O presidente Michel Temer não produziu surpresa aos meios políticos, quando manifestou simpatia à construção de uma alternativa de centro, a ser oferecida ao eleitorado, que vai caminhando para as urnas de outubro. Ele não censura o desejo de direita e esquerda terem propostas próprias, mas não invalida, até mesmo estimula, o direito de o voto situar-se entre as forças políticas postas nos extremos. Tratando-se dele, registre-se a ressalva de que a possibilidade de se valer dessa simpatia para disputar a reeleição fica transferida para julho, quando saberá se é possível reverter o quadro de hoje, em que sua candidatura esbarra em pálida presença nas pesquisas de tendências.
Mas ele também transita, de passagem, pelo desafio de definir, com substância, o que é ou o que deve ser um projeto político de centro, tarefa em que outros políticos têm preferido flutuar, procuram desviar-se, como já se disse, semanas atrás, neste espaço. Na maioria das vezes, os adeptos se satisfazem em condenar, igualmente, esquerda e direita, sem propor, com clareza, como desconstruí-las, mesmo se, em sua defesa, adotem a ideia de que elas se igualam no ódio à democracia, segundo a lição de Norberto Bobbio, este que é hoje o astro nas citações dos juristas. Mas nem o pensador italiano ensinou o que colocar no lugar do ódio dos extremistas. Temer também não tem a receita.
No Brasil não faltaram simulacros, em todos os tempos em que esteve em moda discutir algo atraente para o caminho do meio no pensamento político; ainda que diante das muitas rotas políticas indefinidas, que vieram após o Estado Novo varguista. Propostas e sugestões direcionadas a partidos e candidaturas de centro nem havia faltado na célebre reunião da Rua Raul Pompeia, em junho de 1945, quando nasceu o pessedismo, escola manhosa e folclórica do raposismo. Benedito Valadares, Agamenon Magalhães, Marcondes Filho levantaram a bandeira que, colocada no mastro, revelou nada ter de centrismo. Nada teve e nada disse, a começar pelo nome daquele que seria o predecessor do PSD: Partido Nacional Democrático Republicano. O óbvio, pois estranho seria se fosse partido estrangeiro, sem democracia e fora da república... Pois, desde ali, a ideia de centro já vinha confusa, aleijada, sem definições, tal como hoje.
A bem da verdade, tentativas mais sérias houve, embora em nada contribuíssem para organizar algo que não oferecesse apenas uma guilhotina para as militâncias de esquerda e de direita. Nem seria exceção o talento de Tancredo Neves, que preferiu adotar um viés pouco pragmático, mas uma elaboração romântica. Para ele, o centro devia se caracterizar e propugnar por algum programa que assim se organizasse: moderação sem covardia, sabedoria sem presunção, austeridade sem malícia e tolerância sem pusilanimidade. Uma formulação simpática, mas fluida e etérea, quando já se esperava um ideário político concreto. Pois, tanto tempo passou, e o velho político mineiro, antes que descesse em mortalha a rampa do Planalto, não havia retratado o suficiente; nem mesmo ele, dono de um perfil que se formou no horror a todo tipo de radicalização.
De volta ao presidente Temer, que provocou o assunto, sendo ou não candidato a um mandato próprio, diferentemente do atual, que é um mandato complementar. Definido como político avesso aos extremos e exercendo o comando de um grande partido, bem que poderia elaborar o breviário sobre direitos e deveres de uma nova organização política que, sem ceder ao apelo às indefinições e ao conforto das oposições meramente formalistas, oferecesse um norte para o confuso momento nacional que vivemos. Sim, exatamente ele, que está no comando de uma nação ávida, não apenas de novidade, mas, principalmente, de inovações