Duílio Gomes, Jornal do Brasil
RIO DE JANEIRO - O escritor fluminense José Cândido de Carvalho (1914 1989) ficou na literatura brasileira como o autor da obra-prima O coronel e o lobisomem. Título que acabou deixando na sombra seus outros livros, todos eles inventivos na forma e no conteúdo Um ninho de mafagafes cheio de mafagafinhos, Ninguém mata o arco-íris e Olha para o céu, Frederico! . Este, publicado pela primeira vez em 1939, acaba de ser relançado pela José Olympio, comemorando os seus 70 anos de surgimento e lembrando os 20 de falecimento do autor.
Um romance rural mas sem regionalismos, Olha para o céu, Frederico! gira em torno de latifúndios, usineiros pouco honestos cercados de capangas e do caráter discutível do fazendeiro Frederico, pusilânime e de 'alma ressequida'. Eduardo, seu sobrinho, é o narrador do romance e o analista de sua estranha personalidade, capaz de fazer vista grossa à arrogância ilimitada de seus vizinhos fazendeiros e ao affair que esse sobrinho mantém com a sua mulher, Lúcia.
O título do livro vem da frase que um padre, amigo de Frederico, sempre repete para ele quando o visita em sua fazenda São Martinho. O sacerdote, preocupado com a vidinha vazia de seu amigo, apenas ligada às terras, exorta-o a levar uma existência mais espiritual. 'Olhar para o céu' é se aproximar de Deus e se distanciar um pouco das questões fundiárias. Naturalmente, Frederico ignora os conselhos do amigo.
Ontem como hoje
Na época em que o livro foi escrito e publicado, não havia, como hoje, a preocupação com o meio ambiente e não se desmatavam também como hoje áreas equivalentes a 100 Maracanãs por dia. Getúlio Vargas era o presidente/ditador do país, tendo fechado o Congresso Nacional em 1937 e instalado o Dip, famigerado departamento que censurava todas as manifestações contrárias ao seu governo. O Estatuto da Terra ainda não havia sido promulgado e o poder dos latifundiários massacrava os pequenos produtores, promovendo, sem freios, a desigualdade social. Não houve, daquela época até hoje, muita evolução social nessa área.
Segundo o professor universitário Marcelo Magalhães Godoy (Cedeplar/Face-UFMG) a agroindústria canavieira evoluiu, no Brasil, 'de um sistema escravista de exploração da terra e da mão-de-obra para um patriarcalismo semicapitalista e, finalmente, para o capitalismo, em sua plenitude, dos dias atuais'.
Quando o romance foi lançado, uma parte da crítica viu nele um parentesco muito grande com Menino de engenho, de José Lins do Rego. A jornalista Cláudia Nina considera redutora essa comparação. O parentesco entre os dois romances, segundo ela, é distante. E acrescenta, com propriedade: 'José Cândido surgiu em Olha para o céu, Frederico! com uma voz toda sua e uma personalidade marcante'.
O autor, além de romancista e contista, era também jornalista e advogado. Foi diretor da Rádio Roquette Pinto, ganhou os prêmos Jabuti e Coelho Neto e se elegeu para a Academia Brasileira de Letras em 1974.