No início dos anos 1970, uma butique em Copacabana chamada Sonia Bernardo começou a vender sandálias de aparente plástico transparente, um modelo inspirado nos sapatos dos pescadores franceses. O sucesso era tanto - a cor hit de vendas era o marrom, que ficou conhecido como o tom Coca-Cola - que chamou a atenção de empresários gaúchos, os gêmeos Pedro e Alexandre Grendene. A ideia de uma produção brasileira tirou da crise parte do setor calçadista do Rio Grande do Sul, que perdia terreno para concorrentes internacionais de preços mais baixos nos acessórios de couro. Não era a China - ainda -, na época a briga era com a Espanha.
Novas técnicas - uma das razões do sucesso da versão nacional, batizada de Melissa, foi a econômica técnica de fabricação. Em lugar de horas de trabalho de corte e costura, solas coladas e enfeites avulsos no acabamento, há uma forma onde é injetado o material plástico, o que possibilita a produção em escala industrial, de milhares de sapatos por hora. Em princípio, uma base para um calçado de preço baixo.
Só que na indústria da moda surgiu a onda do luxo nos anos 1990. Por luxo, entende-se tanto materiais preciosos e raros (peles de animais, metais e pedras preciosas, tecidos naturais, por exemplo) como peças em edições limitadas. Pela lógica do consumo contemporâneo, esta estratégia garante mais vendas e a formação de uma imagem desejada. Assim, para aderir a esta onda a Melissa começou a contratar designers de moda para assinar modelos. Georges Henri, estilista baseado no Rio, os franceses Jean-Paul Gaultier, Elisabeth de Senneville e Dorothée Bis deram a partida nestas coleções, que até hoje contam com a participação de designers como Vivienne Westwood, J. Maskrey e Pedro Lourenço.
Evolução geral - desde as primeiras sandálias de tirinhas, as Melissas com perfume característico, ícones até de figurino de novela (Dancing Days, com estilo de Marilia Carneiro), até bolsas, carteiras e as inacreditáveis versões de escarpins de salto alto e slippers com estampas de cobra e onça, a marca cresceu também no mercado internacional. Nos salões de Paris e Madri é sempre um dos espaços mais bonitos e mais cheios de compradores.
Em tempo: por que inacreditáveis, os escarpins? Porque continuam sendo feitos pelo processo de injeção, o que deve exigir muita tecnologia para que os saltos não se quebrem com o uso.
Melissa agora tem lojas-conceito, muito próximas de galerias de arte. Publica a revista Plastic Dreams, na maior parte das páginas produzida por profissionais internacionais, com modelos como a sudanesa Alek Wek nos ensaios. Com uma imagem igual à das Havaianas em matéria de desejo do consumo, virou ítem de coleção. Os preços ficam em torno dos R$ 120, bem distante da faixa popular - ok, há uma rasteirinha assinada por Jason Wu, por R$ 79,90 no site da marca.
Se virou ítem de moda, é preciso criar coleções no mínimo semestrais e sazonais. Para as fanáticas pela Melissa, avisamos que o conceito do verão 2013 é a cor. A aposta no arco-íris - Rainbow, em inglês, para ficar chique? - renova as texturas que lembram o verniz, as estampas de flores, o tie dye e os recortes. Tudo, no plástico injetável, que celebra quatro décadas de sucesso no Brasil.