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O "Power Trio" do saxofonista David Murray

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O saxofonista tenor, mestre do clarinete baixo e compositor David Murray impôs-se como uma das figuras mais criativas e originais do jazz de vanguarda desde o início da década de 1980, quando formou com Julius Hemphill, Hamiett Bluiett e Oliver Lake (depois James Carter) o World Saxophone Quartet – aclamado combo sem o apoio de qualquer instrumento rítmico que gravou mais de uma dezena de álbuns nos seus primeiros 10 anos de atuação constante.

Inicialmente muito influenciado por Albert Ayler e seu expressionismo ao mesmo tempo bluesy e free, Murray desenvolveu estilo próprio, caracterizado por som volumoso, constante uso do vibrato e de efeitos multifônicos, na liderança de conjuntos diversos, incluindo um oiteto e até uma big band – esta com as imprevisíveis “conduções” de Lawrence Butch Morris (1947-2013).

David Murray, 61 anos, retorna agora às lojas virtuais com o CD Perfection (Motéma), em trio, na companhia da pianista Geri Allen, 59, e da baterista Terri Lyne Carrington, 50 - jazzwomen da “Primeira Liga”, assim consideradas sem qualquer “gentileza” à sua condição feminina.

O álbum foi gravado em junho do ano passado, uma semana depois da morte de Ornette Coleman, e a faixa-título (6m05) é uma composição inédita do founding father do free jazz, interpretada numa incandescente improvisação coletiva pelo trio, com a participação de três convidados ilustres: Wallace Roney (trompete), Craig Harris (trombone) e Charnett Moffett (baixo).

As demais nove faixas do chamado “Power Trio” de Murray, Allen e Carrington fazem mesmo jus ao qualificativo. Mesmo na balada Barbara Allen (5m55), que tem introduções pungentes da pianista e do próprio Allen, o clima rítmico vai esquentando a partir dos dois minutos até uma série de shouts típicos do líder.

Mirror of youth (5m05), do saxofonista, com um beat inicial que remete ao samba, e Geri-rigged (6m10), da pianista, são conduzidos em alta velocidade pelo Power Trio, com destaque, nesta última peça, para um alucinante duelo sax-bateria. The David, Geri & Terri show (8m15), que parte de uma melodia de sabor brasileiro, transforma-se realmente num poderoso show de improvisação livre, politonal e polirrítmica, no qual Murray e Allen prestam homenagens a Albert Ayler e a Cecil Taylor, respectivamente, e Carrington exibe a arte excepcional que dela fez um dos bateristas preferidos de Herbie Hancock, Wayne Shorter e Danilo Perez, além de professora do Berklee Colege of Music de Boston.

No CD Perfection, David Murray toca clarinete baixo em duas peças: For Fr. Peter O'Brien (5m35), de Geri Allen, e D Special/Interlude (2m55), assinada por Terri Lyne Carrington. A baterista é também autora da meditativa Samsara/For Wayne (5m40), em homenagem ao grande Wayne Shorter, com Murray voltando ao sax tenor.

Numa resenha do disco para a National Public Radio (NPR), o crítico Kevin Whitehead anotou, com propriedade, que um trio jazzístico sem contrabaixo não é usual. Mas que, no “Power Trio”, o piano e a bateria “ficaram com mais espaço para manobras, e para mergulhar nas frequências baixas”. Além disso, Geri Allen e Terri Lyne foram levadas a tocar mais duetos, num “cintilante interplay”.

(Faixas deste CD podem seu ouvidas em: open.spotify.com/user/sieger262/playlist/57IRZ9h5OeCnN5nE571WOR)