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Para embaixadores de França e Alemanha, eleição europeia é a mais decisiva em décadas

Foto: Reuters/Lisi Niesner -
Em relatório divulgado nesta sexta-feira com atualização epidemiológica, o ECDC diz que a Ômicron foi identificada em todos os países da União Europeia e Espaço Econômico Europeu, com "prevalência estimada de 69,4%", 20% a mais que na semana anterior
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Os europeus começaram a ir às urnas nesta quinta-feira (23) para renovar o Parlamento do bloco continental, no que os embaixadores da Alemanha e da França no Brasil consideram as eleições comunitárias "mais decisivas das últimas décadas."

"É a primeira vez que a União Europeia enfrenta uma ameaça interna. Uma ameaça que vem de partidos de dentro do bloco", avalia o embaixador alemão, Georg Witschel.

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União Europeia (Foto: REUTERS/Lisi Niesner)

"Os ataques são conduzidos por pessoas que têm interesse direto em desafiar a União Europeia, para fragilizar o bloco e sua estrutura econômica", complementa Michel Miraillet, embaixador da França.

Para os dois diplomatas, que conversaram com a Folha de S.Paulo na quarta-feira (22), são vários os fatores que fazem destas eleições as mais relevantes desde 1979, quando os então nove membros da Comunidade Europeia foram às urnas para participar de um pleito internacional sem precedentes.

Além de serem as primeiras eleições comunitárias desde que o Reino Unido decidiu, no plebiscito do brexit, deixar a União Europeia, as pesquisas de opinião neste ano apontam para o crescimento de partidos de caráter nacionalista e populista, que em muitos casos partilham uma visão eurocética e hostil à burocracia de Bruxelas.

As sondagens indicam que essas forças radicais ampliarão a sua influência, mas não terão poder para chegar ao controle do Parlamento.

"Esses partidos populistas de direita têm pontos em comum. Eles criticam pesadamente, querem desconstruir e destruir, mas jamais apresentarão alguma estratégia sobre como será o futuro da União Europeia. São mestres em destruir, mas são incapazes de oferecer qualquer alternativa viável sobre o futuro da Europa", afirma Witschel.

"Estamos diante de uma situação complexa. Ou essas forças populistas que pregam a desconstrução ganham ainda mais poder, o que seria muito ruim; ou elas são bloqueadas ou ao menos desaceleram", acrescenta o embaixador alemão.

O pleito comunitário começou na quinta-feira no Reino Unido e na Holanda, mas a maioria dos países membros realizará as suas eleições no domingo (26).

Ambos embaixadores reconhecem que haverá algum crescimento dos partidos nacionalistas de direita radical -que têm entre seus principais líderes o italiano Matteo Salvini, a francesa Marine Le Pen e o húngaro Viktor Orbán-, mas argumentam que será possível limitar esse avanço.

Para Michel Miraillet, o impasse no Reino Unido em relação ao brexit -sem conseguir aprovar um acordo de saída do Reino Unido da união continental, a primeira-ministra Theresa May anunciou nesta sexta-feira (24) que deixará o cargo- pode "enviar uma mensagem" às pessoas de valorização da União Europeia.

"A imagem dessa agonia parlamentar com o brexit acorda muita gente. Por que depois de anos eles não foram capazes de tomar uma decisão? Isso envia uma mensagem às pessoas: por que simplesmente não superamos isso e voltamos para a velha União Europeia, com os britânicos dentro dela?", diz.

"Sinceramente, quando vejo os discursos do Nigel Farage [líder do Partido do Brexit, de ultradireita] é algo horrível. Aquele país não merece isso", acrescenta o embaixador francês.

Georg Witschel, por sua vez, avalia que o escândalo que atingiu em cheio o Partido da Liberdade da Áustria (FPÖ), levando à dissolução da coalizão que incluía a direita radical naquele país, também deve ajudar a conter o avanço nacionalista, especialmente na Alemanha.

"Com relação aos populistas de extrema direita, existe uma boa chance de que o avanço da Alternativa para a Alemanha (AfD) seja limitado. Existe a repercussão do escândalo na Áustria, e a AfD tem o seu próprio escândalo de financiamento político ilegal. Então já não existe mais a imagem de que eles estão livres de irregularidades", pondera.

De acordo com os diplomatas, que representam os dois países que formam a espinha dorsal da União Europeia, a coalizão de direita radical tem ainda outra característica: antagonizam com as instituições europeias, mas não acenam no sentido de deixar o bloco.

"É interessante ver como muitas pessoas atacam a União Europeia, especialmente na Europa Oriental. Há ataques que vêm do primeiro-ministro da Hungria [Viktor Orbán], há ataques que vêm da Polônia. Mas o resultado é que o senhor Orbán se recusa a promover o seu próprio brexit. É uma postura política, porque toda a Europa oriental se beneficiou enormemente da União Europeia", diz Miraillet.

"Existe essa onda populista, mas eles são espertos o bastante para não defender pura e simplesmente a saída da União Europeia. Eles sabem que sem o financiamento europeu e sem a livre circulação de pessoas as suas economias rapidamente enfrentariam sérios problemas", conclui Witschel.

RICARDO DELLA COLETTA