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Novo rumo no Itamaraty de Bolsonaro

Para embaixador Graça Lima, novo governo abre janela para euforia liberal no Brasil

Cristina Lacerda/Cebri -
Graça Lima em conferência no Museu do Amanhã, no Centro do Rio, na última quarta-feira
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O presidente eleito do Brasil, Jair Bolsonaro, está a 36 dias de subir a rampa do Palácio do Planalto para receber a faixa presidencial de Michel Temer. Na ocasião, do outro lado da Esplanada dos Ministérios, rodeada por um espelho d’água, a sede do Ministério das Relações Exteriores (MRE) assistiria a posse de camarote, não fossem as torres do Congresso Nacional. Os dois palácios devem testemunhar nos primeiros cem dias de governo os reflexos imediatos do programa de governo eleito pelas urnas. Desde a campanha, Bolsonaro defendeu um Itamaraty aberto a negociações com o mundo “sem viés ideológico”, tarefa que caberá ao futuro chanceler, Ernesto Araújo. Para o embaixador José Alfredo Graça Lima, a nova política externa buscará autonomia através da integração comercial.

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Graça Lima em conferência no Museu do Amanhã, no Centro do Rio, na última quarta-feira (Foto: Cristina Lacerda/Cebri)

Depois do superávit da balança comercial brasileira registrar o melhor outubro da série histórica iniciada em 1989, defensores de uma maior abertura do Brasil para o comércio exterior e investidores seguem atentos à agenda do próximo governo, que se propõe defensor de privatizações e negociações com a União Europeia e os Estados Unidos.

Com a plataforma sustentada por Araújo e o ministro da Economia, Paulo Guedes, o embaixador Graça Lima prevê um aumento no nível das importações no próximo governo. “O Brasil se integra justamente através da sua agroindústria. O que esperamos é que essa seja uma oportunidade de importar mais para satisfazer essas necessidades. No momento em que melhoramos as condições de concorrência interna, olhamos mais para o mercado externo. É assim que se dá a integração”, explicou o diplomata, que também é conselheiro do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), durante uma conferência do think tank no Centro do Rio.

O embaixador atribui o declínio da produtividade industrial e o aumento das desigualdades sociais ao caráter mais fechado da economia brasileira, e aposta na melhora das necessidades dos consumidores e das indústrias a partir da abertura, tal como na implementação do Plano Real, entre 1994 e 1995.

A lua de mel que promete institucionalizar o comércio exterior como uma das principais tônicas do Itamaraty no próximo mandato presidencial depende das relações com a China. Embora o tema seja tradicionalmente compartilhado com o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio Exterior e Serviços (MDIC), esses tópicos ficarão atrelados ao superministério de Guedes, e a responsabilidade caberá a Ernesto Araújo.

O perfil do futuro chanceler, no entanto, surpreendeu até mesmo quadros do Itamaraty pela sua inexperiência na carreira diplomática e suas posições contundentes contra a globalização, que movimenta os fluxos comerciais do século 21, e a China, tratada como “maoísta” em seu blog pessoal.

Graça Lima era cotado para o MRE do governo Bolsonaro pela sua defesa da abertura econômica até a surpreendente indicação de Araújo. Questionado sobre a possibilidade do colega representar um horizonte de problemas para as relações entre Brasília e Pequim, o diplomata buscou respostas no céu da Baía de Guanabara, por meio das janelas do Museu do Amanhã, após breve pausa. “O que estou tratando de explicar… e fazer com que os tomadores de decisão entendam é que o papel do Itamaraty é crucial na execução da política comercial”, avaliou.

No âmbito regional, o embaixador e conselheiro do Cebri defendeu a reformulação do Mercosul, hoje preso a um “marasmo”. “Eu tenho toda a expectativa favorável com relação a uma possível reinvenção do Mercosul na hipótese da Argentina não se mostrar tão desejosa de seguir com o projeto de uma reforma tarifária e um programa de liberalização”. Já quanto à perspectiva de um acordo entre o bloco e a União Europeia (UE), o diplomata se mostra pessimista. “O Mercosul, tal como existe hoje, não se caracteriza muito bem, nem por ser uma área de livre comércio, nem por ser uma união aduaneira. Não sei se ainda persiste essa insistência da UE em só negociar com o Mercosul, mas insisto, o bloco tal como existe hoje não é uma referência nem legal nem econômica ou comercial que deva ser mantida”, defendeu o embaixador Graça Lima.