O poeta
Carlito Azevedo, que não escrevia há três anos, declamou poema inédito em
homenagem a Carlos Drummond de Andrade na Festa Literária Internacional de
Paraty (Flip). Na mesa Drummond – o poeta
presente, ele se juntou ao também poeta Eucanaã Ferraz . Armando Freitas
Filho, que era amigo íntimo de Drummond, gravou depoimento narrando seu
relacionamento com ele.
Intitulado Pequeno príncipe, o poema é uma carta endereçada ao poeta mineiro, que Azevedo descreveu como “esse príncipe Gautama que é o meu Buda do desapontamento”. Ao final da leitura, o público se pôs de pé para aplaudir o visivelmente emocionado poeta.
Segundo Azevedo, foi na obra poética de Drummond que ele descobriu que a quebra, momento em que o individuo fica desamparado, pode ser um aprendizado.
“Lendo Drummond, descobri que as coisas têm que quebrar. Só quando elas quebram você consegue ver como estão por dentro, se você tiver um bom sentimento do mundo”, disse.
Ele comentou o fato de o poeta mineiro ter perdido seu primeiro filho, que viveu por apenas 45 minutos. O episódio, ocorrido antes de Drummond publicar sua primeira obra, de acordo com Azevedo, influenciou decisivamente sua literatura. Da mesma forma, ao perder sua filha Maria Julieta, em 1987, o escritor não encontrou mais motivos para viver morreu depois dela. Ao ser indagado sobre o que o termo “drummoniano” representava para ele, Azevedo fez nova declaração ao poeta homenageado pela Flip:
“Acima de qualquer polêmica literária, se fosse classificar de modo útil o termo drummoniano na minha vida diria que é o ensinamento de estar à altura da sua queda”.
Vídeo
Em vídeo,
Freitas Filho falou sobre sua relação com Drummond. Apaixonado confesso pela
obra do amigo, contou que não se entenderia como pessoa sem sua poesia.
“Apesar de muito simples, era um homem que escrevia coisas extraordinárias. Pegava o ser humano por dentro, como se enfiasse uma cunha. Ele sempre escreveu para ele, para se explicar para si mesmo. Escrevia como quem faz a barba a seco, sem água, espuma e sabão”, poetizou Freitas Filho, que batizou seu filho com mesmo nome de seu mestre. “(Sua poética) se transformava num discurso geral que servia a todos. Ele não escrevia para ninguém, mas escrevia para todos”.
Freitas Filho também narrou que, ao conhecer o poeta, não sabia qual o tratamento que deveria dar ao se dirigir a ele. Até a emocionante resposta de Drummond:
“Como chamá-lo? Dr. Carlos? Mestre? Seu Carlos era cômico, e senhor Carlos ficava duro", lembrou. "Nós somos amigos, ele me disse, e amigos se tratam por você. Aquilo me deu um alívio....”, relatou.
Em uma análise mais técnica, embora não menos apaixonada, Eucanaã disse que a poesia de Drummond era inclassificável. Ele comparou a obra do mineiro de Itabira com o poeta português Fernando Pessoa, devido à sua fragmentação, considerando-o ainda “mais radical que o luso.
“É como se Drummond tivesse sido mais radical do que Fernando Pessoa. Ele fez com que todos esses lados (de sua obra) fossem conflitantes. Muitos vezes, os livros de Drummond conflitam com outros, bem como dentro dos próprios livros e dos poemas”, refletiu Eucanaã.
O escritor também comentou o fato de Drummond ter morrido após sua consagração e com vasta bibliografia, sob o título de ‘poeta maior’.
“Drummond foi o maior poeta urbano brasileiro. Ele morreu com a fortuna crítica já estabelecida e já tinha uma bibliografia vasta. Sua obra teve amplitude, ambição de ir além da visão do seu território”, afirmou.