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A Richards vira paulista

Ícone da moda masculina carioca, que conquistou o Brasil e o mundo, terá o DNA mais paulista

Beto Herrera/Jornal do Brasil -
"A força da grana que ergue e destroi coisas belas", como diz Caetano em "Sampa", pode apagar o estilo carioca da Richards com a ida para SP decidida pela Inbrands, dona da Ellus e Salinas
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O DNA da Richards, mais claramente, Ricardo Ferreira, o ‘Charuto’, seu fundador em 1974, resistiu desde 2011. Há sete anos ele vendeu 100% do controle à InBrands, então uma parceria da Vinci Partners, a gestora de negócios comandada pelo banqueiro Gilberto Sayão, que tinha se associado com Nelson Alvarenga, dono da Ellus, para administrar uma carteira de 11 grandes marcas, que incluía ainda a Vila Romana, a Salinas, de biquinis e moda praia, a BobStore e a grife de Herchcovitch;Alexandre, entre outras.

Escolada por alguns insucessos no ramo, a InBrands manteve o fundador Ricardo Ferreira no leme e no conselho, com participação minoritária. Afinal, singrar mares, em pranchas de surf ou em barcos à vela sempre foi a paixão de ‘Charuto’ e inspiração para a moda descontraída, praieira, Zona Sul carioca, que criou em Ipanema, em 1974, depois de uma parceria inicial com os dois irmãos, Octávio Ferreira, o ‘Charutinho’, e Eliana, na Krishna.

Moda e cinema

Nos anos 60, os irmãos fizeram a 1ª incursão no mundo da moda produzindo camisas em silk screen na garagem da casa da família, na Rua Barão da Torre, em Ipanema. A Krishna, que teve a 1ª loja, na Rua Carlos Gois, colada ao cinema Leblon, no mesmo bairro, foi uma revolução que sacudiu a moda carioca e brasileira. Quem resistia a dar uma olhada com a mulher ou a namorada antes após a sessão de cinema?

Na experiência familiar da Krishna, ‘Charuto’ percebeu que a moda masculina era mais estável que a feminina (a cada estação ou meia estação surge nova tendência que desvaloriza a coleção anterior). Mas, metódico e organizado, Ricardo Ferreira concebeu uma moda descontraída, porém com rigor nos cortes, nos tecidos e no acabamento que não deixava nada a dever aos ícones da moda mundial. O estilo Richards ganhou o Brasil e o mundo, estando presente nos locais de veraneio em Portugal e Espanha (Ibiza) e em Miami.

No Brasil, a concentração do consumo e do lazer nos shoppings, locais mais seguros, que permitem estacionamento mais fácil e o gasto concentrado num só lugar, mudou o estilo dos cinemas e da moda. Das 85 lojas da Richards no país, só meia dúzia estão em pontos tradicionais nas ruas, como a nº 1, na Maria Quitéria, em Ipanema, a da Rua da Quitanda, no Centro do Rio, e a da Oscar Freire, em São Paulo.

Mais de 70 lojas estão em shoppings, em 20 estados brasileiros (a Richards só não está presente diretamente no Acre, Rondônia, Roraima, Tocantins e Piauí, mas marca presença nas multimarcas). São Paulo tem mais do que o dobro de lojas do que o Rio. O Brasil virou um grande shopping que pasteutriza a moda. O business se sobrepõe ao romantismo dos criadores.

Guinada da InBrands

Com a venda da parte da Vinci Partners para Nelson Alvarenga, em fevereiro de 2018, a pressão da InBrands para concentrar negócios (Salinas dividiu a loja da Garcia D’àvila com a Richards feminina), incluindo o marketing, o design e a gestão, em São Paulo foi irresistível. A assembleia da InBrands, em 28 de novembro, selou a guinada no portfólio da holding, com a inclusão das atividades de venda de alimentos e bebidas, e decidiu fechar as instalações da Richards, na Rua São Miguel, na Tijuca, perto da comunidade do Borel, onde trabalhavam cerca de 160 pessoas envolvidas no design, corte e concepção das peças masculinas e femininas da marca. A produção se espalha por facções e confecções no Brasil e no exterior (China, Índia e Itália). O aviso veio esta semana.

Com a mudança, por economia na logística (vôos e estradas para todo o Brasil partem mais de São Paulo) e razões de segurança, o estilo carioca fica mais pobre e menos influente no modo de vestir do brasileiro. Resistem no Rio as marcas controladas pela Soma (A.Brands, Animale, Farm, Foxton, FYI, Cris Barros), a Cantão/Redley, a Oslken (parte). Os shoppings de consumo ditam os enredos da moda e dos filmes.