Katiane Romero e Márcia Pereira, Portal Terra
SÃO PAULO - O poder do marketing é realmente grande e incisivo. Uma boa amostra desse poder é o filme Atividade Paranormal. Incensado como um dos filmes de melhor custo-benefício de todos os tempos - teria custado cerca de US$ 25 mil (segundo veículos especializados na indústria cinematográfica, como Variety) e já rendeu mais de US$ 140 milhões em todo o mundo -, por conta até do tititi que foi feito em torno do filme, da sua temática, da maneira como foi rodado, o longa não entrega bem o que promete.
Toda a tensão que vai sendo construída e que pega de surpresa, pero no mucho, o espectador, não extravasa. Quem compra o ingresso achando que vai ver anjos e demônios ou que irá se surpreender intensamente - tem muita gente que adora levar susto - sai da sala de cinema levemente frustrado. Até quem é mais medroso, nem fica muito chocado ou com vontade de sair correndo da sala escura.
Leia, a seguir, as reações de duas pessoas, uma corajosa e uma medrosa, durante uma sessão vespertina e como foi dormir logo após assistir ao filme:
(ATENÇÃO: O TEXTO A SEGUIR CONTÉM SPOILERS DO FILME)
A corajosa
Quando cheguei à bilheteria para pegar meu ingresso, o frio na barriga aumentou. Afinal, minha expectativa aumentava na proporção que a bilheteria do filme ao redor do mundo engordava - faço parte do time de corajosos que adoram levar susto. Marquei com a "Medrosa" uma hora antes do filme, em frente à bilheteria do cinema. Quando ela chegou, notei que a ansiedade também tomava conta dela, que estampava um sorriso nervoso no rosto.
Chegou o momento de entrarmos na sala de exibição. Animosidades dominaram as nossas conversas até a luz se apagar. Após o manjado trailer de Avatar, o filme começa.
Apresentado como uma experiência real e caseira, com seu timing descompassado mostrando cenas domésticas de um jovem e comum casal americano, os primeiros minutos de Atividade Paranormal foram me dando a propagada aflição, mas não exatamente igual à que deixou plateias chocadas e sem conseguir dormir depois. Nada disso.
A tensão provocada pela ausência de fatos relevantes, que só dão o ar da graça nos 10 minutos finais do longa, ficou represada. Os sustos que me prometeram não vieram. Eu mais ri de algumas poucas reações da minha amiga "Medrosa" do que me assustei de verdade.
Só me restou, como experiência aterrorizante, a cena final, quando a atriz Katie Featherston - incorporada pelo demônio autor de alguns sons, sussurros ininteligíveis e pegadas de três dedos - quase engole a câmera com sua cara de possuída (ugh!). O Chamado (o original, japonês, de 1998), O Grito (2004), O Exorcismo de Emily Rose (2005) e todos os clássicos de terror dos anos 70, com seus efeitos quase toscos, me deram muito mais medo.
Ah, e eu dormi superbem nos dias seguintes à minha ida ao cinema - tá, uns quatro dias depois de ver o filme, a ideia de ser perseguida por um demônio que bufa nas minhas orelhas me pareceu assustadora. Mas nada que tenha tirado meu sono.
A medrosa
Gosto de filmes de terror, mas confesso que sou do time daqueles que assistem aos filmes e depois passam noites sem conseguir pregar os olhos. Tudo começou quando ainda criança assisti, acompanhada por minha mãe, ao filme A Profecia (1976). Aquilo me assustou tanto que até hoje tenho calafrios ao ouvir o nome Damien, e tenho horror aos cães da raça rottweiler, sempre acho que um deles pode ser o demônio incorporado.
Meu medo por atividades estranhas cresceu quando vi O Exorcista (1973) e chegou ao ápice quando vi O Sexto Sentido (1999), já grandinha, experiência que me fez ficar sem dormir durante três noites - afinal, minha mente doentia sempre me fazia sentir calafrios atrás do pescoço (lembram que o filme explica que isso significa que alguma alma penada passou por você?).
Com esse histórico, lá fui eu encontrar minha amiga "Corajosa" na porta do cinema para ver Atividade Paranormal. O trailer tinha me deixado em pânico e eu tinha prometido para mim mesma que não veria este filme, não estava a fim de arriscar uma bela noite de sono por conta de um filme. Mas como não consegui negar um desafio, comprei a entrada.
O início da história me deixou bastante tensa. A câmera no melhor estilo Bruxa de Blair e o cientista convidado pelo casal explicando que aquele tipo de atividade que ocorria na casa só poderia ser causada por um demônio - o que descartava as brincadeiras de alguma alma penada - me deixaram nervosa.
Mas rapidamente o meu medo foi dando lugar a uma irritação. Eu não me contive durante a exibição e, por duas ou três vezes, disse em voz alta: "até parece que uma pessoa normal seria capaz de dormir depois de ouvir esses barulhos"; ou "por que raios eles não acendem as luzes!?".
Levei alguns sustos, é verdade. As pegadas do bicho (aqueles três dedos marcados com talco são muito feios) e Katie (Katie Featherston) sendo arrastada são levemente aterrorizantes. Mas o filme me pareceu lento e, concordando aqui com a minha amiga "Corajosa", as cenas que realmente dão algum medo ficam reservadas para o final - final mesmo! A última noite deles na casa é a que realmente aterroriza.
Por fim, saí do cinema bem. A falta de cenas mais "punk", de mais gritos ou maior presença do tal demônio deixaram a desejar. Pelo trailer e por tudo o que circulava na internet, achei que eu abandonaria a sala de projeção antes do final. Mas vi o filme inteiro e, pasmem, dormi perfeitamente nos dias seguintes. Tudo bem que eu cometi um leve blefe e tapei os olhos quando vi Katie se aproximando da câmera na cena final. Eu sabia que ela ia fazer uma cara horrorosa, preferi não ver.
Pelo conjunto da obra, ainda acho que Samara - e sua maneira horrenda de se movimentar em O Chamado (2002) - é muito mais aterrorizante. Tanto que até hoje sou capaz de sair correndo se estiver sozinha e me deparar com uma TV exibindo aqueles chuviscos. Samara sim é de tirar o sono.