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Brasil é um país confiável?

Para montadoras, matrizes olham país com desconfiança; PF indicia Abilio Diniz, ex-CEO da BRF

Divulgação -
PF indiciou Abílio Diniz por irregularidades quando estava à frente do Conselho da BRF
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São Paulo - Em seminário sobre indústria automobilística, organizado ontem, em São Paulo, pela revista Auto Data, os presidentes de três das maiores montadoras do país, Mercedes-Bens, Volkswagen e Fiat Chrysler reagiram às incertezas da economia brasileira em meio à radicalização da campanha eleitoral. O presidente da Mercedes, Philipp Schiemer, admitiu ser difícil convencer a matriz alemã a ampliar os investimentos no país. Há três anos, a MB cogitou de fechar uma das fábricas de caminhões no país (são duas, em SP e MG) e ampliar os investimentos na Turquia, para atender aos mercados da Ásia e Europa. Já o presidente da Fiat, Antonio Filosa, diz que os acionistas da matriz, em Turim “não vão desistir do Brasil”, mesmo com os respingos da crise da Argentina (maior mercado de exportação das montadoras).

Mas a credibilidade e a confiança no Brasil não se limita às atitudes dos governantes. Ontem, a Polícia Federal indiciou um dos maiores empresários brasileiros. Abílio Diniz, que dirigiu o grupo Pão de Açúcar, e que após a perda do controle para os franceses da Casino, virou o presidente do Conselho de Administração da BRF Foods, uma das maiores produtoras e exportadoras de alimentos do país, foi indiciado nos autos da Operação Trapaça, desdobramento da Carne Fraca, de 2017, por estelionato, organização criminosa e falsidade ideológica. Outros 42 investigados também foram indiciados. Na lista está o ex-diretor-presidente global da BRF Pedro de Faria, também suspeito por crime.

A Trapaça, de março de 2018, encontrou irregularidades no processamento de carnes de frango e de suínos. No relatório de 405 páginas o delegado Mauricio Moscardi, da PF, em Curitiba, afirma que, a partir da análise de conversas por mensagens de e-mails e WhatsApp, “concluiu-se que a prática das condutas delitivas não se restringia ao círculo das equipes técnica e gerencial das fábricas da BRF”. “Há, de fato, a participação do corpo diretivo da empresa na trama investigada, o qual tinha ciência de seu modus operandi, e que, não somente se omitiu em relação a fazer cessá-lo, mas, também, participou comissivamente dos atos de ocultação das fraudes, norteando sua execução”, aponta o delegado.

“Destaca-se a participação ativa, em caso envolvendo a detecção de resíduo tóxico em carne de frango pelas autoridades chinesas (Dioxina), de Pedro de Andrade Faria (então diretor-presidente global do Grupo BRF), Abílio dos Santos Diniz (presidente do CA da BRF) e José Carlos Reis de Magalhães Neto, sócio da Tarpon Investimentos (com “aproximadamente” 7% do capital do Grupo BRF, segundo informações prestadas por Pedro Faria).” O delegado cita conversa do grupo do Whatsapp, do qual faziam parte Faria, Abílio Diniz e José Carlos Reis de Magalhães Neto.

“O contexto das conversas indica o conhecimento do corpo executivo da BRF sobre a ocorrência de detecção de substâncias nocivas à saúde humana em produtos das unidades industriais da empresa. Abílio Diniz e Pedro Faria, pela posição hierárquica no quadro corporativo, possuíam plena capacidade de orienta os círculos sob sua subordinação a tomar as medidas técnicas e eficazes, em âmbito sanitário, para que se determinasse a causa-raiz da contaminação química dos produtos destinados ao consumo e a regularização do processo industrial”, diz o delegado.

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PF indiciou Abílio Diniz por irregularidades quando estava à frente do Conselho da BRF (Foto: Divulgação)

Reação dos indiciados

Em nota, Abilio Diniz diz não ter cometido nenhuma irregularidade como presidente do Conselho da BRF. Ressaltou que “o indiciamento não indica culpa, mas apenas que a autoridade policial considera haver indícios de atos ilícitos, o que será apreciado ainda pelo Ministério Público”. O advogado Aloisio Medeiros, defensor de Pedro Faria, diz que jamais houve qualquer determinação da diretoria do Grupo BRF, muito menos de Pedro Faria, para acobertar quaisquer eventuais desconformidades”.

MB: está difícil convencer matriz a investir no Brasil

Para o presidente da Mercedes-Benz do Brasil, Philipp Schiemer, está difícil convencer a matriz na Alemanha a trazer novos investimentos ao Brasil, em meio a tantas incertezas em relação ao futuro do país. Segundo ele, os executivos globais se sentem mais inclinados a investir nos mercados asiáticos. Schiemer garantiu que o plano de investimentos da montadora, de R$ 2,4 bilhões até 2022, não está em risco, mas teme pelos anos seguintes.

“O ciclo de investimento é de longo prazo. Uma vez tomada a decisão, não se muda. Quando estamos discutindo investimentos para 2023 e 2024, fico preocupado”, disse. Schiemer lamentou que o 2º turno da eleição esteja sendo disputado por dois candidatos que considera serem “extremos”, mas ressaltou que terá de aceitar o resultado e garantiu que vai trabalhar com qualquer um deles. Os juros estão baixos e há demanda de caminhões. eleição colocou no 2º turno dois extremos, o que a gente esperava no início que não precisava chegar a esse ponto, mas chegou, então vamos ter que aceitar isso, vamos trabalhar com qualquer um”, disse.

“Essa trégua está ocorrendo porque a inflação está baixa e os juros estão baixos para os padrões brasileiros, e os bancos estão com um pouco mais de apetite ao risco, e há uma necessidade de renovação de frota”, disse.

“Eles não vão desistir do país”

O presidente da Fiat Chrysler para a América Latina, Antonio Filosa, admitiu que não é fácil explicar o Brasil para os acionistas da empresa, mas “eles não vão desistir do país”, apesar das incertezas do ambiente político e econômico. “O Brasil e a Argentina não são os melhores países para explicar aos acionistas. Não é simples. Mas nosso acionista tem confiança no Brasil. Na maior crise do país, investimos pesadamente em uma fábrica nova em Goiana (PE), inaugurada em 2015, e hoje estamos produzindo lá em três turnos”, disse o executivo.

“Não acho que a visão do nosso acionista agora seja de desistir. O questionamento é maior quando vamos aprovar projetos de investimentos individualmente a cada acionista. É normal. Mas é positiva e fundamentada a confiança em toda a América Latina”, diz Filosa, que espera produzir 2,6 milhões de carros em 2019.

Volks avalia novo carro para 2019

A Volkswagen se prepara para definir no início de 2019 um novo investimento para o Brasil, disse o presidente da montadora para América do Sul e Caribe, Pablo Di Si. O atual plano de investimento é de R$ 7 bilhões até 2020, com o lançamento de 20 modelos. O aporte no início de 2019 seria adicional, para o desenvolver, em dois a três anos, um carro compacto, para além dos 20 automóveis esperados até 2020. Segundo Di Si, o projeto do compacto já está pré-aprovado pela matriz na Alemanha.

Ainda estão pendentes negociações com parceiros, como concessionárias e fornecedores. O executivo garantiu que a decisão final não depende da política econômica do próximo presidente, a ser definido no 2º turno. Ele espera que o mercado de veículos avance entre 5% e 10% em 2019, desacelerando, frente aos 14% de 2018. Em 2017, a taxa foi de 17%.