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'The Guardian':  "Grã-Bretanha sofrerá ataques terroristas", diz o chefe do MI5

Pela primeira vez na história um diretor dos serviços secretos britânicos concede entrevista

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Pela primeira vez em 107 anos de história, um líder do MI5 concedeu uma entrevista a um jornal. A edição do britânico The Guardian traz nesta terça-feira (1) uma exclusiva com Andrew Parker, chefe do MI5 (Military Intelligence, section 5), o serviço britânico de segurança interna, informações e contra-espionagem. O órgão foi fundado há 107 anos e, até 1993, a identidade do seu Diretor-geral era um segredo de Estado.

"A Rússia está utilizando toda a variedade de instituições e poderes estatais para impulsionar sua política externa de forma cada vez mais agressiva, incluindo propaganda, espionagem, subversão e ataques cibernéticos. A Rússia está trabalhando em toda a Europa e Reino Unido. O trabalho do MI5 é se colocar no seu caminho”, diz Andrew Parker, defendendo que, apesar da ameaça do extremismo islâmico ser um dos assuntos que ocupa maior parte da capacidade do MI5, as ações ocultas de Estados estrangeiros, em especial do Kremlin, são um perigo cada vez maior.

O Guardian conta que o diretor-geral dos serviços secretos britânicos diz ainda que a Rússia possui também agentes de informação em ação no solo britânico, um pouco ao estilo da Guerra Fria. No entanto, a grande diferença nos dias de hoje é o advento da guerra cibernética, com os alvos preferenciais a centralizados nos segredos militares, projetos industriais, informação econômica ou na política externa.

"Apesar disso, a ameaça terrorista não deixa de preocupar. Neste momento, segundo os cálculos do MI5, existem cerca de três mil potenciais extremistas violentos no Reino Unido. E esse é um dos problemas que a agência está tentando resolver, no que diz respeito à ameaça terrorista". Os outros dois, segundo Parker, são os militantes do Estado Islâmico presentes na Síria e no Iraque, que incentivam o planejamento de ataques em território britânico, e alastram sua “ideologia tóxica” através da Internet.

The Guardian também abordou o tema Brexit. Andrew Parker desmente que o fato do Reino Unido ter decidido abandonar a União Europeia possa afetar de maneira negativa a relação com os serviços de inteligência dos outros países europeus.

> > The Guardian Exclusive: 'There will be terrorist attacks in Britain,' says MI5 chief

A última vez que um jornalista teve acesso á informações do MI5 foi em 2015, quando  Edward Snowden ganhou um prêmio Pulitzere irritou profundamente os governos britânico e americano, assim como as agências de inteligência, o que levou a um debate feroz em todo o mundo sobre a vigilância em massa, lembra o The Guardian.

Andrew Parker, que já era diretor-chefe na época falou sobre o dano que Snowden estava causando as agências de inteligência e ainda falou que sua publicação era como uma "ajuda aos nossos inimigos". Então ele mudou de ideia? Será que ele agora reconhece que a matéria de Snowden ajudou ao invés de atrapalhar?

"De jeito nenhum", diz ele. 

E o Guardian? Você consegue agora entender o motivo de publicamos a história? 

"Eu também não tenho opinião sobre isso", ele diz, segurando um copo de água em sua mão esquerda com um pouco mais de força.

"Eu falei na época sobre o dano que foi feito ao trabalho de agências de inteligência britânicas e aliadas, sobre a forma como operamos ter sido revelada aos nossos adversários. O segredo é algo que precisamos manter para o bem de todos, não somente nosso".

"O Guardian tem um claro interesse no trabalho que fazemos - alguns deles estão bem informados, outros menos. Eu estou tentando esclarecer algumas questões importantes para todos."

The Guardian afirma que Parker tem uma visão do mundo que se concentra em três áreas de ameaça. O primeiro é o terror de inspiração islâmica, que ele chama de duradouro e geracional.

