ASSINE
search button

Paulo Guedes, o novo Czar

Economista vai acumular superpoderes, só desfrutados por Delfim Neto, no regime militar

Reprodução -
Paulo Guedes e equipe começam hoje a colher dados oficiais sobre a situação da economia
Compartilhar

A nomeação será na primeira semana de janeiro, após a posse de Jair Bolsonaro, em 1º de janeiro, no Palácio do Planalto. Mas, desde hoje, quando começar a operar para colher informações mais precisas sobre o estado da economia e da administração pública junto ao grupo de transição do governo Temer, um novo Czar na área econômica surge no país: o economista mineiro radicado no Rio, Paulo Roberto Nunes Guedes.

Aos 69 anos, ele vai assumir o superministério da Economia, com a provável fusão da Fazenda com o Planejamento e a, ainda incerta, inclusão do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior e de Serviços. O último Czar da Economia foi Delfim Netto, no governo do general Figueiredo (1979-1985). A grande missão de Guedes é reduzir o déficit público primário (receita menos despesas, sem contar os juros da dívida pública), estimado em R$ 132 bilhões para este ano e em R$ 95 bilhões para 2019.

Macaque in the trees
Paulo Guedes e equipe começam hoje a colher dados oficiais sobre a situação da economia (Foto: Reprodução)

Além da reforma da Previdência, Guedes cogita um choque fiscal com corte radical de despesas, redução de desonerações fiscais, reforma tributária e privatizações. Para garantir equilíbrio fiscal mais rápido, uma das ideias do grupo de economistas que reuniu é a de antecipar a devolução, pelo BNDES, de R$ 130 bilhões devidos ao Tesouro Nacional.

Ontem, pela manhã, após votar em escola pública em Ipanema, no Rio, Paulo Guedes saiu da seção eleitoral sem ser visto pelos jornalistas. Perguntado, via WhatsApp, se amanhã começa a montagem do novo governo, respondeu com sinal de positivo. Disse que estaria com Bolsonaro no fim da tarde, durante a apuração, para traçarem os primeiros planos de preparação do novo governo, a partir de hoje.

Previdência, a prioridade

Vice na chapa do candidato eleito, o general Hamilton Mourão (PRTB), disse ontem ao votar, pela manhã, em um colégio no setor militar de Brasília, que um ajuste na economia e a reforma da Previdência estariam entre as primeiras medidas do novo governo. Questionado sobre qual seria a primeira medida de um eventual governo Bolsonaro, Mourão disse: “Acho que a reforma da Previdência é fundamental”.

Mourão avaliou como “bom” o projeto de reforma da Previdência que tramitou no Congresso no governo Temer. Segundo ele, caso a proposta atual fosse aprovada, isso representaria um “grande passo”. “O ótimo é inimigo do bom. Então, se nós temos algo bom, a gente toca esse avião mais para frente porque ele vai cair no nosso colo. Mais para frente, a gente consegue reajustar de uma forma melhor”, explicou. A reforma de Temer economizaria R$ 420 bilhões em 10 anos, com aumento da idade mínima e corte de alguns benefícios, num período de transição de 20 anos.

Sobre a situação de aposentadoria dos militares, Mourão disse que as possíveis mudanças também irão afetá-los. “Os militares já têm uma previsão para eles dentro desse pacote. Aumenta o tempo de serviço, as pensionistas começam a contribuir”, relatou. E disse que a relação com o Congresso precisa ser afinada. “Lua de mel com o Congresso tem que ser aproveitada para pregar os pregos. Mas lua de mel de pobre é curta”, brincou Mourão sobre a urgência de execução das medidas econômicas.

Perfil eclético

Todos já conhecem a vocação liberal de Paulo Guedes, que se formou para Universidade Federal de Minas Gerais, fez pós-graduação na Fundação Getúlio Vargas (Ibre) e depois fez curso de extensão na ortodoxa Universidade de Chicago, comandada por Milton Friedman. A profissão de fé liberal Guedes fazia no Instituto Millenium e na coluna semanal que assinou por quase três anos em O Globo.

Uma faceta de Paulo Guedes, pouco conhecida, foi a sua convivência, nos anos 80 e 90, com uma geração eclética de economistas nas reuniões mensais de conjuntura do Instituto de Pesquisas Econômicas e Aplicada (Ipea). Nas reuniões, ficaram famosas as divergências entre os economistas da linha ortodoxa e da heterodoxa. A linha heterodoxa tinha como suporte as escolas acadêmicas da PUC-Rio, USP e Unicamp, em São Paulo.

A ortodoxia levou Guedes a embates com os heterodoxos. Na época do Plano Cruzado, foi chamado jocosamente de “Beato Salu”, pelo diretor de Área de Mercado de Capitais do Banco Central, no governo Sarney, Luiz Carlos Mendonça de Barros. “Beato Salu” era um personagem da novela Roque Santeiro, vivido pelo ator Osmar Prado, que fazia previsões apocalípticas.

Das profundas discussões sobre a economia brasileira travadas no Ipea, Guedes ampliou a sua visão sobre a economia e o círculo de convivência com outras correntes de pensamento. A equipe que montou na assessoria de Jair Bolsonaro, presidente eleito pelo PSL, reflete não só os conhecimentos na sua vida de economista, desde a função de Economista-chefe do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibmec), no anos 80, como os relacionamentos acumulados na sua trajetória de empresário e consultor empresarial.

Ipea e BNDES

Alguns de seus colaboradores foram recrutados nos quadros do Ipea, como o economista Adolfo Sachsida, da área de pesquisas, que atraiu o engenheiro Alexandre Iwat, graduado pelo Instituto de Tecnologia da Aeronáutica (ITA), com pós graduação nos Estados Unidos, que é diretor-adjunto de Estudos e Políticas Regionais, Urbanas e Ambientais do Instituto, além do economista Carlos Von Doellinger, veterano do Ipea.

Rubens de Freitas Novaes e Carlos Alexandre da Costa, são oriundos do BNDES, de onde vem ainda Fábio Giambiagi, especialista em Previdência Social, um dos principais focos das reformas visando o equilíbrio fiscal. Do grupo de trabalho sobre a Previdência também fazem parte os irmãos Abraham e Arthur Weintraub. Ao grupo se juntou o ex-presidente do Banco Central, Armínio Fraga.

A questão tributária, que tangencia a reforma fiscal, conta com a colaboração do tributarista Marcos Cintra Cavalcanti, hoje à frente da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC).

A área de infraestrutura tem como principal expoente o general Oswaldo Ferreira, especialista em transportes e logística. O engenheiro Luciano Castro concentra os estudos sobre o setor elétrico. Na área de energia, além de consultoria de Adriano Pires, do Instituto Brasileiro de Infraestrutura, Paulo Guedes recorreu a seu ex-companheiro do Ibmec, o economista Roberto Castello Branco, ex-diretor Financeiro e de Relações com o Mercado da Vale, que ofereceu subsídios em mineração e petróleo e gás.