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Crianças querem ser a nova geração de ouro da Chapecoense

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A queda do avião que levava a Chapecoense para disputar sua primeira final internacional na Colômbia também fez com que outros dois times locais perdessem jogos decisivos. Os jogadores das equipes sub-11 e sub-12 da Chape, garotos de 10 a 12 anos, jogariam as finais de suas respectivas categorias no dia em que souberam da morte dos ídolos do time adulto.

"Sairíamos daqui ao meio-dia para fazer o primeiro jogo da final em outra cidade. Mas quando a gente recebeu a notícia, foi tudo cancelado", disse Nívia Bezerra, treinadora das categorias de base da Chapecoense.

"Eles me ligavam chorando, perguntando: 'E agora, profe? Como é que vai ficar a nossa Chape?'. Eu digo para eles que a gente é que vai lutar para reerguer a Chape. Ela não vai morrer."

Na última quarta-feira, durante a homenagem aos jogadores na Arena Condá, o grupo de meninos foi aplaudido e exaustivamente fotografado como o futuro da equipe catarinense.

Mas as fotos os mostravam cabisbaixos e desanimados.

"Apareceram as imagens dos jogadores (no telão), aí não teve como segurar. Foi difícil", disse Rodrigo Pires, de 12 anos, que pretende ser um ponta-direita tão bom quanto o ídolo Lucas Gomes.

Mais animados, eles ensaiavam sua participação no funeral dos 51 chapecoenses mortos no acidente, que acontece neste sábado na Arena Condá, quando falaram à reportagem.

"Eles choram muito, mas já querem voltar a treinar", diz a treinadora.

"Desde o acidente, não tivemos treinos. Estamos nos vendo nas cerimônias de homenagem. Mas estamos preocupados, o clube vai disponibilizar psicólogos."

'Erguer a cabeça'

O atacante Jefferson Douglas Pavão, de 12 anos, já fala como jogador de futebol experiente.

Também já adota um corte de cabelo ao estilo de atletas do Barcelona - o "segundo time" onde sonha trabalhar - que joga para o lado ao fazer fotos.

"Agora é erguer a cabeça e fazer de tudo para o time de se erguer de volta. Eu quero ser o novo Cléber Santana, gosto muito do jogo dele", diz. No ultimo campeonato sub-12, Jefferson marcou quatro gols.

Ao descrever as qualidades do jogador falecido, no entanto, ainda usa o verbo no presente.

"Ele toca bastante a bola, chama o time, chama a responsabilidade para ele e conduz o time dentro do campo."

E, ao relembrar o susto ao receber a notícia do acidente, os olhos marejam e o charme de jogador somem do rosto.

"Eu estava dormindo, aí minha mãe me acordou e falou que o avião da Chapecoense tinha caído. Eu chorei muito em casa, fui para o colégio e chorei lá também. Vi os meus amigos chorando, não aguentei e chorei junto."

Geração Chape

Luiz Felipe Hubner, de 10 anos, se emociona, ainda, ao relembrar o momento em que soube do acidente.

"Eu pensei que era mentira. Mas minha mãe me mostrou as fotos e eu comecei a chorar", diz, com a voz embargada.

Hubner é gaúcho e foi criado em Chapecó, mas não sonha com os clubes maiores do seu Estado natal.

Segundo Nívia Bezerra, a preferência pelo time local, que até pouco tempo sequer disputava a série A do campeonato brasileiro, é algo novo, e cada vez mais comum, na cidade.

"Os pais deles ainda torcem para Grêmio ou Inter e têm a Chapecoense como segundo time. Eles não. A geração deles é Chape."

Agora, Luiz Felipe tem mais um motivo para querer crescer no time - ocupar o lugar do goleiro Danilo.

"Os reflexos dele eram muito rápidos, né. Aquela bola do San Lorenzo…"

A "bola do San Lorenzo" também é objeto de reflexão filosófica para o zagueiro (que gostaria de ser volante) Tiago Cóser, de 12 anos.

A defesa de Danilo impediu o avanço do time argentino na Copa Sudamericana, tornou Danilo um herói local e garantiu a ida da Chapecoense para a Colômbia.

Por isso, entre as crianças, e alguns adultos, passou de mocinha a vilã da história.

"Tem gente que fala: 'Por que o Danilo não deixou aquela bola (do San Lorenzo, na semifinal) entrar?'", diz Tiago.

"Mas quem sabia que ia acontecer isso? Ele fez o milagre dele, mas não tinha como saber."