"O terrorismo internacional em sua forma mais recente, baseado em sua ideologia, traz o terror para nossas ruas e da maior parte do mundo desenvolvido, incluindo a América do Norte, Austrália e Turquia", diz ele.

"Atualmente, o nome dele é Daesh, ou Isis [Estado Islâmico], e ainda temos a marca Al-Qaida. Isso é algo que temos que entender: está aqui para ficar. É uma ameaça duradoura e um desafio geracional para nós. "

Sobre o extremismo islâmico, Parker disse que os serviços de proteção britânicos impediram 12 planos de ataque nos últimos três anos, mas que a ameaça irá durar pelo menos uma geração. "Esse tipo de intriga e tentativa terrorista é preocupante e está perdurando. Ataques neste país são mais altos do que eu experimentei em toda a minha carreira - e eu tenho 33 anos de  MI5. A realidade é que por causa do investimento em serviços como o meu, o Reino Unido tem boas defesas. Minha expectativa é que vamos encontrar e parar a maioria das tentativas de terrorismo neste país. "

Ele deixa a palavra "mas" escapar antes de acrescentar: "Haverão ataques terroristas neste país. O nível de ameaça é grande e isso significa que é provável. "

A segunda área de ameaça é o terrorismo na Irlanda do Norte - do que ele chama de "republicanos dissidentes de vários tipos". A última morte relacionada ao terrorismo foi de um oficial que trabalhava em uma prisão em março deste ano.

E o terceiro é a ameaça secreta de governos estrangeiros. Mais exercida pela Rússia, que ele diz que está trabalhando em toda a Europa e no Reino Unido, usando meios militares, propaganda, espionagem, subversão e ciberataques para atingir seus objetivos de política externa. 

Parker diz que a ameaça da Rússia é real - em parte porque é tão variada. "Vemos isso em lugares como a Ucrânia e as terríveis brutalidades na Síria".

Parker, de 54 anos, mantém a maior parte de seus antecedentes em segredo. A coisa mais óbvia sobre ele é que ele é alto - bem mais de 6 pés. Ele deve ter entrado no serviço antes das regras serem introduzidas dizendo que qualquer homem com mais de 5 pés, ou mulheres acima de 5 pés, não poderiam ser agentes de vigilância, porque se destacam em uma multidão. Eles também dizem que os agentes não devem ter tatuagens visíveis pela mesma razão. Parker passa nesse teste.

Parker diz: "Precisamos ser capazes de vigiar os terroristas. Temos de nos aproximar, cultivar e recrutar pessoas para ser agentes de trabalho para nós. Isso não funciona bem se todo mundo se parecer comigo".

Ele diz que por causa da ameaça sofisticada, o MI5 precisa operar na vanguarda da tecnologia. Os trabalhos atuais incluem: credenciador de risco cibernético, analista de negócios sênior, arquiteto de informações, analista de problemas, especialista em operações técnicas secretas e arquiteto de segurança.

Mas a questão da vigilância em massa não desaparecerá. Críticos, incluindo o Guardian, argumentam que ele vai longe demais ao permitir o acesso a dados pessoais. 

Parker disse que está preocupado com essa caracterização. "Isso sugere que o MI5 está de alguma forma em uma gangorra, que estamos em uma extremidade da gangorra querendo mais e mais intrusão na privacidade mas nosso interesse é proteger os direitos de todos. Temos que nos equilibrar com os direitos civis e estamos empenhados em conseguir".

E a descoberta do tribunal de investigações, que disse que as agências de segurança coletaram ilegalmente dados pessoais por 17 anos - de 1998 a 2015? O tribunal concluiu que este artigo violava o artigo 8 da Convenção Europeia dos Direitos Humanos - o direito à privacidade de um indivíduo e da sua família.

Parker diz que outras revisões independentes apoiaram o caso da coleta de dados em massa. "É vital para mim na era da internet poder acessar os dados para encontrar essas pessoas que querem prejudicar ou atacar o país".