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Camisa com nome de Marielle gera controvérsia no Corinthians

Reprodução -
Armador Gustavinho com a camisa escrita "Quem matou Marielle?"
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Uma camisa com a inscrição "Quem matou Marielle?", posicionada no memorial de conquistas do Corinthians, gerou controvérsia. Um grupo de conselheiros pediu a remoção da peça, incluída em uma exposição sobre a história do basquete alvinegro, por considerar a exibição uma manifestação política que não tem espaço no clube.

O uniforme foi usado pelo armador Gustavinho, capitão da equipe no título da Liga Ouro do ano passado. Ao receber o troféu da competição --o primeiro do Corinthians no esporte após 22 anos de inatividade--, ele vestiu uma camisa que cobrava explicações sobre o assassinato da vereadora do PSOL Marielle Franco, do Rio de Janeiro. O crime completava cem dias justamente no dia da final.

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Armador Gustavinho com a camisa escrita "Quem matou Marielle?" (Foto: Reprodução)

O pedido para que a roupa fosse retirada do memorial foi feito pelo grupo "Fiéis Escudeiros - Chapa 11", que tem 25 membros no Conselho Deliberativo do clube. Em documento enviado ao próprio conselho, ao Cori (Conselho de Orientação) e à diretoria executiva, eles repudiaram a utilização da agremiação "como 'palanque' na exposição de posições políticas pessoais".

"Para nós, as dependências do clube devem refletir um estado laico e sem nenhum tipo de conotação política", diz o texto. "Ali, é um espaço para expor troféus, não mensagens político-partidárias. Provavelmente, vão retirar para que isso não abra espaço para outras manifestações e para não acabar virando um festival político", disse Pedro Luis Soares, membro do grupo, à Folha de S.Paulo.

O pedido foi divulgado pelo diretor cultural do Corinthians, Carlos Elias, revoltado com a solicitação. "A ignorância persiste", escreveu o dirigente, dizendo estar atento à tentativa de tirar "na marra" o uniforme da exposição. O presidente Andrés Sanchez foi procurado pela reportagem, mas o clube informou que não vai se pronunciar sobre o assunto. Ele foi deputado federal pelo Partido dos Trabalhadores de 2015 a 2018.

Toda a discussão foi recebida "com surpresa" por Gustavinho, aquele que vestiu a peça com homenagem à vereadora assassinada. Hoje supervisor da categoria sub-19 do basquete do Corinthians, Gustavo Lima, 34, vê a atitude dos "Fiéis Escudeiros" como "desconhecimento da história do clube."

"O Corinthians carrega essa veia de se manifestar. É questionador desde o começo, com a inclusão dos negros no esporte. Tivemos a Democracia Corinthiana nos anos 80, e eu carreguei comigo essa veia questionadora", afirmou o ex-jogador, que se diz inspirado na trajetória de Marielle Franco. "Era uma defensora de bandeiras fortes, a favor dos direitos humanos. Minha intenção era exaltar uma mulher que era incrível e cuja morte não tinha elucidação nenhuma."

Dois suspeitos de terem assassinado a vereadora e matado também seu motorista Anderson Gomes foram presos em março, porém ainda não se chegou aos mandantes do crime, que completou 500 dias no último sábado. Agora, Gustavinho cobra que a investigação não pare na detenção de Ronnie Lessa e Élcio Vieira de Queiroz.

"Não pode parar. As investigações indicam alguma coisa no caminho das milícias e mostram um cenário atual totalmente violento. As pessoas se indignam com essas questões: quem matou Marielle, quem mandou matar Marielle? E, quando você contraria um questionamento desses, está meio que endossando as milícias", afirmou.

Ao colocar suas posições, Gustavinho faz questão de reforçar que são opiniões pessoais, que não está falando em nome do clube. "A possibilidade de se manifestar vale para todos", diz ele, e isso vale também para alguém que ele não admira: o presidente Jair Bolsonaro, que tem marcado presença em estádios de futebol.

"Esse é o conceito da democracia. Se ele acha que essa é a maneira mais oportuna [de se manifestar], que é um assunto com o qual ele tem que se preocupar, acho que tudo bem. O que não é tudo bem é ele ficar enaltecendo tortura, ter posição machista, falar mal de nordestino e ser um cara homofóbico", opinou o ex-atleta.

Por enquanto, a camisa que ele usou para levantar a taça da Liga Ouro continua exposta no memorial do Corinthians. A exibição é temporária e tem duração prevista até o final de agosto.