecreto é um babaca do movimento HipHop, misógino, não tem a capacidade de articular com mulheres e as excluem totalmente do processo de construção do movimento, quando agrega uma, a coloca em papéis secundários e não da quase nenhuma credibilidade ao trabalho da mesma, meu amigo secreto, se diz feminista e apoiador na causa das minas, porém entre os "seus" faz piada e zoa cada mina rapper que levanta a bandeira da luta das mulheres, e até as que não levantam, de tão misógino que ele é.”
Aline Barbosa, 28 anos, estudante de Direito e Militante da Pastoral da Juventude: “Gostei muito da campanha #MeuAmigosecreto, acredito, que ela é um alerta a sociedade para uma cultura machista que nos assombra de forma maquiada. Pois muitas atitudes machistas e que ferem a dignidade das mulheres passam despercebidas e são vistas como normais. Não é nada normal, ser mulher hoje e diariamente ser atingida por diversas formas, seja por ofensas, por atitudes que menosprezem nossa capacidades em diversos âmbitos, principalmente no âmbito profissional, não somos apenas instrumento de operacionalização, acredito que as mulheres contribuem de forma expressiva e imprescindível no crescimento da Sociedade.
#?MeuAmigosecreto se diz uma pessoa de caráter,mas não respeita nem as próprias filhas. E acha que sua mulher deve ficar trancada em casa só fazendo os afazeres domésticos enquanto ele se diverte na rua bebendo,e quando chega em casa desrespeita ela e suas filhas com palavras ofensivas.”
* Walmyr Júnior é morador de Marcílio Dias, no conjunto de favelas da Maré, é professor e representante do Coletivo Enegrecer como Conselheiro Nacional de Juventude (Conjuve). Integra a Pastoral Universitária da PUC-Rio. Representou a sociedade civil no encontro com o Papa Francisco no Theatro Municipal, durante a JML.