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Narguilê, reza judaica e bombshells. Faça a sua escolha e comente aqui

Consultor de moda, Alexandre Schnabl fala Neon, Alexandre Herchcovitch, Amapô e André Lima

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"O dia começou cedo, com o desfile da Neon, de Dudu Bertholini e Rita Comparato, Conhecida por viagens lisérgico-estilísticas, a dupla dessa vez apontou a bússola para a exótica Istambul. Seria isso o fruto de chill outs temperados com narguilê?  O importante aqui é conferirmos o divertido trabalho dos estilistas que, como sempre, mandaram ver nas perfomances das modelos. O palco do Teatro Tuca Arena foi, portanto, o endereço para mais um show teatral da grife, que teve looks estrrturados, de cintura marcada e cartela de cores em amarelo, tangerina, rosa, vinho, roxo e verde, além de preto. Groove!

 No meio da tarde, Alexandre Herchcovitch apresentou sua coleção masculina com pegada judaica. Alexandre vem de família judaica e estudou por doze anos em colégio ortodoxo, conhece as tradições e a cultura do povo. Natural que, um dia, abordasse esse tema. Ele desconstruiu a roupa dos judeus ortodoxos e dos rabinos, adicionando elementos dessa cultura à sua alfaiataria premium. Por exemplo: as listras e as cores, gamas de azuis e branco, remetem ao talit, o xale que os judeus usam nas sinagogas. Com o uso de vários elementos de significado religioso na coleção, seria possível pensar que o resultado descambasse para o figurino, para a mera leitura conceitual. Nada disso. O trabalho do estilista é refinado e bem pensado. Sua alfaiataria é primorosa. Dificilmente as soluções não seriam espertas o suficiente para atingir o público de modernos que segue a grife. Deu certíssimo!

A Amapô é uma marca queridinha, faz roupa para clientes fiéis e desfiles para os mais chegados. Daí que, na plateia, figurinhas abravanadas sempre comparecem em peso e fornecem o devido calor humano a cada apresentação da dupla de estilistas, Carolina Gold e Pitty Taliani. Dessa vez, entre a legião de amigos presentes, podiam ser vistos o estilista Dudu Bertholini (olha ele aí de novo!), as produtoras Lu Lima e Nelba Cardoso, Salete Campari, o shoe designer Fernando Pires. Na boca de cena, sólidos em forma de cristais de rocha já davam uma ideia do que estava por vir. Alguma interpretação fashionista do planeta Kripton, de Superman? Nada disso! O que se viu em cena foi um pout pourri de várias interpretações daquilo que a grife, em sua opinião, acredita que deva ser a próxima estação. Havia influências variadas, desde o cartoon apocalíptico Tank Girl, geometria, neo-tropicalismo. A relação com o cenário vinha na forma de peças vazadas e recortadas - vestidos, paletós, itens masculinos e femininos - que faziam alusão às estruturação desses sólidos, assim como a construção da roupa. E isso, na verdade, foi o que menos importou. No masculino, ternos monocromáticos sequinhos, por exemplo, revelaram um amadurecimento das meninas no campo da modelagem, embora seja difícil acreditar que elas façam roupas para pessoas mais cheinhas, de tão enxutos os looks. E as botas masculinas de cano alto, cheias de detalhes transados, quase me fizeram salivar em uma experiência pavloviana, assim como as calças com supensório fininho acoplado. Até mesmo a camisa de estampada metalizada caiu bem, ainda que sejam pouco comercial, evidentemente. No feminino, ao invés de alguns looks conceituais puxarem outros mais plausíveis, como aconteceu no masculino, havia somente um exercício de estilo, como nas tais peças vazadas a até mesmo em um vestido ladygaguesco. E, em uma semana de moda repleta de boas trilhas sonoras, foi uma delícia ouvir hits da virada dos anos 1990, quando a MTV se instalou pelos lados de cá. Teve de tudo, desde Suzanne Vega, passando por Seal, Enya com seu Orinoco Flow e até Sadeness, do grupo Enygma. Essa música, aliás, tem refrão que tem tudo a ver com a diversidade de propostas da Amapô nesse desfile: "Sade dit-moi. Qu'est-ce que tu vas chercher?"

É comum ver André Lima fechar a semana de desfiles do SPFW. Na edição passada, ele passou o bastão para Ronaldo Fraga que, desta vez, não participou do evento, dando espaço para que o estilista paraense voltasse a trepidar a plateia com sua apoteose de sempre. Dessa vez, André trouxe levada multi étnica ao evento e abordou a África, japonismo, um quê de latinidade. E não é de hoje que esses três temas lhe são caros. Sem dúvida, a mulher que consome a grife quer causar e, portanto, todas referências que inspiram o estilista são exatamente aquilo que ela usa para causar furor. Ela é refinada e não é nada discreta. Veio para fazer presença. E o estilista conhece como ninguém os desejos íntimos desse tipo de mulher, um tipo de Jessica Rabbit fashionista, daquelas que podem levar um homem à ruina. Não é à toa que Camila Pitanga, fã do designer, estava mais uma vez na front row. Camila, se fosse um carro, causaria uma batida, do tipo que o seguro dá perda total. Por lá estava também a incrível Fafá de Belém, elegante em um look all black. Entre tecidos metalizados, jacquards, sedas e adamascados, o que se viu foi uma sucessão de montagens sensacionais, entre ternos brilhantes, camisas elegantes de golas e punhos avantajados, saias de todos os tipos, rodadas, longas, em camadas, com babados, em mix de estampas étnicas. Cintões, maxi laços e obis enoooormes também deram pinta. Tudo válido, desde que seja hipérbole, não é mesmo? E, na cartela de cores, ancorada por ouro, prata e grafite, havia amarelos, telha e roxos de vários tipos. E, como não poderia deixar de ser nessa semana musical, uma trilha bacanérrima que trouxe, entre sons africanos, uma levada blaxploitation. Para quem não sabe, é aquele tipo de sonoridade black dos filmes dos anos setenta feitos para o público afro-americano em busca de reconhecimento. Ah, então é isso! A mulher de André, agora, é uma espécie de Cleópatra Jones!"

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