Eterna quarta-feira de cinzas

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Imagine a situação: em um deserto, apenas um punhado de pessoas tem acesso a água. Você é uma dessas pessoas. Acontece que você tem esse bem durante décadas e em nenhum momento atualizou o seu meio de vender essa água. Preocupado com a concorrência, pensou em um belo copo, arrumou as suas contas e fez uma bela loja. Só que a água continua sendo retirada por filtros de barro. O copo é lindo, mas a água continua quente e barrenta.

A esdrúxula comparação serve para o leigo ter uma ideia de como foi a passagem de Guy Peixoto pela Confederação Brasileira de Basquete. Empossado em 2017, Peixoto assumiu uma confederação arrasada pela gestão de Carlos Nunes, com problemas estruturais básicos. Ouvimos relatos na época de que até a empresa que tomava conta do domínio da internet da confederação estava com o pagamento atrasado. Essa gestão teve, pelo menos, dois anos pisando em ovos para entender o tamanho do buraco em que se encontrava a confederação. Hoje a CBB é uma confederação muito mais estruturada. Se formos pensar como uma empresa, fez-se um esforço louvável na área de governança e compliance para que a área de operações funcionasse.

Imagem: Pedro Rodrigues/Bing Image creator

Pois é aí que a coisa desanda. Durante a gestão de Peixoto, os resultados das nossas seleções e na divulgação e disseminação do basquete nacional são pífios. A mais nova e doída derrota de uma seleção ocorreu no último domingo para a Alemanha. Jogando em casa, em Belém, o Brasil perdeu as 3 partidas que disputou contra Austrália, Sérvia e Alemanha, e não irá aos Jogos Olímpicos deste ano. Era a nossa grande chance de colocar o tão machucado basquete feminino no maior palco e plataforma do mundo. E a CBB fez de tudo para isso. Tudo em torno do torneio estava impecável. Tudo. Ginásio cheio, diversas interações e entrevistas com atletas e técnicos, cobertura de TV, e em quadra falhamos. Voltando à metáfora do começo do texto, o copo é lindo, mas matar a sede que é bom, nada. Lembrando que a história de decepções recentes se repetiu. Lembram da derrota do masculino para a Argentina na Americup, ano passado? Mesmo roteiro… É uma eterna quarta-feira de cinzas…

Além dos fracassos com as seleções, a passagem de Guy Peixoto foi marcada pelo embate entre a CBB e a Liga Nacional de Basquete. Não vamos nos alongar neste assunto porque todos que acompanham esse espaço já estão (com o perdão da palavra) de saco cheio desse assunto. Únicas novidades neste front para mim são as que a CBB mostrou, que não tem um décimo da força que imaginava com a estrutura arcaica de federações e que, ao organizar a Liga Ouro, efetivamente, MATOU uma das competições que mantinham jovens talentos e veteranos em ação e “testavam” o basquete em novos mercados. O Campeonato Brasileiro diminuiu ainda mais o nosso diminuto mercado.

Essa diminuição, especialmente no feminino, é doída. Com o mercado procurando mais competições atrativas para as dezenas de empresas de apostas, e as plataformas de streaming com uma necessidade cada maior de bons eventos ao vivo para transmitir, não termos um mercado para o basquete feminino estruturado é demais cruel. A LBF faz das tripas coração e mantém a chama acesa, mas é pouco. A CBB teria que entrar em quadra lá atrás para pegar uma modalidade que estava em 2017, desculpe, bem antes que isso, muito antes, destruída. Fez todo o entorno, mas o núcleo do negócio, ou seja, competições, formação de atletas, falhou.

O tempo passou, os resultados não vieram e o legado dessa atual gestão da CBB pode dar frutos bem mais lá na frente. Torcemos por isso e pela nova gestão que, parece, irá assumir em breve. O problema é que, em matéria de CBB, nunca sabemos quão nova realmente é a gestão.



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